por Luís Meato
O projeto de desoneração da contribuição patronal sobre a folha de salários, reduzindo a alíquota desta contribuição social para o INSS de 20% para 14%, e a criação de cinco alíquotas para o imposto de renda, algo entre: 5% a 25%, com elevação da isenção para dez salários-mínimos, seriam as melhores propostas para uma reforma tributária que desejasse desonerar realmente a carga tributária geral. Estas propostas não necessitam de reforma constitucional, teriam o apoio de todos, ao contrário do emaranhado de propostas apresentadas pelo atual governo federal, e seriam efetivadas através da compensação das elevadas receitas tributárias.
Dentro do contexto de uma desoneração do setor produtivo, através da realização de uma reforma tributária, esta era a principal reivindicação deste setor.
Contudo, sindicatos representativos de classe dos trabalhadores chegaram a concluir que a redução das alíquotas do INSS patronal acabariam por causar mais problemas de caixa junto a este órgão. Ocorre que, a redução desta alíquota ao contrário do que apontam criaria um cenário mais favorável à redução da alta informalidade do sistema de relação de trabalho brasileiro, e, que, desta forma, haveria a possibilidade da realização de um incremento das receitas previdenciárias, e não uma pretensa diminuição.
Infelizmente, o governo federal aceitou estes argumentos e postergou a redução das alíquotas do INSS patronal para no mínimo 02 anos após a promulgação da proposta de reforma tributária apresentada em 26 de fevereiro de 2008, segundo informa o artigo 11 do projeto governamental, verbis:
“Artigo 11. Lei definirá reduções gradativas da alíquota da contribuição social de que trata o artigo 195, I, da Constituição, a serem efetuadas do segundo ao sétimo ano subseqüente ao da promulgação desta Emenda.”
Em relação ao imposto de renda, já se cogita na criação de cinco alíquotas, mas não se fala quais serão estes percentuais. Ou seja, o governo poderá propô-las com o mínimo em 10%, podendo chegar a 30%, o que, na verdade elevaria a carga tributária atual, tendo em vista que hoje a maior alíquota é de 27,5%. Até porque, cogita-se na proposta a incorporação da CSLL ao imposto de renda das pessoas jurídicas, o que demandará a possibilidade da elevação de alíquota deste imposto para compensar esta unificação, que têm a mesma base de cálculo: o lucro das empresas.
Há no projeto a possibilidade de se propor a unificação da CSLL ao IRPJ, com a revogação da alínea c do artigo 195, inciso I da CF/88 e a criação do inciso III no parágrafo 2º do artigo 153 da CF/88, na qual cria para a Receita Federal a permissão para cobrança de adicionais do IPRJ diferenciados por setor econômico, tal como se dá atualmente com a CSLL, trocando-se, à princípio “alhos por bugalhos”.
Não se verifica uma ampla simplificação do sistema, haja vista a necessidade da regulamentação excessiva através de lei complementar, bem como não há proposta de aglutinação do ISS ao IVA “estadual”, nem tampouco unificação do IPI ao IVA “federal”. O projeto apenas faz referência a derrocada da chamada “guerra fiscal” mediante a unificação das legislações e alíquotas dos Estados membros, e a absorção de algumas contribuições sociais (Cofins, PIS, Cide) ao IVA “federal”, mas, sem estabelecer quais serão as alíquotas correspondentes a este novo tributo, que, ao contrário pode elevar a carga tributária geral.
Existem preocupações dos Estados produtores, à proposta de implantação da incidência do IVA no “destino”, sem qualquer compensação real a estes Estados, o que também pode evidenciar a possibilidade da elevação da carga tributária geral, em face da necessidade de consubstanciar mesma compensação.
O artigo 9º da proposta veicula que lei complementar poderá estabelecer limites e mecanismos de ajustes da carga tributária do IVA “federal” e do imposto de renda, relativamente aos exercícios em que forem implementadas as alterações propostas, verbis:
“Artigo 9º. Lei complementar poderá estabelecer limites e mecanismos de ajuste da carga tributária relativa aos impostos de que tratam os arts. 153, III e VIII, e 155-A, da Constituição relativamente aos exercícios em que forem implementadas as alterações introduzidas por esta Emenda.”
