O tempo útil do consumidor tem sido objeto de reflexão para os operadores do direito. A preocupação com a verdadeira via-crúcis que um cliente lesado precisa percorrer em busca de seus direitos culminou no desenvolvimento da teoria do desvio produtivo – análise da perda de tempo decorrente de atos e omissões reiterados dos fornecedores de produtos e serviços. Com o objetivo único de otimizar o lucro, empresas descumprem os deveres da boa-fé e da ética e deixam de observar os princípios e regras que regem as relações contratuais.
Nesse sentido, a 3ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Santa Catarina reformou sentença e julgou procedente ação de repetição de indébito e indenização por danos morais ajuizada por cliente prejudicada por empresa de telefonia, TV e internet.
A prestadora de serviços lhe ofereceu um plano pós-pago para linha móvel, no valor mensal de R$ 55, e informou que bastava realizar a portabilidade online do chip para que fossem cobrados em fatura única os serviços de TV, internet, telefonia fixa e móvel. Logo na primeira conta, no entanto, a cliente recebeu uma fatura avulsa no valor de R$ 133, sob a rubrica “plano + dependente”, diversamente do que lhe foi prometido.
Após inúmeras ligações e idas à loja física da requerida, nada foi resolvido, pois a empresa alegava que o plano de R$ 55 nunca existiu e que a cliente deveria abrir reclamação no setor do plano de TV para acoplar os valores numa única conta. Este setor, por sua vez, respondeu que era a própria empresa de telefonia quem deveria fornecer uma conta única de todos os serviços.
Para não ser coagida a pagar o excessivo valor mensal, a autora cancelou o plano, sob pena de prejudicar sua subsistência. Mas a requerida cobrou multa pela quebra de fidelidade, emitiu normalmente as faturas dos serviços cancelados, com valores aleatórios e nenhum critério de cobrança, seja pela TV, seja pela internet, sempre acima do estipulado em contrato.
No juízo de origem, a sentença garantiu à cliente a rescisão do contrato e a restituição dos valores cobrados pela empresa, mas não a indenização por danos morais. Assim, a defesa da consumidora recorreu da decisão inicial.
Para o desembargador relator da matéria, a situação fática exposta pela cliente permite o reconhecimento do dever compensatório por desvio de tempo produtivo da consumidora. “A Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor (ou tempo útil perdido), neste contexto, traz ao panorama a tutela do direito individual do tempo livre do consumidor, que, quando violado, é capaz de atrair o dever reparatório”, frisa o relator.
O montante da indenização foi arbitrado em R$ 3 mil. O voto foi seguido de maneira unânime pelos demais integrantes da 3ª Câmara de Direito Civil do TJ.
Processo n. 5009802-69.2020.8.24.0008