Pequenas indústrias – TRT reconhece legitimidade de representação do Simpi

A 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), por unanimidade, reconheceu legitimidade de representação do Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Estado de São Paulo (Simpi). Na ação, o Sindicato da Indústria de Joalherias e Bijuterias de São Paulo (Sindijóias), filiado e financiado pela Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), pedia a anulação dos atos que constituíram o Simpi no Registro Civil e Ministério do Trabalho, bem como a dissolução da entidade.

O juiz Luiz Carlos Godói (relator) decidiu pela improcedência do pedido. Ele salientou que não foram demonstradas nenhuma irregularidade que justificasse a dissolução do sindicato.

“O ordenamento jurídico só permite a dissolução compulsória de uma associação, como são os sindicatos quando ‘promover atividade ilícita ou imoral’ (art. 670, do CPC de 1939, em vigor na conformidade do art. 1218, inciso VII, do Código de Processo Civil de 1973)”, sustenta o acórdão publicado.

De acordo com a decisão, não constitui atividade ilícita a criação de organização sindical de categoria econômica. “Se não há amparo para pleitear a anulação dos atos constitutivos, menos há para determinar ao Registro Civil ou ao Ministério do Trabalho a anulação do respectivo registro”, concluiu a 2ª Turma.

O Simpi foi constituído legalmente em 1989, na esteira da Constituição, e representa hoje cerca de 200 mil empresas industriais paulistas. Em 1994, mediante um acordo judicial firmado com a Fiesp, o sindicato passou a ser filiado a seus quadros como representante da categoria da micro e pequena indústria com até 50 empregados cada.

Mas, em 2005, após ter alcançado o registro sindical no Ministério do Trabalho, a Fiesp rompeu unilateralmente o acordo e passou a manejar ações na Justiça contra o Simpi.

Processo 02277.2006.080.02.00-8

RECURSO ORDINÁRIO DA 80ª VT/SÃO PAULO

RECORRENTE: SINDICATO DA INDÚSTRIA DE JOALHERIA, BIJUTERIA E LAPIDAÇÃO DE GEMAS DO ESTADO DE SÃO PAULO-SINDIJÓIAS

RECORRIDO: SINDICATO DA MICRO E PEQUENA INDÚSTRIA DO TIPO ARTESANAL DO ESTADO DE SÃO PAULO – SIMPI

DOCUMENTOS. JUNTADA. Em não se tratando de documentos novos, nem tendo sido demonstrada a impossibilidade de seu oferecimento no momento oportuno, inadmissível que se faça em grau de recurso, tanto não ocorrida qualquer das hipóteses previstas na Súmula n° 8, do Colendo TST.

ANULAÇÃO DE ATOS CONSTITUTIVOS DE SINDICATO. IMPOSSIBILIDADE DE DISTINÇÃO DE CATEGORIA PELO PORTE ECONÔMICO DE SEUS INTEGRANTES. PRETENSÃO CONSTITUTIVA. INADMISSIBILILDADE. INCOMPATIBILIDADE ENTRE PEDIDO E CAUSA DE PEDIR. INÉPCIA DA INICIAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.

Os princípios da adstrição (CPC, artigo 128) e da congruência ou correlação (CPC, artigo 460) pautam a atividade do juiz na dação da tutela jurídica processual. E ainda admitida pontualmente, a fungibilidade dos provimentos judiciais não pode acarretar ao réu ônus maior do que lhe pretende impor o autor. Daí, para que seja interpretado restrititivamente, ex vi do artigo 293 do CPC, indispensável é a explicitação do pedido, que alcança não só o pedido imediato, como também o pedido mediato, que o vincula de modo indissociável à causa de pedir.

Esta, também decomposta em causa de pedir próxima e causa de pedir remota é que justifica, ampara, fundamenta aquele.

