O governo federal não pode descontar os dias parados dos auditores da Receita Federal, em greve há 28 dias. A decisão liminar foi do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, do Superior Tribunal de Justiça. Para ele, é preciso observar o caráter alimentar dos salários dos servidores. A liminar vale até julgamento do Mandado de Segurança pela 3ª Seção do STJ.
A decisão vai contra decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. Em ação proposta pela União, ele concluiu que o governo federal deve descontar os dias parados dos salários dos auditores fiscais em greve por dois motivos: o primeiro é que a greve é ilegal; o segundo é que não compete à primeira instância examinar paralisações em mais de um estado. No caso, o ministro julgava recurso da União contra decisão da Justiça do Rio Grande do Sul.
O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, suspendeu o salário da categoria afirmando que a demora da greve obriga o governo a tomar uma posição, sem que se deixe de reconhecer o direito constitucional de greve.
O ministro Maia Filho, do STJ, não acredita que os descontos possam solucionar desejavelmente o impasse. Para ele, esse tipo de iniciativa deve ser coibida pela atuação judicial, inclusive para se evitar que o conflito ultrapasse os limites jurídicos. O ministro afirma que, dessa forma, ele pode se tornar em confronto.
Maia Filho destacou que não é desejável a paralisação das atividades administrativas públicas. No entanto, até agora, governo e servidores não resolveram o problema que deu origem à greve. Para o ministro, é fundamental que a situação seja resolvida, pois a tendência é a radicalização das partes.
Leia a decisão
Mandado de Segurança 13.505 — Df (2008/0082984-5)
Relator : Ministro Napoleão Nunes Maia Filho
Impetrante : Unafisco Sindical Sindicato Nacional dos Auditores
Fiscais da Receita Federal do Brasil
Advogado : Priscilla Medeiros de Araújo Baccile e Outro(S)
Impetrado : Ministro de Estado do Planejamento Orçamento e Gestão
Medida Liminar
Deferimento de Tutela Mandamental Requisição de Informações
Ouvida do MPF
1. Trata-se de Mandado de Segurança Coletivo, com pedido de liminar, impetrado pelo SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES FISCAIS DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL, em adversidade a ato administrativo emanado do MINISTRO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO, que suspendeu o pagamento dos vencimentos da Categoria Funcional representada pela referida Entidade Sindical, fundado o ato da autoridade na alegação de que o prolongamento do estado de greve dos Servidores Fiscais demanda a tomada de decisão por parte da Administração, mas isso sem deixar de reconhecer que a greve é um direito constitucionalmente consagrado.
2. Realmente, o direito de greve dos Servidores Públicos, tem previsão no art. 37, VII da Carta Magna e é induvidoso que se lhes assegura recorrer a esse extremado mecanismo reivindicatório, quando malogram os meios suassórios que lhe devem obrigatoriamente anteceder; é evidente que a paralisação das atividades administrativas públicas sempre será indesejável, inclusive por causa do seu decantado principio da continuidade, a indicar que se trata de algo que não deva sofrer paralisação, ou seja, se deseja que o serviço publico se desenvolva em motu continuo .
3. As idéias de permanência, continuidade, equilíbrio e harmonia nos remetem às noções verdadeiramente clássicas e otimistas da vida humana social, sob a ilusória imaginação de que não haveria opressores e oprimidos, potentados e miseráveis, ou as relações produtivas se desenvolveriam sem rebeliões num universo social cor-de-rosa; mas essa imagem de uma perdida idade-de-ouro social, apesar de tenaz na história humana, só tem de real a enorme capacidade de frustrar os que são crentes na sua possibilidade, como demonstra o notável historiador JACQUES LE GOFF (História e Memória, tradução de Irene Ferreira e outros, Editora Unicamp, São Paulo, 2005).
4. No caso vertente, não há dúvida que as partes interessadas no conflito, de um lado a Administração e do outro os seus Servidores Fiscais, não conseguiram, até agora, com o emprego dos meios suassórios, resolver o problema que serve de leit-motiv ao movimento de paralisação, daí emergindo, com certeza uma situação de tensão específica que deve ser equacionada com urgência, pois a sua perduração somente tende a radicalizar o comportamento das partes, com prejuízos sensíveis e enormes para todos, especialmente para a Sociedade Civil.
5. Não creio que a supressão dos pagamentos vencimentais, pela Administração, possa conduzir à solução desejável desse impasse, mas me parece evidente que tal iniciativa, embora possa corresponder a um impulso natural do Gestor Público, deve ser coibida pela atuação judicial, inclusive para se evitar que o conflito desborde dos limites jurídicos e possa, eventualmente assumir a feição de um confronto, cuja superação demandará esforços muito maiores e custos sociais muito mais elevados .
6. Dessa forma, reconhecendo que a Constituição assegura aos Servidores Públicos o direito de greve (art. 37, VII), proclamo que a falta de lei especifica para o regular, não terá a potestade de paralisar a eficácia daquele direito subjetivo coletivo outorgado pela Carta Magna, não apenas em face do que dispõe o seu art. 5o., § 1o., mas também em razão da lógica jurídica que desrecomenda a retorsão quando o desafio posto demanda mais diálogo do que impulsividade, mais compreensão do que intolerância e mais conciliação do que exasperação .
7. Sendo assim, DEFIRO o pedido de tutela mandamental liminar, aqui postulada e, por conseqüência, determino ao eminente MINISTRO DE ESTADO DO PLANEJAMENTO ORÇAMENTO E GESTÃO, aqui apontado como autoridade coatora, que se abstenha de ordenar ou praticar ou determinar que se pratique qualquer desconto salarial nas folhas de pagamento dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, sob o fundamento do estado de greve em que se acham, tendo em vista, principalmente, a natureza alimentar dessas verbas ; esta ordem vigorará até que a Turma Julgadora desse STJ se manifeste sobre a presente impetração, que melhor dirá.
8. Expedientes de estilo, com prioridade.
9. Publique-se.
10. Intimações necessárias.
Brasília/DF, 16 de abril de 2008.
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
MINISTRO RELATOR
Revista Consultor Jurídico