Contra-razões – Juizado Especial Cível – Ação de danos morais contra banco

Ângela Ferreira Pace
Advogada atuante no Rio de Janeiro nas áreas Civil e Administrativa
Especialidade em Direito do Consumidor e Juizados Especiais Cíveis

Excelentíssimo Sr. Doutor Juiz de Direito do xxxx Juizado Especial Cível de xxxx

Autos do Processo nº xxxx/2000

Ação de Indenização por Danos Morais

Autor: Fulana

Réu: Banco xxxx

Fulana, brasileira, solteira, professora universitária, portadora da Cédula de Identidade n. xxxx e CPF xxxx, domiciliada à Rua xxxx ? Bairro ? Rio de Janeiro ? RJ – CEP: xxxx, nos autos do processo em epígrafe, que move contra BANCO xxxx, por intermédio de seu advogado legalmente constituído, atendendo aos termos do art. 42 § 2º da Lei 9.099/95, apresentar

CONTRA-RAZÕES DO RECURSO INOMINADO

de fls. 46/55, interposto pela ré, requerendo se digne V. Exª receber e fazer subir à superior instância, para reapreciação da matéria, aduzindo razões fático-jurídicas das quais o teor as faz em apartado, que se fazem necessárias ao regular improvimento do presente recurso interposto.

Nestes Termos,

P.E.Deferimento.

Rio de Janeiro, de outubro de 2000.

Ângela Ferreira Pace

OAB/RJ 97.113

CONTRA-RAZÕES DO RECORRIDO

Autos do Processo nº xxxx/2000

Ação de Indenização por Danos Morais

Autor: Fulana

Réu: Banco xxxx

Egrégio Colégio Recursal do xxxx Juizado Especial Cível de xxxx

EGRÉGIA TURMA

A respeitável sentença de fls. 45, não merece reforma, devendo prevalecer, pelos motivos a serem aduzidos pela Recorrida.

Em síntese dos fatos, a Recorrente propôs a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, alegando, ter sido incluída no rol de devedores inadimplentes do SCP e do SERASA, devido a um seguro residencial efetuado pelo Recorrente, em seu nome, sem que jamais o tivesse solicitado.

Realizada a Audiência de Conciliação, passou-se à Audiência de Instrução e Julgamento, a qual o Recorrente foi condenado à revelia, pelo não comparecimento do representante legalmente constituído, sem justificação alguma.

Preliminarmente, o recurso interposto pelo Recorrente, não merece ser acolhido, uma vez que desprovido de sucedâneo legal, encontrando-se em total dissonância com a melhor forma de direito, doutrina e jurisprudência, aplicáveis na espécie, e, ainda, carente de instrumento fático.

Pelo que se verifica, diante da leitura do recurso interposto pela ré, este utilizou-se dessa fase processual, para alegar sua matéria de defesa.

Clara e flagrante contrariedade à Lei 9.099/95, que em seus art. 30, dispõe, respectivamente, in verbis:

“Art. 30 ? A contestação que será oral ou escrita, conterá toda a matéria de defesa, exceto arguição de suspeição ou impedimento do Juiz, que se processará na forma da legislação em vigor.”

Assim, a oportunidade para o réu defender-se da matéria de fato alegada pelo autor na inicial é na contestação e não na fase recursal como pretende o recorrente. O recurso interposto terá efeito devolutivo, conforme art. 43 da Lei 9.099/95, limitando-se a devolver à apreciação do tribunal, somente o que foi suscitado e decidido na sentença, uma vez revel o réu.
Deve-se propugnar pela caminhada da demanda sempre em direção à solução do mérito. Portanto, cada faculdade processual deve ser exercida a seu tempo.

Em resumo, a oportunidade do réu manifestar-se diante das alegações do autor é na contestação. Caso o réu não alegue na contestação, tudo o que poderia, terá havido preclusão consumativa estando impedido de deduzir qualquer outra matéria de defesa depois da desta fase.

No que tange aos Princípios Gerais de Direito Processual, há que se destacar que os Princípios do Contraditório e da Ampla Defesa, consagrados na Lei Maior, em seu art. 5º, inciso LV, foram corretamente respeitados pela D. Sentença.