Assim, a alegação de constituição de entidade sindical em desacordo com norma constitucional (causa de pedir remota) que, estabelecendo o princípio da unicidade, seria inafastável em razão do porte econômico dos integrantes da categoria (causa de pedir próxima), poderia ser fundamento para a pretensão a uma sentença declaratória, definidora da representatividade; jamais a decisão constitutivo-negativa (pedido imediato) de anulação dos atos constitutivos de quem tenha organizado associação ao arrepio daquela normatização (pedido mediato).

Em nosso sistema jurídico, a dissolução compulsória de uma associação, como são os sindicatos, somente tem lugar quando ” … promover atividade ilícita ou imoral, …” (Art. 670, do CPC de 1939, em vigor na conformidade do art. 1218, inciso VII, do Código de Processo Civil de 1973). Inépcia da inicial que se declara.

LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. Não caracteriza litigância de má-fé da parte o simples manejo de recurso contra decisão judicial desfavorável. desde que não evidencie propósito manifestamente procrastinatório, a impugnação recursal concretiza a garantia de ampla defesa, expressa no artigo 5º, inciso LV, da constituição. Imputação rejeitada.

Recurso do Sindicato da Indústria de Joalheria, Bijuteria e Lapidação de Gemas do Estado de São Paulo, objetivando a reforma da r. sentença de fls. 637/639, complementada pela r. decisão exarada em embargos declaratórios às fls. 646, que julgou IMPROCEDENTE a ação anulatória do ato constitutivo do Sindicato da Micro e Pequena Indústria do Tipo Artesanal do Estado de São Paulo, proposta perante a 29ª Vara Cível do Comarca de São Paulo, remetida a esta Justiça do Trabalho em virtude da Emenda Constitucional nº 45/04 (fls. 572).

Sustenta que:

a) foi constituído em 1935 e em 07 de maio de 1990 teve alterada sua designação social com a ampliação da base territorial para o Estado de São Paulo, tendo seus atos constitutivos arquivado no Arquivo de Entidades Sindicais no Ministério do Trabalho, sem qualquer impugnação;

b) possui legitimidade representativa das categorias econômicas integradas pelas indústrias de joalheria, ourivesaria, bijuteria e lapidação de gemas, sediadas ou instaladas em todo o território do Estado de São Paulo;

c) a ação tem fundamento no art. 8º, inciso II, da Constituição Federal que dispõe sobre a unicidade sindical, bem como nos arts. 511 e parágrafos e 516, da CLT que estabelecem o conceito de categoria econômica ou profissional;

d) cita vários ensinamentos, concluindo pela impossibilidade de constituição de sindicato pelo porte da empresa;

e) produto de artesanato não é considerado industrial, nos termos da Lei nº 4.544/2002 que versa sobre a tributação, fiscalização, arrecadação e administração do Imposto sobre Produtos Industrializados;

f) em réplica, reiterou a irregularidade, ilegalidade dos atos constitutivos do réu e a ilegitimidade para representar as micros e pequenas indústrias, uma vez que não constituem categoria econômica;

g) há demonstração de que o Registro provisório do demandado foi tornado sem efeito, que apresentou Mandado de Segurança denegado;

h) os documentos de fls. 611/626 revelam que os acordos realizados com outros sindicatos foi denunciado;

i) não pode prevalecer o entendimento da r. sentença, eis que os dispositivos constitucionais que serviram de fundamento para a consideração de que as micro empresas e de pequeno porte não possuem solidariedade de interesses com as grandes indústrias são voltados a favores fiscais e não de categoria econômica;

j) em decisão proferida pela 22ª Vara Cível, onde o SIMPI foi o recorrente afirmou-se que as micro e pequenas indústrias não são categorias econômica ou profissional;

k) não há provas da regularidade da constituição do réu, eis que inexistente Edital de Convocação de Assembléia para a sua composição.

Contra-arrazoado às fls. 690/713, com pedido de litigância de má-fé.

Dispensado o parecer da Procuradoria Regional do Trabalho a teor do disposto no art. 44 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho.

É o relatório.

VOTO

1. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE

1.1.— DOCUMENTOS. JUNTADA

Inicialmente impende analisar a oportunidade da juntada dos documentos de fls. 663/685 que acompanharam o apelo interposto.

