por Maria Fernanda Erdelyi
O Itamaraty ainda não tem posição definida e não descartou totalmente a adesão do Brasil à Convenção de Budapeste – acordo do Conselho Europeu de cooperação e política criminal comum em vigor desde 2004 depois da ratificação com cinco países para o combate aos crimes cibernéticos. Atualmente a convenção engloba 22 países.
A ministra Virgínia Bernardes Toniatti, da Coordenação-Geral de Combate aos Ilícitos Transnacionais, do Itamaraty, afirma que a convenção ainda está sob análise e discussão. Segundo Virgínia, do ponto de vista diplomático, não seria bom para o Brasil aderir a uma convenção já que não participou do discussão dos seus termos. “Nós não participamos das negociações. Não colocamos nossa marca, nossos objetivos e interesses”, afirma Virgínia.
“Como pode todos os países ter o mesmo compromisso e não poder fazer reservas no mesmo patamar? Sempre preferimos negociar convenções importantes”, conclui a ministra. Ela defende sempre a análise das convenções do ponto de vista da legislação constitucional e infraconstitucional do país para que ele não se torne no futuro inadimplente com tratados internacionais que o atendem parcialmente ou não o atendem.
O acordo é considerado importante para alguns especialistas no Brasil uma vez que o país ainda não dispõe de legislação especializada no assunto. Uma proposta está em discussão há quase 10 anos no Congresso Nacional. O procurador da República em São Paulo, Sérgio Suiama é um dos especialistas no tema que defende a adesão do Brasil à Convenção de Budapeste. “Não temos legislação processual adequada para combater os crimes cibernéticos”, afirma o procurador.
Segundo o procurador a adesão traria algumas vantagens como modelo legislativo homogêneo e a adoção de mecanismos de cooperação mais ágeis que a carta rogatória, por exemplo, sistema ainda utilizado no Brasil para troca de informações com outros países. Foi por causa de uma carta rogatória, lembra Suiama, que o Brasil demorou dois anos para conseguir um endereço IP (Internet Protocol) – conjunto de números que identificam a localização de um computador.
De acordo com o procurador, o Brasil também carece de conhecimentos técnicos específicos que já estão em andamento em outros países e, por meio da convenção, seria possível um intercâmbio de experiências. Ele lembra que os provedores de internet do país também têm pouco comprometimento com o combate aos crimes cibernéticos. “O Google, depois de três anos de litígio, resolveu começar a colaborar.”
Suiama disse em conversa com o Consultor Jurídico que tem estudado do ponto de vista técnico jurídico a Convenção de Budapeste para identificar a compatibilização com a legislação já existente no país. Ele afirma que algumas cláusulas da convenção não estão de acordo com a realidade do Brasil. Uma delas é a que prevê o prazo de 90 dias para armazenamento de uma informação de um provedor para investigação. “Com o Judiciário lento que nós temos, como isso é possível no Brasil?”, argumenta.
A ministra Virgínia Toniatti e o procurador Sérgio Suiama, que é coordenador do Grupo de Combate a Crimes Cibernéticos no Ministério Público Federal, participaram de debate quarta-feira (28/5) no Seminário Internacional “Crimes Cibernéticos e Investigações Digitais” na Câmara dos Deputados, em Brasília. Marco Gerke, professor da Universidade de Koln, na Alemanha, defendeu a participação do Brasil na Convenção de Budapeste.
“Para que desperdiçar novas discussões e esforços se temos uma convenção que funciona e que todos os países podem participar”, disse o especialista. Ele defendeu a necessidade de harmonizar a legislação internacional para combater os crimes cibernéticos que cruzam fronteiras no mundo inteiro.
“Precisamos de um instrumento que funcione. Não podemos perder tempo com negociações”, disse. Ele lembrou que a convenção já foi ratificada em países que abrigam grandes provedores e suporte de infra-estrutura como o Google nos Estados Unidos. Os EUA ratificaram a convenção há mais de um ano com 13 reservas.
Respondendo aos argumentos de Virgínia Toniatti de que o Brasil não foi chamado ao debate para a convenção, Marco argumentou que se o país passasse a fazer parte da Convenção de Budapeste teria voz em sua comissão e poderia influenciar rumos futuros.
Revista Consultor Jurídico