Sobre a matéria, Nelson Nery Junior in Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 5ª ed, 1999, pág. 131/132, nos ensina:

“É suficiente que seja dada oportunidade aos litigantes para se fazerem ouvir no processo, por intermédio do contraditório recíproco, da paridade de tratamento e discussão da causa.
Por esta razão é mais apropriado falar-se em bilateriedade da audiência, como princípio no processo civil. O réu deve ser, portanto, citado. Isto se verificando, mesmo no caso de ele tornar-se revel, deixando de apresentar contestação, terá sido atendido o princípio constitucional do contraditório.

O princípio acima discorrido remete a outros dois, de fundamental importância, para o fiel procedimento à legislação processual, que são: o Princípio da Igualdade e da Eventualidade.
Faz-se mister a citação de Ada Pelegrini Grinover et alli, in Teoria Geral do Processo, 10ª ed, 1994, pág. 53:

“A igualdade perante a lei é premissa para a afirmação da igualdade perante o juiz: da norma inscrita no art. 5º, caput da Constituição, brota o princípio da igualdade processual. As partes e os procuradores devem merecer tratamento igualitário, para que tenham as mesmas oportunidades de fazer valer em juízo as suas razões.”

Diante dos ensinamentos jurídicos trazidos à lume, a D. Sentença ao decretar a Revelia, nada mais fez do que respeitar o que manda a lei processual, bem como os princípios informativos de processo e procedimento.
O Recorrido concorda plenamente com o Recorrente quando este refere-se aos efeitos da revelia como sendo relativos. Entretanto, ressalta que, presentes nos autos conjunto probatório suficiente que componha o livre convencimento do magistrado, a aplicação da revelia, quando ausente o primeiro, corresponde à presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor na inicial.

Para melhor elucidar esta afirmação, destacamos:

“A presunção da veracidade dos fatos alegados, em consequência da revelia, não é absoluta, podendo ceder ante a evidência dos autos, de acordo com o princípio do livre convencimento do juiz.” (RSTJ 50/259)

Neste sentido o art. 277 § 2º, do Código de Processo Civil dispõe verbis:
“Art. 277 ………………………………………………………………………………….
§ 2º – Deixando injustificadamente o réu de comparecer à audiência, reputar-se-ão verdadeiros os fatos alegados na petição inicial (art. 319), salvo se o contrário resultar da prova dos autos, proferindo o juiz, desde logo a sentença.”

Considerando que o processo perante os Juizados Especiais orienta-se pelos princípios da oralidade, simplicidade, informalidade e economia processual, objetivando a celeridade na composição da lide, o não comparecimento do réu, sem justificativa adequada e, diante das provas aduzidas, não tem outra alternativa o juiz, senão decretar a revelia.
Vale remissão a Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery in Código de Processo Civil Comentado, 3ª ed, 1997, pág. 560:

“Não só a falta de contestação, mas a ausência da pessoa do réu ou de seu representante com poderes para transigir, à audi6encia de conciliação, se caracteriza como revelia, no procedimento sumário, presumindo-se verdadeiros os fatos afirmados pelo autor na inicial (art. 310).
O réu deve justificar sua ausência antes ou na própria audiência, por meio de seu advogado, cabendo ao juiz resolver a questão imediatamente na mesma oportunidade processual.”

Merece citação aqui que durante a realização da Audiência, o patrono do réu, que sequer tinha mandado e figurava nos autos num substabelecimento em sequência, como estagiário, ao ser questionado sobre o representante da ré não apresentar qualquer justificativa para o seu não comparecimento, respondeu que não sabia o porquê da ausência.
Diante do exposto, está caracterizada a confissão ficta da matéria de fato e julgamento antecipado da lide.

A embasar a matéria, aludimos ao contido in Juizados Especiais Cíveis e Criminais e Suspensão Condicional do Processo Penal: a Lei 9.099/95 e sua doutrina mais recente/ Weber Martins Batista, Luiz Fux, Forense, 1999, pág. 204:

“O processo é bilateral não só por força do contraditório, mas também para que a reconstituição dos fatos não seja fruto da versão unilateral do autor. Assim, autor e réu “colaboram” no processo para que esse material de convicção do juízo seja obtido por mútuo trabalho. O réu que rompe esse princípio de trabalho autoriza que o juiz julgue conforme o alegado pelo autor, daí a presunção de veracidade dos fatos afirmados como técnica in procedendo para antecipar o julgamento antecipado sem mais investigações.”
Adequa-se ao caso, ainda, vasta jurisprudência, a que damos destaque aos seguintes julgados:
“São verdadeiros os fatos arguidos na inicial em função de revelia”(STJ ? 3ª Turma R. Esp. Nº 5.130-SP, rel. min. Dias Trindade, j. 08.04.1991, não conheceram, v.u. DJU. 06.05.1991, p. 5.663, 2ª col., em.).
“Ausente a parte ré à audiência de instrução e julgamento, para a qual fora regularmente intimada, impõe-se a decretação de sua revelia, com os respectivos efeitos. (Acórdão da 1ª Turma do Conselho Recursal ? Proc. Nº 698/91 ? Rel. Juiz José Affonso Rondeau.)

