TRT/MG nega vínculo de emprego com ex-marido de empresária

Os juízes da Décima Primeira Turma do TRT-MG absolveram uma empresa de serviços de engenharia de pagar parcelas trabalhistas a um engenheiro, por entenderem que ele era sócio de fato da empresa de propriedade da ex-esposa, não se tratando de empresário. A decisão reformou a sentença oriunda da 43ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte que havia condenado a ré, por considerar a existência de vínculo empregatício.

Em seu recurso, alegou que o caso envolve uma disputa pessoal entre casais decorrente de fontes. É que o autor e os proprietários da empresa foram casados ​​há 40 anos, tendo se divorciado no final de 2020. Segundo apontado, a empresa foi constituída na vigência do matrimônio e, apesar de a Carteira de Trabalho do autor ter sido assinada, ele sempre foi atuoso como sócio da empresa. Nesse sentido, a recorrente ressaltou que o engenheiro exercia de forma absoluta a gestão da empresa no setor comercial, sem subordinação.

Ao examinar o recurso, a relatora desembargadora Juliana Vignoli Cordeiro destacou, inicialmente, caber à Justiça do Trabalho analisar somente se houve infração aos direitos trabalhistas do reclamante. Situação esta que, no seu modo de entender, não ocorreu. “ O conjunto probatório produzido evidenciou que, apesar de ter sido registrado formalmente como empresário, o autor foi, na verdade, sócio de fato do empreendimento ”, concluiu com base nas tentativas do processo.

O gerente comercial ouviu como testemunha explicitou como a relação do autor se estabelecia na empresa, apontando, por exemplo, que ele se apresentou como dono responsável e admitia e dispensava trabalhadores. A testemunha afirmou que o engenheiro, inclusive, tirou férias juntamente com um empresário.

A condição de sócio também ficou evidenciada por causa do e-mail enviado à empresa. Nele, o autor disse: ” Não me trata como Diretor e Sócio desta empresa que criei e que sou o idealizador até hoje, sendo o responsável por todo o direcionamento técnico e comercial, mas sim como um simples funcionário em que não se tem o mínimo interesse de um bom relacionamento ”.

Além disso, a julgada destacou documento intitulado “ Termo de Ajuste de Vontades” , entabulado em decorrência de contribuições consensuais, que elenca a empresa como bem pertencente e/ou administrada pelo autor e a proprietários da empresa. capital social da empresa, criada em 20/6/2020, ser de R$ 10 mil, ao passo que o salário do autor, formalizado admitido em 1º/8/2023, era de aproximadamente R$ 8 mil.

“ O fato reforça a fragilidade da tese de que o autor efetivamente atuou como empregado, pois não é crível que um verdadeiro destinatário receba quase 80% do valor do capital social da empresa ”, registrou no voto. Diante do convencimento de que o engenheiro se conduzia como sócio do fato da empresa, foi repudiado o argumento de que a autonomia na administração da empresa se limitava à carga de confiança.

“ Havia confusão pessoal e patrimonial que extrapolava a esfera deliberativa de um empregado-gerente. Não existia subordinação à reclamação, controle funcional ou disciplinar, tampouco sujeição às diretrizes empresariais. Ao contrário, o reclamante possuía plena liberdade de agir, tendo a prova oral revelada que ele poderia admitir e demitir funcionários, dar ordens, sendo ele, inclusive, o responsável por coordenar as áreas técnicas, comerciais e operacionais da empresa, apresentando-se como ‘dono’ a terceiros ”, foi a conclusão alcançada pela magistrada.

Com relação ao registro na Carteira de Trabalho, a relatora ponderou que, apesar de ser dotada de presunção de veracidade juris tantum , ou seja, presumir-se que um fato é verdadeiro, mas essa presunção pode ser questionada mediante provas (Súmula 12/TST ), a relação de emprego, por se tratar de espécie de contrato-realidade, não se apega a registros formais, mas se revela por meio dos requisitos exigidos no artigo 3° da CLT, quais sejam, onerosidade, pessoalidade na prestação dos serviços, não eventualidade e subordinação jurídica.