Ora, mecanismos de ajuste da carga tributária, o que isto significa? Limitação da carga por lei? A carga tributária encontra-se associada aos gastos e a necessidade de investimentos públicos, estes sim, são os nortes para se saber os valores necessários para manutenção da máquina pública. Além disso, o valor da carga preconizado encontrar-se-á adstrito aos valores arrecadados nos tributos antecedentes, para não haver perda de receita. Assim, não há como se limitar a carga tributária geral através de lei, tal como existia até pouco tempo em relação aos juros, mas, tão somente equalizar o melhor possível custos públicos.
Verifica-se uma preocupação da proposta em compensar o fim do salário educação e da Cide através de lei complementar através de percentuais advindos do imposto de renda, do IPI e do IVA-F, tentando manter inalteradas as destinações aos diversos fundos constitucionais, mediante a elevação da arrecadação destes novos impostos federais, sem cogitar quais serão os percentuais necessários, remetendo ao pensamento de que o contribuinte está concedendo ao governo federal uma espécie de “cheque em branco”, já que, estes percentuais não estão prontamente definidos, apesar da ressalva na qual resolução do Senado Federal estabelecerá estas alíquotas, na forma ao parágrafo 2º do artigo 155-A.
Nas operações interestaduais, a proposta prevê que o “novo” imposto sobre o consumo pertencerá ao Estado de destino da mercadoria ou do serviço, restando para o Estado de origem o percentual de 2%. O ideal seria um formato partilhado para as operações interestaduais, aonde os percentuais fossem fixos: 55% para Estados produtores, e 45% para Estados consumidores, sendo os produtores compensados por suas perdas. O percentual de 2% pode ficar aquém do necessário para tornar atrativo ao Estado produtor uma ampla fiscalizações dos produtos e serviços do comércio interestadual, podendo dar ensejo a mecanismos de envio de mercadorias e serviços, que na realidade não saem do respectivo Estado de origem, sendo tributados, portanto, com alíquotas inferiores.
O parágrafo 4º do novo artigo 155-A, determina que o Confaz é o órgão com poder de conceder isenções ou incentivos vinculados ao novo imposto sobre o consumo, algo que atualmente já é bastante desrespeitado, entre outras atribuições estabelecidas no parágrafo 7º do artigo 155-A, tais como: “além de editar a regulamentação do novo ICMS, autorizar a transação e a concessão de anistia, remissão e moratória, a serem definidas em leis estaduais ou distrital, (observado o disposto no artigo 150, parágrafo 6º); estabelecer critérios para a concessão de parcelamento de débitos fiscais; fixar as formas e os prazos de recolhimento do imposto; estabelecer critérios e procedimentos de controle e fiscalização extraterritorial; e exercer outras atribuições definidas em lei complementar”.
A designação de uma competência conjunta dos Estados através do Confaz via lei complementar, pode gerar questionamento em face da autonomia constitucional dos Estados membros (arts. 18 e 25 CF/88), o que não pode ser delimitado por Emenda Constitucional, na forma do parágrafo 4º, inciso I da CF/88. Além disso, as penalidades concernentes ao descumprimento destas regras projetam conseqüências na retenção de transferências constitucionais que, para os Estados membros são fundamentais.
O regramento com o qual a arrecadação das operações interestaduais relativas ao IVA-E, pertencerá ao Estado do destino levou o governo a modificar as normas contidas no parágrafo único do artigo 158 da CF/88, que tratam das repartições das receitas aos municípios dos 25% do produto da arrecadação do ICMS (inciso IV, artigo 158 CF/88). Contudo, nesta nova modalidade a repartição ficou a cargo de uma lei complementar, sem maiores garantias aos municípios, especialmente aqueles que produzem os produtos e os serviços – municípios originários, o que deve trazer sérios embates — verbis:
“Artigo 158. (…)
(…)
Parágrafo único. (…)
I – três quartos, nos termos de lei complementar;
(…)”
A redação do artigo 159 CF/88 restou modificada para estabelecer como será a repartição do produto da arrecadação do imposto de renda, do IPI e do IVA-F, havendo a criação de um Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional-FNDR no artigo 161 CF/88, o que deverá ser matéria de debate e estudo, no intuito de se verificar se há respeito aos valores repassados aos Estados e municípios atualmente, e se o percentual de 1,8% será suficiente, por exemplo para suportar o Fundo de Equalização das Receitas dos Estados e D.F.(alínea d, inciso II, do artigo 159 CF/88).