Ora, Vossas Excelências, certamente, já constataram a postura adotada pelo réu, sequer deu atenção à AIJ, não enviando representante constituído, nem justificando sua ausência, ou seja, agiu com desleixo ante o bom andamento processual.
Para elucidar a questão Barbosa Moreira in Comentários ao Código de Processo Civil, pág 187:

“Se o réu permaneceu revel e, portanto, não discutiu questão alguma, na sua eventual apelação, só terá relevância as questões efetivamente apreciadas pelo juiz e aquelas que, não o tendo sido, caiba ao tribunal apreciar de ofício. ”

Para encerrar esta questão da revelia, recorremos ao iminente doutrinador Athos Gusmão, em suas obra, Audiência de Instrução e Julgamento 8ª ed, Forense, 1997, pág. 147:
“Apregoadas as partes, o não comparecimento pessoal do demandado implica a declaração de sua revelia, reputando-se verdadeiros os fatos alegados no pedido inicial, ?salvo se o contrário resultar da convicção do juiz?. A eventual presença de advogado constituído pelo réu não lhe supre a ausência, podendo apenas autorizar, nos casos de comprovado impedimento ao comparecimento do demandado, o adiamento da audiência. A atividade conciliatória, fundamental no procedimento sumaríssimo das causas cíveis de menor complexidade, supõe a presença pessoal dos litigantes. Pois inclusive deve o juiz esclarecê-los sobre as vantagens da conciliação, mostrando-lhes os riscos e as consequências do litígio (art. 9º e 21).

Entretanto, diante das absurdas alegações apresentadas pelo Recorrente, a Recorrida deseja contrapô-las.
O que pretende o Recorrente, de fato, é um desvirtuamento da verdade real, ao argumentar que o motivo que levou à inclusão da autora como inadimplente junto aos cadastros do SPC e do SERASA, foi a cobrança de anuidades de Cartão Real Múltiplo Visa e não a utilização do limite de crédito para o pagamento de parcelas referente a seguro residencial, o qual a recorrida afirma não ter solicitado.

Parece-nos que o Recorrente ignorou, propositadamente, a peça inicial, na qual a Recorrida afirma ter feito depósito para cobrir despesas de manutenção da referida conta corrente, o que o Banco pode perfeitamente confirmar em seus cadastros, além de ser de fácil constatação mediante os extratos anexados à inicial, onde se pode comprovar que fossem descontados apenas os valores para manutenção do cartão de crédito, jamais ultrapassaria o limite do cheque especial concedido pelo banco. Sem mencionar a carta confeccionada pela própria autora, por sugestão de um funcionário da agência, anexada à exordial, às fls.

Inaceitável este comportamento do Recorrente, tentando ocultar o real dano causado à Recorrida, por um seguro residencial, ao qual ela jamais contratou, ressaltando, inclusive, que o analisará em momento oportuno.

No decorrer da peça recursal, o Recorrente se contradiz, assumindo que concedeu o seguro residencial sem anuência da Recorrida e que esta não o cancelou. Ora, Excelências, quanta generosidade da instituição bancária!

É fato público e notório que os clientes dos bancos quando detectam alguma irregularidade em seus extratos, dirigem-se à agência para maiores esclarecimentos, na esperança de resolverem esses infortúnios, que tiram a tranquilidade de qualquer um. No caso da Recorrida, ela o fez inúmeras vezes, sempre sendo desdenhada pelos funcionários que, conforme consta da inicial, chegaram ao absurdo de mandar-lhe procurar a funcionária que fez o segura, sem a sua anuência, pois estas havia sido transferida de agência.

A Imprensa nos retrata os lucros atingidos pela instituições bancárias, anualmente, mesmo em épocas de crise. Cada vez mais o cliente torna-se um refém enfraquecido diante deste poderio econômico.

