A procuradora-geral da Justiça Militar, Maria Ester Henrique Tavares, cobrou, nesta segunda-feira (28/4), esclarecimentos urgentes aos ministros da Defesa, Nelson Jobim; da Justiça, Tarso Genro; e da Casa Civil, Dilma Roussef; sobre a apuração do sumiço de documentos oficiais referentes à guerrilha do Araguaia. O Conselho Federal da OAB havia encaminhado representação à procuradora-geral pedindo a abertura de inquérito para investigar e julgar as responsabilidades de militares envolvidos.
Documentos das Forças Armadas relativos ao período de 1964 e 1985 sumiram. No ofício encaminhado por Maria Ester Henriques Tavares ao presidente nacional da OAB, Cezar Britto, ela afirma que não há indícios de quem, quando, onde e como a destruição dos documentos ocorreu.
Do ministro Nelson Jobim, a procuradora-geral da Justiça Militar requereu esclarecimentos a respeito da abertura de qualquer procedimento investigatório no âmbito daquele ministério com foco no desaparecimento dos documentos. Da ministra chefe da Casa Civil, Maria Ester Tavares quer saber quais foram as providências até então tomadas, uma vez que foi a ministra quem recebeu oficialmente a informação de que todos os documentos dos serviços de inteligência das Forças Armadas, do período de 1964 a 1985, foram destruídos.
A procuradora-geral solicitou ao ministro da Justiça esclarecimentos sobre as providências adotadas e sobre o andamento dos trabalhos da comissão interministerial criada para investigar o destino dos desaparecidos na Guerrilha do Araguaia, uma vez que tal comissão teria pedido que militares apresentassem, em 180 dias, os termos da destruição de documentos referentes à guerrilha. Todas as informações requeridas aos três ministros deverão ser encaminhadas por meio do procurador-geral da República.
Maria Ester oficiou, ainda, a Auditoria da 6ª Circunscrição Judiciária Militar e pediu informações a respeito de inquérito policial militar ou de processo cujo objeto tenha sido a descoberta, em dezembro de 2004, de vestígios de documentos da Aeronáutica em matagal situado na base Aérea de Salvador, na Bahia.
A representação foi originalmente encaminhada pela OAB ao presidente do STM, brigadeiro Flávio Lencastre. Na representação, a OAB afirma que a destruição desses arquivos não está protegida pela Lei de Anistia, de 1979, porque ocorreu posteriormente. A Guerrilha do Araguaia ocorreu durante a década de 70 e foi promovida por grupos contrários à ditadura militar. O número de participantes é estimado entre 70 e 80 guerrilheiros.
O relator da proposta na OAB, o conselheiro federal pelo Rio de Janeiro e advogado de presos políticos durante a ditadura, Nélio Machado, observou que a representação é fundamental para o resgate de fatos importantes na história do país e para que não fiquem impunes os responsáveis pela destruição dos documentos importantes sobre o que aconteceu na guerrilha.
Leia o ofício encaminhado pela Procuradoria-Geral da Justiça Militar ao Conselho Federal da OAB
REPRESENTAÇÃO
PROTOCOLO N. 0271/2008
DESPACHO
“Trata-se de analisar Representação elaborada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e dirigida ao egrégio Superior Tribunal Militar, o qual, por sua vez, encaminhou-a a esta Procuradoria-Geral em virtude da falta de competência para decidir a quaestio (fls. 88/89).
A supracitada Representação originou-se de proposta formulada pelo jurista Fábio Konder Comparato, com base em matéria publicada pela Revista Carta Capital, e tem por objetivo a instauração de inquérito policial militar que apure o desaparecimento de documentos secretos dos serviços de informações das Forças Armadas relativos ao período de 1964 e 1985, o que configuraria, em tese, o crime previsto no artigo 321 do Código Penal Militar.
