por Henrique Nelson Calandra
Depois de três anos de espera e adiamentos para novos estudos, o questionamento feito pelo, à época, procurador-geral da República, Claudio Fonteles, acerca da constitucionalidade da Lei 11.105/05, que autoriza o uso de células-tronco embrionárias inviáveis para reprodução em pesquisa com fins terapêuticos, teve o desfecho esperado e exemplar.
Homens e mulheres investidos de supremo poder, detentores de capacidade intelectual extraordinária, permitiram que material genético a ser desprezado, seja transformado em esperança de vida para aqueles que sofrem de enfermidades até agora incuráveis. A decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, que indeferiu a Ação Direta de Inconstitucionalidade, é consoante com as seguidas por muitos países e mostra que temos um Tribunal afinado com as novas tendências deste século.
Apesar de toda a polêmica que circundou o tema, considero as manifestações feitas — favoráveis e contrárias — extremamente salutares. A questão da inviolabilidade do direto à vida e à dignidade humana é muito cara e preciosa para o nosso Direito e, somente por isso, merecia um amplo debate.
Esta não foi a primeira vez, e nem será a última, que a Igreja e a Ciência travam um embate. A diferença reside no contexto histórico em que ele está inserido. Hoje, ninguém que se posicione contrariamente ao clero vai para fogueira — uma dívida eterna que teremos com os Iluministas. A medicina, por sua vez, teve a credibilidade sacramentada. E o Judiciário tem se mostrado cada vez mais maduro para julgar questões de grande impacto social.
É justamente por este aspecto que toda a controvérsia revelou-se tão positiva. Esse amplo fórum ofereceu à sociedade, juízes, representantes de entidades pró ou contra a liberação das pesquisas elementos para melhor embasar suas opiniões. Para um magistrado, essa exposição plural de idéias e manifestações — independente se são ou não conflitantes com o posicionamento adotado pelo togado — é essencial para a formação de julgamento.
O bom senso recomenda que sejam consideradas todas as variáveis e implicações jurídicas conferidas a este caso. Portanto, da mesma forma que não foram ignorados os potenciais benefícios que as pesquisas com as células-tronco podem proporcionar, é producente a preocupação revelada pelo ministro Menezes Direito, ao proferir seu voto, no que concerne à falta de um controle mais efetivo dos experimentos realizados com esse material humano.
Assegurar a continuidade das pesquisas com células-troncos embrionárias constituiu-se um grande avanço para comunidade científica brasileira. Agora, o desafio é garantir que os estritos ditames sob os quais foram erigidos a Lei de Biossegurança não sejam desvirtuados. Somente assim, ela cumprirá o seu papel social e ético, que é de ser uma esperança de cura ou de melhor qualidade de vida para os que sofrem de doenças degenerativas.
Revista Consultor Jurídico