Com efeito, em não se tratando de documentos novos, nem tendo sido demonstrada a impossibilidade de seu oferecimento no momento oportuno, inadmissível que se faça em grau de recurso, tanto não ocorrida qualquer das hipóteses previstas na Súmula n° 8, do Colendo TST.

Assim, determino o desentranhamento e a juntada por linha dos mesmos.

No mais, satisfeitos os pressupostos de recorribilidade, conheço.

2. JUÍZO DE MÉRITO

2.1.— ANULAÇÃO DE ATOS CONSTITUTIVOS DE SINDICATO. IMPOSSIBILIDADE DE DISTINÇÃO DE CATEGORIA PELO PORTE ECONÔMICO DE SEUS INTEGRANTES. PRETENSÃO CONSTITUTIVA. INADMISSIBILILDADE. INCOMPATIBILIDADE ENTRE PEDIDO E CAUSA DE PEDIR. INÉPCIA DA INICIAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO

Concretização das garantias constitucionais do processo justo, as normas plasmadoras dos princípios da ADSTRIÇÃO e da CONGRUÊNCIA ou CORRELAÇÃO pautam a atividade do juiz na dação da tutela jurídica processual, como advertiu COUTURE:

“O juiz é um homem que se move dentro do direito como o prisioneiro dentro de seu cárcere. Tem liberdade para mover-se e nisso atúa sua vontade; o direito, entretanto, lhe fixa limites muito estreitos, que não podem ser ultrapassados.” (sic) (COUTURE, Eduardo J., Introdução ao estudo do processo civil, trad.de Mozart Victor Russomano, Rio: Konfino, sdp, pág.87).

No direito brasileiro essas normas vêm dispostas no Código de Processo Civil nos artigos 128 e 460.

O art. 128 consagra o princípio da adstrição, estatuindo que “O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte.”

De outro lado, o art. 460 agasalha o princípio da congruência ou da correlação, preceituando que “É defeso ao juiz proferir sentença, a favor do autor, de natureza diversa da pedida, bem como condenar o réu em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.”

É certo que, em doutrina (MARINONI, Luiz Guilherme, ARENHART, Sérgio Cruz, Manual do processo de conhecimento, 3ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, pág. 458; NERY JUNIOR, Nelson, NERY, Rosa Maria de Andrade, Código de Processo Civil Comentado: e legislação extravagante., 7ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, pág. 779), em exceções ou mitigação de tais princípios, diante das disposições contidas nos artigos 461, 461-A, 920, 928, do CPC, e 84 do Código de Defesa do Consumidor, dentre outros.

Temos, todavia, que não se trata propriamente de exceção ou mitigação daqueles princípios, mas de reconhecimento da fungibilidade dos provimentos judiciais, admitida pontualmente na lei para dar efetividade ao processo, garantia constitucional tão relevante quanto ao da segurança jurídica que se concretiza, dentre outras hipóteses, quando limita a atuação do julgador.

Com efeito, essa fungibilidade não pode acarretar ao réu ônus maior do que lhe pretende impor o autor.

Bem por isso,

“O pedido deve ser sempre explícito, pois é interpretado restritivamente (CPC 293)”. NERY JUNIOR, Nelson, NERY, Rosa Maria de Andrade, Código de Processo Civil Comentado: e legislação extravagante, 7ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, pág. 671.

Essa explicitação, por força do disposto no art. 460 do CPC, alcança não só o pedido imediato (declaração, condenação, constituição, mandamento, execução), que impede decisão de natureza diversa da pedida, como o pedido mediato (o bem da vida pretendido), que não permite condenação em quantidade superior ou em objeto diverso do que foi objeto da demanda.

E a ele vincula de modo indissociável a causa de pedir.

