por Sylvia Maria Mendonça do Amaral
O Poder Judiciário vem abrindo caminho importante em favor do reconhecimento dos direitos de homossexuais. A cada dia, temos notícias de decisões de grande relevância proferidas em vários Estados e municípios do Brasil. Podem não ser decisões dominantes nem exatamente aquelas que o segmento GLBT espera, mas, com certeza, a soma delas nos demonstra uma tendência de se conceder aos homossexuais o direito à igualdade. É um direito garantido pela Constituição Federal, porém inúmeras vezes não praticado por pessoas físicas, jurídicas e até mesmo pelos órgãos governamentais.
No último dia 3 de abril, o Superior Tribunal de Justiça voltou a discutir um dos aspectos dessa polêmica questão. Não se discutiu a possibilidade jurídica da existência das uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo (o que não está previsto em nossas leis, porém não é vedado) – discutiu-se a possibilidade de as relações homoafetivas serem analisadas em varas de família.
O que se vê na realidade é que muitos desses relacionamentos são julgados em varas cíveis que, normalmente, tratam de relações comerciais e não de relações de afeto, familiares.
Essa abordagem é prejudicial aos homossexuais que acabam por não ter todos os seus direitos garantidos. Além de terem reforçado, involuntariamente, mais um estigma: o de que não formam uma família e sim uma sociedade negocial, como se fosse apenas isso que existisse entre o casal. É a assunção de que estão à margem da lei e que não têm o direito à igualdade. O que se viu no STJ foi um empate, tendo dois ministros entendido que o assunto deve, realmente, ser tratado em varas de família e outros dois entendendo que isso não é viável, por falta de previsão legal.
Em suma, a discussão é: os relacionamentos homoafetivos, que mantêm inúmeros casais unidos por muitos anos, são questões de família ou societárias? Pode ser vista como uma família uma união estabelecida entre pessoas do mesmo sexo que vivem nos moldes de uma união estável heterossexual? Ou são eles sócios unidos por interesses comerciais, sem que exista qualquer manifestação de amor e afeto?
Aguarda-se o desempate, que ainda não tem data definida para acontecer. É difícil prever o voto do ministro responsável pelo desempate. Mas uma coisa é certa: obter o reconhecimento da obrigatoriedade de o tema ser abordado em varas de família por dois ministros já indica um bom caminho. Se o julgamento for contrário a esse pedido, resta o alento de sabermos que alguns ministros pretendem, minimamente, fazer com que se leve mais a sério um segmento que é visto como marginal, pelo menos no que diz respeito à nossa legislação, pelo próprio Poder Judiciário.
Além disso, com certeza, juízes e desembargadores que se mantinham atônitos até hoje diante da obrigação de julgar casos semelhantes àquele que motivou o debate no STJ, terão estímulo e embasamento em votos de dois ministros que representam o que há de, como o próprio nome diz, superior na estrutura de nosso sistema judiciário.
Revista Consultor Jurídico