Sentença. Indenização por danos materiais e morais contra fornecedora de energia elétrica

Márcia Silvana Cezar Silveira
Advogada em Porto Alegre/RS
Juíza leiga do 5º Juizado Especial Cível de Porto Alegre/RS

Este trabalho foi elaborado quando a Dra. Márcia Silvana Cezar Silveira
atuou como Juíza Leiga do 5º Juizado Especial Cível ? POA/RS
Porto Alegre/RS
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Elaborado em 09 de setembro de 1999.

5º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL

PROCESSO N.º

REQUERENTE:

REQUERIDO: DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S/A

VISTOS, ETC.

1) RELATÓRIO-

Dispensado o relatório na forma do art. 38 da Lei 9.099/95

2) FUNDAMENTAÇÃO-

Trata-se da AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. O pedido do requerente baseia-se no corte de energia elétrica sem pré-aviso por parte da requerida, advindo deste, perdas em seu aviário, que é exatamente a sua fonte de sustento e de sua família; invoca o ?PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO”. O requerente juntou provas, exceto as que comprovem o levantamento de importâncias para saldar suas dívidas.

Por outro lado, alega a requerida que a culpa não é dela e sim da CEEE, que solicitou a redução preventiva, determinando assim, cortes no fornecimento programados (fl. 20). Contesta, ainda, que os outros casos indenizados deviam-se ao fato da interrupção ter originado-se em um problema de manutenção em uma linha de transmissão de propriedade de responsabilidade da CEEE.

Analisando as exposições de motivos para os cortes de energia elétrica, bem como as indenizações concedidas para alguns e negação da mesma para o autor e a Segunda testemunha, concluí-se que PREVENÇÃO É UM MEIO DE MANUTENÇÃO. A requerida foi avisada com antecedência, conforme fls. 28 e 29, então deveria da mesma forma avisar aos usuários pelos meios de comunicação existentes, como o fez após os cortes, manifestando-se no sentido de poder haver novas interrupções (fl.26). Ademais, as propostas oferecidas por ocasião das privatizações seriam de melhorias nos serviços, bem como a ampliação desses. Desta forma, não pode a requerida eximir-se das responsabilidades, pois se assim for, estaremos diante do fato de somente haver adquirido a parte boa e lucrativa, enquanto a parte das responsabilidades permanecem a cargo única e exclusivamente da CEEE, ao que se sabe, a sucessão de um negócio engloba todos os riscos e benefícios relativos ao mesmo. Assevera ainda a requerida a fl. 22, que indenizou os avicultores e após buscou o ressarcimento dos valores junto a CEEE que foi a responsável pelas interrupções.

Ora, temos que a defesa da requerida baseia-se fundamentalmente numa diferenciação semântica entre MANUTENÇÃO e PREVENÇÃO, porém o que se observa foi uma discriminação entre os indenizados e os não indenizados, que apesar de terem sofrido a mesma perda, se viram diferenciados quanto ao recebimento ou não da indenização.

Melhor sorte não socorre a requerida quando manifesta a obrigação que tem o requerente em manter um gerador para garantir o abastecimento de energia. Ora, certamente deveria ter feito a mesma exigência aos que foram indenizados, porém, não há nos autos prova de que aqueles lançaram mão deste recurso. Valer-se da desculpa do raio que atingiu uma estação, também não é a melhor assertiva, pois sobre este fato, pairam muitas dúvidas da veracidade do mesmo.

As testemunhas arroladas pelo autor foram firmes e decisivas ao salientarem que não houve comunicação prévia por parte da requerida, no que concerne aos cortes de fornecimento de energia, e que houve indenizações na região pelo mesmo motivo, bem como o requerente e a primeira testemunha foram os únicos não indenizados. Ademais, a segunda testemunha salientou que nunca fora dada uma resposta definitiva quanto a indenização, isto é, em aproximadamente um ano, o requerente aguardou em vão.

As provas documentais do requerente mostram as perdas, na data conforme narra a inicial, quanto a diferença alegada pela requerida entre 1.390 e 1.251 frangos mortos, constantes no laudo técnico, poderemos observar que no doc. de fl. 27 , a matéria fala em aproximadamente mil frangos, e em seu depoimento pessoal o requerente diz 1.300 frangos mortos, apesar de pequenas diferenças, objetivamente tem-se “a perda” de seu meio de sobrevivência que é a sua criação de frangos. Assevera-se ainda, que o pedido de diligências para comprovar os fatos alegados com a juntada de documentos por parte do requerente foi feito cf. Fl. 39, que mostra a mortalidade total de 1.392 aves.