Esta, por sua vez, entendida como o fundamento da pretensão, também pode ser decomposta, segundo a teoria da substanciação – agasalhada pelo nosso Código de Processo Civil no art. 282, inciso III – em causa de pedir próxima e remota. Causa de pedir próxima são os fundamentos jurídicos relacionados com a situação ou condição jurídica invocada, isto é, a conclusão extraída dos fatos da qual decorre o pedido. Causa de pedir remota são os fatos jurídicos, ou seja, os fatos constitutivos, geradores do direito pretendido.

Daí não há afastar a causa de pedir do objeto litigioso, porque os fatos jurídicos auxiliam a delimitar a controvérsia, possibilitando ao réu o oferecimento de defesa quanto a fatos precisos e limitados.

Ora, no caso dos autos, pretende o autor a prolação de sentença constitutivo-negativa (pedido imediato) para “anular os atos constitutivos do requerido (pedido mediato) e determinar que seja oficiado ao 5º Cartório de Registro de Títulos e Documentos desta Capital e ao Ministério do Trabalho e da Administração para que proceda a anulação dos respectivos registros do requerido” (providências administrativas complementares ao comando sentencial).

Alega que a ” … Constituição … veda a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica,..” e que ” … não há porque se confundir categoria econômica com porte econômico, …” (causa de pedir próxima), esclarecendo que o réu ” … foi constituído com a finalidade de representar as micro e pequenas indústrias, o que fere frontalmente o dispositivo constitucional acima transcrito, pois, micro e pequena indústria não constituem categorias econômicas, mas, sim, o tamanho, porte ou potencial de uma empresa.” (causa de pedir remota).

Como se verifica, o pedido mediato – anulação dos atos constitutivos – não guarda compatibilidade quer com a causa de pedir próxima, quer com a causa de pedir remota, pois o ordenamento jurídico só permite a dissolução compulsória de uma associação, como são os sindicatos, quando ” … promover atividade ilícita ou imoral, …” (Art. 670, do CPC de 1939, em vigor na conformidade do art. 1218, inciso VII, do Código de Processo Civil de 1973). E, desenganadamente, não constitui atividade ilícita ou imoral a criação de organização sindical de categoria econômica, tenha ou não em conta a entidade criada o porte das empresas associadas.

Pois, se não há amparo para pleitear a anulação dos atos constitutivos, menos o há para determinar ao Registro Civil ou ao Ministério do Trabalho a anulação do respectivo registro. E assim, também essas providências administrativas complementares ao decreto dissolutório pretendido são contaminadas pela mesma incompatibilidade.

A esta Justiça especializada cabe declarar, quando provocada em caso de disputa, a qual dos interessados cabe a representatividade de determinada categoria. Não, porém, decretar a dissolução ou anulação de atos constitutivos e registros de qualquer das entidades que o pleiteiem.

No presente processo, essa incompatibilidade implica negação recíproca da causa de pedir e do pedido, posto que a conclusão não pressupõe a premissa de que se partiu.

E pedido em contradição com a causa de pedir induz a inépcia da inicial.

Em conseqüência, não poderia o D. Juízo a quo deferir a inicial e avançar, como fez, no exame do mérito da ação.

Por isso, é de ser anulada de ofício a r. sentença e extinto o processo sem resolução do mérito.

2.2.— LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ

Não caracteriza litigância de má-fé da parte o simples manejo de recurso contra decisão judicial desfavorável.

Desde que não evidencie propósito manifestamente procrastinatório, como no caso, a impugnação recursal concretiza a garantia de ampla defesa, expressa no artigo 5º, inciso LV, da Constituição.

Rejeito.

3. DISPOSITIVO

Isto posto, não conheço dos documentos de fls. 663/685, determinando o desentranhamento e a juntada por linha dos mesmos, conheço do recurso e, no mérito, DOU-LHE PROVIMENTO para, anulando a r. sentença, indeferir a inicial por inépcia e extinguir o processo sem resolução do mérito, rejeitando a imputação de litigância de má-fé argüida em contra-razões, na forma da fundamentação.

Mantidas as custas.

LUIZ CARLOS G. GODOI

Juiz Relator

Revista Consultor Jurídico

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