Recentemente o Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial 255056, condenou o Banco real a indenizar uma correntista lesada devido a retiradas indevidas em sua conta corrente. Trazemos as palavras do Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, relator do processo:

“Diante da realidade dos autos o valor de 150 salários mínimos está mais do que justificado, não ensejando qualquer redução, que teria suporte se fosse absurdo o valor, fora de qualquer padrão médio. A aposentada, não só provou cabalmente o seu direito como expôs os réus a uma situação constrangedora de errar e persistir no erro, causando transtornos enormes.”

Se as instituições bancárias zelassem pela segurança de seus clientes, não seriam responsáveis por 7,5 % das reclamações recebidas pelo Procon do Rio de Janeiro e que se repete país afora. Cobrança indevida também é o principal motivo de queixas na seção Defesa do Consumidor, segundo dados extraídos do Jornal O Globo, Economia, 24.09.2000, pág. 34.
Não resta dúvida de que os arquivos que detém dados relativos aos consumidores e, em especial, aqueles existentes nos bancos, são benéficos à sociedade. Por outro lado, o mau uso dos sistemas pode acarretar informações em desconformidade com a realidade e acarretar pesados infortúnios às pessoas.

Assim, o § 1º do art. 14, fala expressamente na segurança que deve cercar os serviços prestados ao consumidor:

“Art. 14 ………………………………………………………………………………….
§ 1º – O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I ? o modo de seu fornecimento;

II ? o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

………………………………………………………………….
Portanto, presume-se defeituoso o serviço quando é mal apresentado ao público consumidor, bem como sua fruição é capaz de suscitar riscos acima do nível de razoável expectativa, de segurança do consumidor.

José Alexandre Tavares Guerreiro brilhantemente traduz este risco:
“A extraordinária rapidez com que os bancos de dados podem elaborar perfis de informação do indivíduo (no assim dito: ?tempo zero?), a possibilidade de desvio de finalidades na utilização dos próprios dados informativos e a falibilidade dos processos informáticos constituem potencial ameaça aos direitos da personalidade, na medida em que produzem (ou podem produzir) situações constrangedoras, das quais a pessoa só se pode liberar mediante meios modernos de tutela (entre os quais os agora previstos), dado que as soluções tradicionais se mostram ineficazes para garantir a sua segurança e tutelar adequadamente seus interesses”. (José Alexandre Tavares Guerreiro et alii, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, coordenação de José Cretella Júnior e René Ariel Dotti, Rio de Janeiro, Forense, 1992, p. 142)

Percebe-se que 99% (noventa e nove por cento) das repostas apresentadas em processo, pelas empresas causadoras de danos aos consumidores citam que “existe uma indústria de danos moral”.
Em verdade, esta expressão deveria ser motivo de vergonha para as empresas e não frase clichê adotada. Se a população, cada vez mais, cobra pelos transtornos que enfrenta por erros dos fornecedores de produtos e serviços, é porque as leis estão proporcionando garantias aos consumidores. E tal fato precisa ser encarado como uma positiva evolução social, pois a consequência é um incentivo ao melhor comportamento das entidades públicas e privadas, em relação à sociedade.

Finalmente argumenta o réu que o quantum indenizatório é excessivo.

O Código Civil Brasileiro, no art. 948 preceitua que: “nas indenizações por fato ilícito prevalecerá o valor mais favorável ao lesado”. A regra contida no dispositivo é a do in dubio pro creditoris.

Logo, a verba indenizatória tem o fundamento de punição do ofensor, para assim dissuadi-lo de novas ações ilícitas e compensar o sofrimento da vítima, sob pena de se tornar simbólica.

O doutrinador Clayton Reis (Avaliação do Dano Moral 3ª ed., Editora Forense, Rio de Janeiro, 2000, p. 203) , conclui a matéria:

“É que na valoração dos danos morais, o que está em debate é o conteúdo axiológico da própria sociedade e que exige, portanto, do representante estatal uma postura de nítida repreensão aos ofensores das normas éticas e sociais.”

CONCLUSÃO

Diante do acima explicitado, aguarda a Recorrida o não provimento do Recurso interposto, mantendo-se na ÍNTEGRA, destarte, a D. Sentença, in totum, proferida pelo douto Juízo “a quo”, NEGANDO O PROVIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO, extinguindo-se o feito nos trâmites legais, praticando, assim o Egrégio Tribunal, mais uma vez a

J U S T I Ç A !

Nestes Termos,
P. E. Deferimento.

Rio de janeiro, de outubro de 2000.

Ângela Ferreira Pace

OAB/RJ 97.113

Fonte: Escritório Online

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