Quanto ser de conhecimento público e notório o aumento de consumo de energia ano a ano e ser o fornecimento desta energia finito, sabemos também que a privatização foi uma promessa de melhoria nos serviços e expansão na oferta e fornecimento desta energia que só poderiam ser feitos mediante investimentos que o setor público não mais teria condições de fazê-lo. Ora, então temos que a melhoria seria na arrecadação do lucro, pois o aumento no valor da tarifa foi sensivelmente fornecido mais de uma vez ao ano, e em índices que nenhum salário acompanhou. Em contrapartida, temos a culpabilidade ainda imposta ao órgão público antecessor, que vendeu patrimônio exatamente por não ter condições de mantê-lo e fazer as melhorias necessárias?

O contribuinte paga suas contas de luz, submete-se à concessão de aumentos e em contrapartida, ainda se vê discriminado perante aos seus iguais. A Constituição Federal, em seu art. 5º, preceitua que todos são iguais perante a lei, o que leva ao entendimento de que todos gozam dos mesmos benefícios. O código do consumidor se aplica ao caso em tela, pois o requerente é consumidor tanto quanto os outros que foram devidamente indenizados, pois se aqui valesse que não é consumidor por repassar seu custo ao consumidor final, ali nos outros casos também se aplicaria a mesma afirmativa.

A colocação da requerida quanto a indenização por dano moral é aplicável a muitos casos em que o pedido baseia-se em fatos de pequena relevância, porém há de se salientar que no presente caso, houve o fator DISCRIMINAÇÃO entre este e aquele produtor, afetados da mesma maneira, ou seja, com a perda de seu meio de subsistência. Ser tratado de forma diferenciada, ser ludibriado com respostas vagas, se ver humilhado atrás de uma posição definitiva por mais ou menos um ano, talvez por tratar-se exatamente de pessoa humilde, é algo que traz a dor. A previsão do dano moral reside exatamente no fato de compensar a dor infligida à vitima e punir o ofensor, desencorajando-o a reiterar a prática ilícita contra outrem. E mesmo tendo como definição de dano moral como “Aquele que não atinge de modo algum o patrimônio e causa tão somente uma dor moral a vítima”, é imperativo que se leve em conta os efetivos prejuízos sofridos pela pessoa, sua condição social e econômica.

Assevera Maria Helena Diniz:

“A indenização é estabelecida em atenção ao dano e à situação do lesado, que deverá ser restituído à situação em que estaria se não tivesse ocorrido a ação lesante. De forma que tal indenização será fixada em função da diferença entre a situação real do lesado, ou melhor, o dano mede-se pela diferença entre a situação existente à data da sentença e a situação que, na mesma data, se registraria, se não fosse a lesão.

A responsabilidade civil cinge-se, portanto, à reparação do dano moral ou patrimonial causado, garantindo o direito do lesado à segurança, mediante o pleno ressarcimento do prejuízo, restabelecendo-se na medida do possível o statu quo ante.” (Revista Consulex- ano I ? Nº 3- Março/1997)

Na presente ação, o dano moral serve exatamente para restabelecer ao requerente a sua condição, se não houvesse ocorrido o corte de fornecimento de energia elétrica por parte da requerida. Houve a devida comprovação das perdas sofridas pelo autor em seu patrimônio, bem como provada pela própria requerida da diferenciação entre o requerente e os demais produtores que foram indenizados.

3) DA DECISÃO

Isto posto, opino seja julgada procedente a ação , condenando a requerida pagar o valor de R$ 1.654,65 (um mil, seiscentos e cinquenta e quatro reais e sessenta e cinco centavos) a título de indenização pelos DANOS MATERIAIS sofridos pelo autor (fl. 38) e o mesmo valor de R$ 1.654,65 a fim de indenização por DANOS MORAIS, ambos os valores corrigidos pelo IGP-M da data do ajuizamento e juros legais da citação.

A apreciação do juiz de direito presidente do 5º Juizado Especial Cível.

Porto Alegre, 09 de setembro de 1999.

Marcia Silvana Cezar Silveira

Juíza Leiga

Fonte: Escritório Online

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