O pedido de vista do ministro João Otávio de Noronha, da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, interrompeu o julgamento do recurso que vai decidir se as seguradoras podem se eximir do pagamento do seguro de vida quando o suicídio é cometido pelo segurado antes de completados dois anos do início do contrato. A seguradora pode negar o pagamento da indenização, de acordo com o artigo 798 do Código Civil.
Prevê o artigo: “o beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso, observado o disposto no parágrafo único do artigo antecedente”.
A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, já votou por reconhecer o direito do beneficiário da apólice. O Recurso Especial ao STJ foi apresentado pela Icatu Hartford Seguros S/A contra a decisão do Tribunal de Justiça gaúcho que reconheceu o direito ao pagamento da indenização.
Depois da recusa da seguradora em pagar o seguro de vida estipulado na apólice, a mãe do segurado entrou na Justiça com ação de cobrança. Ela era beneficiária do seguro de vida feito em outubro de 2003 entre o seu filho e a Icatu. O filho se matou em 16 de agosto de 2004. A mãe afirmava que o suicídio não foi premeditado, ao contrário do que dizia a seguradora.
A primeira instância negou a indenização. Entendeu que a morte do segurado ocorreu antes do prazo de dois anos previsto no artigo 798 do Código Civil de 2002, que estipula o cumprimento de carência bienal como única condição para o pagamento de indenização na hipótese de suicídio do segurado.
A mãe recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. O tribunal gaúcho reconheceu o seu direito à indenização securitária. “A teor do disposto no artigo 798 do Código Civil de 2002, é vedado à seguradora negar o pagamento de indenização em decorrência de suicídio levado a termo após dois anos de contratação”, afirmou.
O Tribunal de Justiça ressalvou que, se o suicídio ocorreu nos dois anos subseqüentes ao início da vigência do contrato, cabe à seguradora provar que houve premeditação do segurado. “Sequer foi cogitada a premeditação pela seguradora”, considerou, ao reconhecer o direito da mãe de receber o seguro. O Tribunal decidiu, ainda, que, se tratando de contrato de seguro de vida, a atualização monetária do valor da indenização deve ter como marco inicial a data da apólice.
No recurso para o STJ, a seguradora alega que a decisão do TJ-RS ofende o artigo 798 do Código Civil de 2002. Segundo a Icatu, o dispositivo da lei estabelece apenas o limite temporal de dois anos como condição para o pagamento da indenização securitária, o que tornaria irrelevante a discussão sobre a remeditação/voluntariedade do suicídio do segurado.
Para a seguradora, a proibição ao recebimento do capital segurado, nas hipóteses em que o suicídio ocorre durante os dois primeiros anos de vigência do contrato de seguro de vida, tem o objetivo de beneficiar os próprios consumidores. “Pois, assim, encerram-se as infindáveis discussões sobre ato voluntário ou involuntário, etc., com processos arrastando-se anos a fio sem uma solução final”, acrescentou.
Voto
A relatora do Recurso Especial, ministra Nancy Andrighi, afirmou que a lei não inovou em detrimento da boa-fé e dos contratantes. “Pelo contrário, delimitou o prazo das discussões acerca da premeditação aos dois anos subseqüentes à vigência do contrato com o fito de banir toda e qualquer celeuma, sempre motivada pelas seguradoras, acerca da premeditação de suicídios cometidos mais de dois anos após a contratação do seguro de vida, prazo este mais que para ilidir qualquer dúvida acerca do eventual desejo de o contratante suicidar-se de forma premeditada”, observou.
O recurso, no entanto, nem foi conhecido pela ministra. “Considerando que, na presente hipótese, a involuntariedade do suicídio cometido pelo segurado sequer é discutida pela recorrente, não merece reforma o entendimento firmado pelo Tribunal de origem, mantendo-se o direito da recorrida beneficiária ao recebimento da indenização securitária”, concluiu Nancy Andrighi.
Depois do voto da relatora, o ministro João Otávio de Noronha pediu vista do processo. Não há previsão para a conclusão do julgamento.
REsp 959.721
Revista Consultor Jurídico