Saúde pública – Anvisa consegue suspender venda exclusiva de remédio

Está suspensa a decisão que autorizava a comercialização exclusiva do medicamento Gemzar, usado para tratamento de câncer, especialmente o de mama, pelas empresas Eli Lilly do Brasil e Eli Lilly and Company. A determinação é do presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Raphael de Barros Monteiro Filho. O ministro atendeu o pedido de suspensão de segurança apresentado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

A decisão teve como base a verificação de que tal exclusividade poderia causar grave lesão à saúde e à economia públicas, já que impossibilitaria o acesso dos pacientes aos medicamentos genéricos ou similares à base de cloridrato de gencitabina (base do Gemzar). Também seriam prejudicadas as pessoas com câncer de mama que recebem os remédios distribuídos pelo Sistema Único de Saúde.

O entendimento do STJ contraria a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que proibiu a Anvisa de conceder novos registros, autorizar a produção, comercialização ou importação de medicamento similar ao Gemzar. A medida visava obrigar a agência a cumprir a antecipação de tutela concedida às empresas pela 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal.

O mérito da questão ainda será julgado pelo STJ. A suspensão da decisão do TRF-1 tem apenas o objetivo de tutelar a ordem, saúde, segurança e economia públicas.

SLS 818

Leia a decisão

SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 818 – DF (2008/0021073-3)

REQUERENTE: AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA – ANVISA

REPR. POR: PROCURADORIA-GERAL FEDERAL

PROCURADOR: LÍVIA CARDOSO VIANA GONÇALVES E OUTRO(S)

REQUERIDO: DESEMBARGADOR FEDERAL RELATOR DO AGRAVO DE INSTRUMENTO NR 200701000179160 DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1A REGIÃO

INTERES. ELI LILLY DO BRASIL LTDA E OUTRO

DECISÃO

Vistos, etc.

1. “Eli Lilly do Brasil Ltda.” e “Eli Lilly and Company” ajuizaram ação ordinária contra a “Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA”, objetivando a declaração do direito de exclusividade na comercialização do medicamento “GEMZAR” (cloridrato de gencitabina 1g e 200mg), com fulcro no Decreto nº 1.355/94.

Indeferida a antecipação da tutela pelo MM. Juiz da 16ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, interpuseram as autoras agravo de instrumento, tendo o Desembargador Federal Fagundes de Deus indeferido o pedido de efeito suspensivo. Posteriormente, o em. Relator reconsiderou a decisão, para deferir o pedido de antecipação da tutela recursal, determinando que “a ANVISA se abstenha, até o trânsito em julgado da sentença, de conceder qualquer outro registro que autorize a comercialização de produto similar”.

Em seguida, o Juiz Federal César Augusto Bearsi, Relator Convocado, apreciando petições protocolizadas pelas autoras, reconheceu que a ANVISA estaria descumprindo a decisão judicial e ordenou a sua intimação para que cumpra o decisum, “abstendo-se de conceder novos registros e/ou cancelando registros já concedidos que autorizem a produção, comercialização (venda ou colocação à venda) ou importação com propósito de comercialização de medicamento similar ao GEMZAR destinado ao tratamento de câncer de mama (indicação terapêutica a que alude a Resolução n. 371, de 18.10.2004)”.

Daí este pedido de suspensão formulado pela ANVISA, com base no art. 4o da Lei n. 4.348/64 e art. 4º da Lei n. 8.437/92, art. 25 da Lei n. 8.038/90 e art. 271 do RISTJ, sob alegação de grave lesão à saúde e à economia públicas.

Sustenta a requerente, em síntese, que a decisão combatida, além de ser ilegítima, “introduz categoria de medicamento não contemplada em lei, dificultar o acesso da população aos produtos a base de cloridrato de gencitabina. Ressalte que este é o principal medicamento utilizado para o tratamento de diversas formas de câncer, inclusive do câncer de mama.”.