Para o relator, independentemente do motivo (conveniência particular ou interesses não declarados), o fato de uma CTPS ter sido assinado não afastado, pelo princípio da primazia da realidade, a atuação do autor como sócio de fato. “ O registro funcional é apenas direcionado a encobrir tal condição. Para o Direito do Trabalho, o registro formal da contratação não se mostra suficiente para definir a real natureza jurídica da relação vinculada entre as partes” , constou do voto condutor.

A conclusão alcançada na decisão foi de que “se o reclamante de fato trabalhado na empresa como engenheiro, o fez como sócio, na intenção de contribuir para o crescimento econômico da sociedade (uma empresa familiar), e não como empregado ”. Na visão da magistrada, a alegada força de trabalho empregada no negócio foi direcionada a proporcionar lucro nos resultados da exploração econômica do empreendimento de natureza familiar.

Por fim, a magistrada citou a audiência do TRT em casos semelhantes:

“VÍNCULO DE EMPREGO. RELACIONAMENTO AFETIVO ENTRE AS PARTES. Conforme dicção do art. 3º da CLT, para a configuração do vínculo empregatício, mister a existência, de forma concomitante na prestação de serviços, da pessoalidade, da onerosidade, da não-eventualidade e da subordinação jurídica, o que difere do trabalho prestado sem o pagamento de salário e sem a sujeição ao poder de mando patronal, estruturado nos moldes de uma parceria oriunda do vínculo afetivo presente na união estável. (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010109-33.2015.5.03.0004 (RO); Disponibilização: 19/04/2017, DEJT/TRT3/Cad.Jud, Página 968; Órgão Julgador: Décima Primeira Turma; Relator: Luiz Antonio de Paula Iennaco).

“RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO. ENVOLVIMENTO AFETIVO ENTRE OS LITIGANTES. AUSÊNCIA DA ONEROSIDADE E DA SUBORDINAÇÃO. PEDIDO IMPROCEDENTE. Para que se configure a relação empregatícia, faz-se necessária a presença concomitante de todos os elementos a que aludem os artigos 2º e 3º da CLT, a saber: trabalho prestado por pessoa física, com pessoalidade, de forma não eventual, com onerosidade e subordinação jurídica Evidenciado que os litigantes mantiveram relacionamento amoroso e que, em razão do envolvimento afetivo, envidaram esforços para a aquisição de bens. e execução de atividade econômica, avulta-se a ausência dos requisitos referenciados, notadamente, a onerosidade e a subordinação, o que exclui a pretensão ao reconhecimento do vínculo de emprego (TRT da 3.ª Região; PJe: 0010669-53.2014.5.03.0151 (RO); Disponibilização: 13/03/2015; Órgão Julgador: Sétima Turma; Relator: Marcelo Lamego Pertence).

“VÍNCULO DE EMPREGO. INEXISTÊNCIA. RELACIONAMENTO AMOROSO ENTRE AS PARTES. Evidenciada pela prova dos autos a ausência dos requisitos previstos no artigo 3º da CLT, deve ser afastada o reconhecimento do vínculo de emprego. O trabalho da reclamante junto ao comercial aberto em nome do ex-noivo e ex-sogro não preencheu as condições de relação de emprego. A realidade fática dos autos demonstra que o autor se ativava como proprietário, e não simplesmente como gerente da “creperia Ademais”, não há prova robusta sobre o pagamento de. salário, requisito necessário para a configuração do contrato de trabalho, conceitualmente oneroso (TRT da 3.ª Região; Processo: 0000931-63.2014.5.03.0079 RO; Data de Publicação: 02/02/2015; Órgão Julgador: Sexta Turma; Relator: Rogério Valle Ferreira Revisor: Anemar Pereira Amaral)”.

Nesse contexto e diante do reconhecimento da condição de sócio do autor, os juízes, acompanhando o voto da relatora, deram provimento ao recurso para julgar improcedentes os pedidos de cláusulas da empresa às parcelas trabalhistas. De acordo com a decisão, a questão deverá ser resolvida no juízo cível competente.


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