A 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) negou provimento, de forma unânime, ao agravo de instrumento interposto com o objetivo de suspender a recuperação judicial do Futebol Clube Santa Cruz, deferida em decisão judicial interlocutória da 18ª Vara Cível da Capital – Seção B e assinada pelo juiz de direito Arnóbio Amorim Araújo Junior. O julgamento do recurso de autoria de oito pessoas físicas ocorreu no último dia 18 de abril. O relator do caso foi o desembargador Sílvio Neves Baptista Filho. Participaram também da sessão os outros dois integrantes do órgão colegiado, os desembargadores Agenor Ferreira de Lima Filho e Luiz Gustavo Mendonça de Araújo.
Nos autos do processo 0018942-32.2022.8.17.9000, os autores do agravo de instrumento alegaram que o time do Santa Cruz, por ter natureza jurídica de associação civil, não poderia se submeter a recuperação judicial, tendo em vista que este instrumento seria um instituto voltado às sociedades empresárias. Concluíram, no pedido, que o Juízo de 1º Grau teria incorrido em equívoco e solicitaram a suspensão da decisão que autorizou a recuperação do clube pernambucano.
De acordo com o desembargador Sílvio Neves Baptista Filho, a Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, referente à recuperação judicial, não restringe mais este instrumento às empresas, permitindo que possa ser aplicado a clubes de futebol e associações civis sem fins lucrativos.
“O âmbito de aplicabilidade da lei 11.101/05 não está mais restrito às pessoas indicadas em seu Art. 1°, como afirma a parte agravante. Já há posicionamento doutrinário no sentido que “as entidades desportivas que sejam associações civis sem fins lucrativos têm a garantia de fazer uso da possibilidade, ou não, de transmudar-se em sociedades empresárias, todavia não podem ficar constrangidas, para postular Recuperação Judicial, promover Recuperação Extrajudicial ou até mesmo para falir, a submeter-se a este regime societário em virtude da lei (artigo 1º da Lei 11.101/2005) e contra a vontade de seus órgãos deliberativos e assembleias gerais, que não querem adentrar ao mecanismo de distribuição de lucros ou dividendos aos sócios”, destacou o magistrado no voto durante o julgamento”, escreveu o magistrado no voto.
O relator ainda destacou que os artigos 13 e 25 da Lei nº 14.193, de 6 de agosto de 2021, referente à Sociedade Anônima do Futebol, também dão opção aos times de futebol de recorrerem à recuperação judicial.
“A lei 14.193/21 faculta ao “clube ou pessoa jurídica original” o pagamento de seus credores em regime centralizado de execuções ou por meio de recuperação judicial, em seu Art 13, II, e outorga-lhe expressamente legitimidade para requerer judicialmente a recuperação, em seu Art. 25: Art. 13. O clube ou pessoa jurídica original poderá efetuar o pagamento das obrigações diretamente aos seus credores, ou a seu exclusivo critério: (…) II – por meio de recuperação judicial ou extrajudicial, nos termos da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. (…) Art. 25. O clube, ao optar pela alternativa do inciso II do caput do art. 13 desta Lei, e por exercer atividade econômica, é admitido como parte legítima para requerer a recuperação judicial ou extrajudicial, submetendo-se à Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005”, descreveu o desembargador Sílvio Neves Baptista Filho
A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) também acompanha esse entendimento. Como exemplo, o desembargador Sílvio Neves citou o julgamento de dois recursos. O primeiro, julgado no dia 15 de março de 2022, foi o Agravo de Instrumento com pedido de tutela provisória nº 3.654 – RS (2021/0330175-0), cujo acórdão foi de relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, na Quarta Turma do STJ. O segundo teve julgamento no dia 20 de setembro de 2021 e foi o Recurso Especial (REsp) nº 1828635/RS, de relatoria do ministro Moura Ribeiro, na Terceira Turma do STJ.
“Ora, sendo o clube a “associação civil, regida pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), dedicada ao fomento e à prática do futebol” nos termos do Art. 1, §1, I, da Lei nº 11.101/05 em análise, é factível assumir sua legitimidade para interposição de pedido de recuperação judicial, independente da transformação em sociedade anônima futebolística. Se o intento do legislador fosse restringir o âmbito de atuação da norma, teria indicado “A Sociedade Anônima Futebolística” como a única legitimada a requerer a recuperação judicial, não teria se utilizado da expressão “O clube”, como o fez no Art. 13 da Lei 14.193/21. (…) Tanto é assim, que o STJ vem entendendo pela possibilidade do deferimento do pedido de recuperação judicial interposto por pessoa jurídica que possua natureza de associação civil”, concluiu o relator no voto.
Ainda cabe recurso contra a decisão da 5ª Câmara Cível do TJPE.
Processo 0018942-32.2022.8.17.9000