Uma vez que o representante entende que não devem ser excluídas possíveis responsabilidades por parte de oficiais-generais, assevera que a investigação deve ser conduzida por um militar desse círculo e na capital federal, ou seja, “de cima para baixo, sob pena de prevalecer a máxima de que o superior nunca erra, às vezes se engana, mesmo assim por culpa de subordinado” (fl. 10).
A partir da leitura da matéria jornalística acostada às fls. 22/26, extrai-se que a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, “recebeu oficialmente dos comandantes militares a informação de que todos os documentos secretos dos serviços de inteligência das Forças Armadas, do período de 1964 a 1985, foram destruídos”, porém, não há indícios de quem, quando, onde e como isso foi feito (fl. 22). Sendo assim, a Ministra pediu a abertura de investigações ao ex-Ministro da Defesa, Waldir Pires, o qual se comprometeu a fazê-lo, inclusive a reunir-se com o Ministro da Justiça, Tarso Genro (fl. 23).
Consta, também, da referida matéria referência à descoberta, em dezembro de 2004, de vestígios de documentos da Aeronáutica, do período de 1964 a 1985, em matagal situado na Base Aérea de Salvador, sendo que as investigações a respeito deste fato foram reabertas após perícia que contrariou a tese da Aeronáutica de que tais documentos haviam sido roubados, queimados em outro ponto e despejados na Base (fl. 26).
Por fim, encontram-se às fls. 30/69 diversos depoimentos de pessoas que participaram da Guerrilha do Araguaia, as quais relatam, em síntese, fatos ocorridos àquela época e conseqüências da Guerrilha, principalmente de ordem pessoal. Nada emerge dos relatos no tocante ao desaparecimento de documentos em questão.
É o breve relato.
Tendo em vista os documentos constantes dos autos, cumpre coIher maiores informações a respeito dos dados já fornecidos.
Diante do exposto, determino que se oficie, com cópia deste despacho, ao Ex.m Sr. Ministro da Defesa a fim de solicitar-lhe esclarecimentos a respeito da abertura de qualquer procedimento investigatório no âmbito daquele órgão cujo objeto seja o desaparecimento de documentos secretos dos serviços de informações das Forças Armadas relativos ao período de 1964 e 1985.
Oficie-se, com cópia deste despacho, a Ex.ma Sr.a MinistraChefe da Casa Civil a fim de solicitar-lhe informações a respeito de eventuais providências que já tenha requerido a respeito do supracitado desaparecimento de documentos, além do pedido dirigido ao ex-Ministro da Defesa, Waldir Pires.
Oficie-se, com cópia deste despacho, ao Ex.1O Sr. Ministro da Justiça, a fim de solicitar-lhe informações sobre qualquer providência adotada, no âmbito daquele Ministério, no que tange ao desaparecimento de documentos em questão, bem como esclarecimentos sobre os trabalhos da comissão interministerial criada para investigar o destino dos desaparecidos na Guerrilha do Araguaia, levando-se em consideração que, de acordo com a matéria da Revista Carta Capital, tal comissão pediu que militares apresentassem, em 180 dias, os termos de destruição de documentos referentes àquela guerrilha.
Os ofícios acima mencionados deverão ser encaminhados através do Procurador-Geral da República, conforme estabelece o art. 8°, § 4°, da Lei Complementar n° 75/93.
Oficie-se ainda ao Juízo da Auditoria da 6a Circunscrição Judiciária Militar a fim de requerer-lhe informações a respeito de inquérito policial militar ou processo (número, trâmite, eventual pedido ministerial e decisão judicial) cujo objeto seja a descoberta, em dezembro de 2004, de vestígios de documentos da Aeronáutica, relativos ao período de 1964 a 1985, em matagal situado na Base Aérea de Salvador.
Comunique-se o Representante, com cópia deste despacho. Providências pelo Departamento de Documentação Jurídica. Publique-se.”
MARIA ESTER HENRIQUES TAVARES
Procuradora-Geral da Justiça Militar
Revista Consultor Jurídico