por Antonio Rayol
Ao longo de mais de 30 anos de efetivo exercício nos quadros do Departamento de Polícia Federal, o autor deste texto teve a oportunidade de trabalhar em diversas áreas da instituição, inclusive naquela conhecida como “segurança de dignitários”, onde logrou amealhar relevante experiência.
O signatário foi o responsável pela coordenação da segurança do papa João Paulo II, durante sua visita ao Rio de Janeiro em 1997, como também foi o coordenador geral das equipes de segurança móvel aproximada que acompanharam todos os chefes de estado presentes à Rio-92, conferência da ONU sobre o meio ambiente.
A segurança física de autoridades estrangeiras visitantes é responsabilidade do país anfitrião, e como tais autoridades costumam cumprir uma extensa agenda de compromissos, o planejamento da segurança deve ser minucioso e, portanto complexo.
A Polícia Federal deve guarnecer não somente os hotéis onde as autoridades estrangeiras ficam hospedadas, como os locais dos eventos de que participarão e os trajetos entre um local e outro, já que as autoridades visitantes são acompanhadas, de muito perto, por equipes de policiais federais fortemente armados e especialmente treinados.
Existe uma doutrina mundial aplicável aos procedimentos que norteiam as operações de segurança de autoridades, e uma das “regras de ouro” a ser obedecida no planejamento dos trajetos que serão cumpridos pelo comboio em que viaja a autoridade, determina que a passagem por túneis ou pistas elevadas, como pontes ou viadutos, deve ser evitada a todo custo! A razão é simples:
No caso de uma emboscada, uma ponte, viaduto ou túnel pode se transformar em uma armadilha mortal porque não há alternativas laterais de fuga! Pelo mesmo motivo, criminosos em fuga deveriam evitar túneis, pontes ou viadutos já que um sistema de segurança pública organizado, em que existe integração e comunicação, os policiais podem facilmente bloquear as duas extremidades do túnel, ponte ou viaduto, transformando-os em uma “ratoeira” fatal para os bandidos, que ficam sem rotas de fuga.
Pelo menos é assim que acontece em países onde a polícia se comunica e age de forma articulada! No Rio de Janeiro, porém, as coisas acontecem de forma diferente, infelizmente, para os cidadãos de bem! Não são poucos os casos pretéritos em que bandidos realizaram “arrastões” em túneis localizados em áreas nobres da cidade.
Também não são poucos os casos de ataques de criminosos ocorridos em pistas elevadas como a avenida perimetral. A última novidade é que a ponte Presidente Costa e Silva, mais conhecida como Rio-Niterói, tem se transformado ultimamente em segura rota de fuga para bandidos.
Conforme amplamente noticiado pela mídia, na semana passada, bandos armados atacaram motoristas e roubaram carros em Niterói, e usaram a ponte Rio-Niterói como rota de fuga em direção à cidade do Rio de Janeiro! Não é pouca coisa.
A ponte Rio-Niterói, descontando as pistas de acesso, tem 13.290 metros de extensão. Na melhor das hipóteses, leva-se cerca de 10 minutos para atravessá-la, e, em horários de tráfego intenso, pode-se levar até 30 minutos para cumprir todo o trajeto, mas isso não parece preocupar a bandidagem carioca. Tempo mais do que suficiente para que um aparato de segurança eficaz bloqueie as saídas da ponte.
Como a ponte Rio-Niterói é parte de uma rodovia federal, seu policiamento é responsabilidade da Polícia Rodoviária Federal e, nas suas duas terminações deve, ou ao menos deveria haver, policiamento ostensivo estadual a cargo da Polícia Militar carioca.
O fato é que bandos de criminosos armados conseguem atravessar os mais de 13 quilômetros da ponte Rio-Niterói com a certeza de que não serão incomodados. Se alguém contar essa história para um policial norte-americano ou europeu, provavelmente, ele não irá acreditar.
Nós, brasileiros, que tanto gostamos de contar “piadas de português”, não nos damos conta de que as “piadas de brasileiros” são muito mais engraçadas. São engraçadas quando não envolvem tragédias de cidadãos de bem trucidados pelos criminosos que agem com inusitada desenvoltura em qualquer lugar e em qualquer horário do cotidiano do Rio de Janeiro.
Freqüentemente equipes da Polícia Rodoviária Federal instalam, em vários locais, ao longo do percurso da ponte Rio-Niterói, radares móveis para flagrar motoristas que ultrapassam os limites de velocidade. É louvável a preocupação e deve ser boa a arrecadação pecuniária.
Seria muito bom também se a mesma eficiência acontecesse para impedir que bandos de criminosos armados transitassem tranqüilamente pela ponte Rio-Niterói. Seria muito bom também se a PRF e a PM se comunicassem e agissem de forma integrada. Do jeito que está, não pode ficar. Tem alguma coisa muito errada acontecendo ou deixando de acontecer.
Revista Consultor Jurídico