Alega também que a Lei n. 6.360/76, em seu art. 3º, estabelece os seguintes tipos de medicamentos: similar, genérico e de referência; e assim sendo, um medicamento similar deve possuir as mesmas indicações terapêuticas do medicamento de referência, que no caso do cloridrato de gencitabina, o GEMZAR é o medicamento de referência. Aduz também que a decisão impugnada ao deferir direito exclusivo de comercialização somente em relação à indicação terapêutica para câncer de mama e determinar que essa indicação fosse retirada dos medicamentos similares, “promoveu a quebra da intercambialidade entre similar e medicamento de referência”, ocasionando ainda insegurança na classe médica, que deixou de prescrever os similares, bem como na população que ficou receosa de fazer uso da aludida medicação.

Ressalta ainda que a decisão objurgada dificulta, especialmente, o acesso da população carente aos medicamentos à base de cloridrato de gencitabina, uma vez que os programas de distribuição gratuita de medicamentos administrados pelo SUS – Sistema Único de Saúde, em observância aos ditames da Lei n. 9.787/99, compram preferencialmente os medicamentos similares ou genéricos, que são cerca de 35% (trinta e cinco por cento) mais baratos que os medicamentos de referência; todavia, com a exclusividade na comercialização, a distribuição gratuita ficará prejudicada, haja vista que os entes públicos serão obrigados a comprar o GEMZAR e, ante a impossibilidade de obtenção de maiores recursos públicos destinados à aquisição de medicamentos, “não haverá outra solução senão reduzir em cerca de 35% (trinta e cinco por cento) o número de pacientes atendidos nos programas de distribuição gratuita desse medicamento e isto não só gerará lesão à economia pública, como à saúde pública”. Por fim, assevera que o pedido de patente formulado pelas empresas autoras refere-se a um processo de produção e não a um produto, razão pela qual não lhes assiste qualquer direito de exclusividade na comercialização.

O Ministério Público Federal opinou pelo deferimento da suspensão (fls. 117/124).

2. O pedido de suspensão é medida excepcional e sua análise deve restringir-se à verificação da lesão aos bens jurídicos tutelados pela norma de regência, quais sejam, a ordem, a saúde, a segurança e a economia públicas. Acham-se presentes, in casu, dois dos pressupostos específicos para o deferimento do pedido.

Sem adentrar o mérito da decisão que concedeu a tutela antecipada, verifica-se que seus efeitos poderão causar grave lesão à saúde e à economia públicas, porquanto concedeu exclusividade de comercialização do medicamento cloridrato de gencitabina, utilizado no tratamento de câncer de mama, às empresas “Eli Lilly do Brasil Ltda.” e “Eli Lilly and Company”, fabricantes do medicamento GEMZAR, impossibilitando os portadores de tal enfermidade de optarem por um tratamento de custo mais acessível, mediante uso de medicamento genérico ou similar.

Ademais, os pacientes portadores de câncer de mama que se utilizam da rede pública de saúde correm o risco, com a diminuição na distribuição gratuita dos medicamentos, de naturais prejuízos no seu direito ao adequado tratamento da moléstia, dada a possível escassez do produto.

Conforme bem anotado pelo Subprocurador-Geral da República João Francisco Sobrinho, em seu parecer, “contrário ao interesse público seria obrigar os pacientes e o poder público a arcarem com altas somas para a obtenção de um medicamento de alto custo, quando no mercado pode ser distribuído produto similar, cuja eficácia é atestada pelo órgão competente da saúde pública, mediante custo bem menor” (fl. 123).

3. Posto isso, defiro o pedido, a fim de suspender os efeitos da tutela antecipada recursal concedida nos autos do Agravo de Instrumento nº 2007.01.00.017916-0, até o julgamento final da ação principal. Comunique-se, com urgência, ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 04 de março de 2008

MINISTRO BARROS MONTEIRO

Presidente

Revista Consultor Jurídico

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