O artigo 195 caput e inciso I, ganham nova redação, verbis:
“Artigo 195. A seguridade social será financiada por toda sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da destinação estabelecida no artigo 159, I, “a”, e das seguintes contribuições sociais:
I – do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício;”
O novo artigo 159, I, a, estabelece que, verbis:
“Artigo 159. A União destinará:
I – do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os incisos III, IV e VIII do artigo 153:
a) trinta e oito inteiros e oito décimos por cento, ao financiamento da seguridade social;
(…)”
Ou seja, do produto da arrecadação do imposto de renda, do IPI e do IVA-F, a União remeterá o percentual alinhado na alínea a para financiamento da seguridade social. Em detrimento disto, a alínea a do inciso I do artigo 195 foi aglutinada à redação do inciso I deste mesmo artigo, haja vista que a Cofins foi incorporada ao IVA-F (Obs: revoga-se a alínea b do artigo 195, I da CF/88, bem como, a alínea c deste mesmo diploma legal, tendo em vista que a CSLL será incorporada ao IRPJ), restando estabelecido no artigo 11 da Emenda Constitucional apresentada pelo governo federal, uma redução gradual das alíquotas do inciso I do artigo 195 da CF/88, verbis:
“Artigo 11. Lei definirá reduções gradativas da alíquota de que trata este artigo no prazo de noventa dias da promulgação desta Emenda.”
Propõe-se ainda, o parágrafo 13 do novo artigo 195 da CF/88, a possibilidade de que lei ordinária determine uma substituição parcial da contribuição social restante no inciso I do artigo 195 CF/88, mediante a elevação da alíquota do IVA-F, o que, pode acarretar aumento da carga tributária geral á título de compensação de tributos, verbis:
“Parágrafo 13. Lei poderá estabelecer a substituição parcial da contribuição incidente na forma do inciso I do caput deste artigo por um aumento da alíquota do imposto a que se refere o artigo 153, VIII, hipótese na qual:
I – percentual do produto da arrecadação do imposto a que se refere o artigo 153, VIII, será destinado ao financiamento da seguridade social;
II – os recursos destinados nos termos do inciso I não se sujeitarão ao disposto no artigo 159.”
A educação básica terá fonte adicional de financiamento através da destinação esculpida no inciso c item 2 do inciso I do artigo 159 da nova redação do artigo 159 da CF/88, bem como, em relação ao seguro-desemprego e o abono do PIS, contam com destinação prevista no inciso b do novo artigo 159 da CF/88, conforme anunciada aglutinação do salário-educação e do PIS ao IVA-F.
No artigo 3º da Emenda Constitucional proposta pelo governo federal, há proposta de redução gradual até o sétimo ano subseqüente à promulgação deste diploma das alíquotas das operações interestaduais de 12% até 2% por último. Bem isto é tema de farta discussão, especialmente em relação a alíquota que restará ao Estado de origem, a qual, caso seja muito baixa, não será suficiente para apoio dos Estados produtores à aprovação desta Emenda.
Atualmente a restituição e compensação de créditos tributários é penosa, sofrendo a incidência de farta burocracia contrária a sua concessão. O governo federal enumera um cronograma de direito à apropriação de crédito fiscal relativo a mercadorias destinadas ao ativo permanente, com redução de horizontes de 48 para 8 meses em sua apropriação, num período de 7 anos após a promulgação da presente Emenda. A situação atual é crítica, e necessita ser enfrentada com maior rigor das autoridades, não podendo aguardar tanto tempo, até porque trata-se de um direito líquido da empresa.
As regras seguintes tratam de módulos de transição, que tentam calibrar possíveis perdas advindas do novo e complexo sistema tributário, que deveria vir em menor número de artigos, porém mais eficientes. Não se vislumbra, à princípio, redução da carga tributária geral, mas, ao contrário, oportunidade para sua elevação.
Revista Consultor Jurídico