por Marina Ito
A falta de regras claras e decisões judiciais sobre a competência administrativa dos municípios, Estados e União, em questões ambientais, causa insegurança jurídica ao país. A conclusão é do desembargador federal aposentado Vladimir Passos de Freitas, em palestra no VI Congresso Internacional de Direito do Ambiente da Cidade do Rio de Janeiro.
Os principais problemas apontados pelo professor referem-se às competências para conceder licenças ambientais e para aplicação de multas. Às vezes, o órgão estadual concede a licença e a União entra em juízo para questionar o ato estadual. Para Vladimir Passos de Freitas, isso causa insegurança jurídica também para os investidores.
O professor explica que a licença do Ibama abrange apenas as situações em que está em jogo interesse de mais de dois estados, bem como de áreas militares, terras indígenas ou zonas econômicas estratégicas. “Não é porque o rio é federal, que o licenciamento para abrir um bar com vista para o rio depende de autorização do Ibama”, exemplifica.
Já o professor Andreas Krell, da Universidade Federal de Alagoas, acredita que, no Brasil, faltam previsões legais para emissão ou negação das licenças. Existem normas técnicas que, para o professor, dificulta o controle do licenciamento.
As multas representam outro ponto de divergência. Um argumento utilizado, e que começa a ser questionado na Justiça, refere-se às multas aplicadas por dois órgãos distintos. O artigo 76, da Lei 9.605/98, determina que a multa aplicada na mesma circunstância pelo município ou Estado substitui a da União.
Para Vladimir Passos de Freitas, isso gera uma série de problemas. Pode haver, por exemplo, um conluio entre o município e a pessoa, ou empresa. Assim, o município multa em R$ 500 e a União ou o Estado não pode multar mais.
De acordo com o procurador do município do Rio de Janeiro Luiz Roberto da Mata, o Ibama tem o entendimento de que as multas podem ser aplicadas por dois órgãos desde que não ultrapassem o limite do valor para determinado dano.
Punição em cadeia
O professor Andreas Krell explicou que na área ambiental há três vias de responsabilidade: civil, penal e administrativo. Na esfera civil, o professor apontou a dificuldade em se estabelecer o valor do dano causado ao ambiente.
Já a responsabilidade penal é considerada importante pelo professor. Segundo ele, 90% dos delitos envolvendo o ambiente são resolvidos através dos juizados. Nesses casos, as sanções são brandas. Com a responsabilidade penal, o crime contra o ambiente ganha uma dimensão maior, ainda que na prática existam poucas decisões nesse sentido.
Já a sanção administrativa, na opinião de Krell, não funciona bem. “A esperança é de que uma dessas responsabilidades ‘pegue’. O problema é se duas aplicações ‘pegarem’. A punição será dobrada”, afirma.
Foi levantada a dúvida se a multa pode ser suspensa se o devastador se comprometer a reflorestar as áreas ou parar com a degradação. No final de maio, o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, anunciou que o governo vai liberar R$ 1 bilhão para o reflorestamento da Amazônia. Aqueles que desmataram além do limite permitido pela legislação poderão ter empréstimos a juros de 4% ao ano para recompor a floresta.
Para Krell, falta, ainda, investimentos em órgãos fiscalizadores. Na opinião do professor, os órgãos públicos não colocam em prática uma fiscalização eficaz para não contrariar interesses políticos.
Intervenção do Judiciário
Para o juiz Ingo Sarlet, do Juizado Especial Criminal de Porto Alegre, a falta de clareza das normas faz com que as demandas judiciais sejam muito maiores. O juiz lembrou que no Brasil há o “empurra-empurra”. Ele explica que no país acontecem conflitos entre os próprios órgãos que têm o dever de tutelar o meio ambiente.
Ingo Sarlet afirmou que o Judiciário ainda não tem estrutura suficiente para julgar questões ambientais complexas. “Não é por falta de vontade”, afirmou. Para ele, uma das soluções é a especialização das varas e dos juízes no tema.
Andreas Krell sustentou que se tem uma instituição capaz de impedir construções ilegais é o Judiciário, pois os órgãos administrativos não têm agido nesse sentido.
Revista Consultor Jurídico