por Maria Fernanda Erdelyi
Os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram, por maioria, arquivar a ação de improbidade movida pelo procurador da República Aldenor Moreira de Souza contra o então advogado-geral da União, Gilmar Mendes, atual ministro da Corte. Com o julgamento do caso, o Supremo reforça precedentes de que a Lei de Improbidade Administrativa não pode ser aplicada contra ministro de Estado.
A ação, proposta em 2002, para apurar supostas irregularidades no provimento de cargos públicos na AGU, deve continuar na primeira instância contra os outros réus. São eles: Walter do Carmo Barletta, então advogado-geral da União substituto, Solange Paiva, diretora-geral de Recursos Humanos da AGU e Aluísio Guimarães Ferreira, à época coordenador-geral de RH da AGU.
O ministro Marco Aurélio, relator do caso, ficou vencido. Ele entendeu que a primeira instância é competente para julgar a ação. “Entendo a extensão da prerrogativa de foro como um retrocesso e não como um avanço no campo democrático”, disse ele.
O ministro Menezes Direito, que abriu divergência no plenário, defendeu que o julgamento de uma ação de improbidade contra um ministro de Estado pela primeira instância “quebraria o sistema Judiciário como um todo”. Os demais ministros acompanharam seu voto, com observações.
Ricardo Lewandowski lembrou que o caso em exame trata de magistrado que detém vitaliciedade. “Não se coaduna com a sistemática da Constituição o julgamento de ministro do Supremo, para fins de perda de cargo, pela primeira instância”, afirmou.
Carlos Ayres Britto ressaltou que, embora a Constituição Federal não imponha hierarquia interna corporis ao Judiciário, trata de jurisdição escalonada. Para ele, submeter o caso a um juiz de primeira instância inverteria essa lógica. “Ato de improbidade não se confunde com ação penal comum. Cada coisa é cada coisa. Cada um tem um regime jurídico próprio. A Constituição Federal tratou os membros do Poder Judiciário sem hierarquia. Entretanto, a jurisdição é escalonada”, concluiu. Para Cezar Peluso, seria “algo absurdo, o máximo do contra-senso” submeter o julgamento à primeira instância.
O caso
O procurador pediu a Gilmar Mendes uma lista com o nome e endereços de todos os funcionários que exerciam cargo comissionado na AGU. O então advogado-geral da União disse que só a Procuradoria-Geral da República tinha competência para tal solicitação. O próprio Gilmar Mendes perguntou a Geraldo Brindeiro, então procurador-geral da República, se ele queria a lista. A reposta foi negativa. A atitude de Gilmar Mendes desagradou Aldenor Souza, que ingressou com a ação.
A rixa entre Gilmar Mendes e Aldenor Souza começou em 2001, quando o procurador da República requisitou força policial para, sob coerção, levar o então secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, para audiência em que se avaliava o caso de um funcionário afastado do órgão. Como advogado-geral da União, Gilmar Mendes assumiu a defesa de Everardo Maciel.
Gilmar Mendes chegou a entrar com representação contra Aldenor Souza, mas o procedimento acabou arquivado pelo Ministério Público da União em dezembro de 2004. O argumento foi o de que o ato tido como abusivo, propositura da ação de improbidade em maio de 2004, tinha prescrito.
Prerrogativa de foro
No dia 13 de junho do ano passado, o Supremo decidiu, em votação apertada por seis votos a cinco, que a Lei de Improbidade Administrativa – que prevê ações de improbidade contra servidores públicos em primeira instância – não pode ser aplicada contra ministro de Estado porque eles têm foro privilegiado. Na ocasião o STF concluiu que ministros de Estado devem ser processados com base na Lei de Crimes de Responsabilidade (1.079/50).
A decisão foi tomada na análise da Reclamação contra o ex-ministro da Ciência e Tecnologia Ronaldo Sardenberg. O Ministério Público o acusou de ter viajado para descansar em Fernando de Noronha em um avião da Força Aérea Brasileira.
À época, Sardenberg era ministro do governo Fernando Henrique Cardoso. O processo contra Sardenberg, que agora é membro do conselho-diretor da Agência Nacional de Telecomunicações, foi extinto pelo plenário do Supremo. Isso porque a Procuradoria-Geral da República não o denunciou perante a Corte.
Pet 3.211
Revista Consultor Jurídico