Estudos do Ministério da Justiça e da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas revelam que no Brasil há cerca de 80 mil presos provisoriamente, ou seja, sem que tenham sido condenados e cerca de 54 mil condenados por crimes de baixo ou médio potencial ofensivo, o que significa que poderiam cumprir medidas alternativas. Eles representam mais de 30% dos 422.373 presos do país.
Segundo a reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, o déficit nas penitenciárias é de 180 mil. A liberação de 134 mil presos resultaria na abertura de 75% das vagas necessárias para o sistema prisional e uma economia de R$ 4,7 bilhões aos cofres públicos, considerando o custo médio de R$ 35 mil por nova vaga, segundo dado do Ministério da Justiça.
“Esses presos ocupam vagas essenciais para o sistema prisional, sem necessidade”, afirma a coordenadora-geral do Programa de Fomento às Penas e Medidas Alternativas do Ministério da Justiça, Márcia de Alencar.
Para Márcia de Alencar, o maior problema está nas prisões provisórias, que somavam, em dezembro de 2007, data do levantamento do ministério, 147 mil presos, ocupando 35% do sistema prisional. Em países como Estados Unidos e Inglaterra, esse índice é de apenas 2%.
As prisões provisórias, em tese, deveriam se limitar a 81 dias no Brasil. Mas, na prática, os presos chegam a aguardar condenação por até um ano. A melhor média estadual é de 4 meses de espera, ou seja, quase o dobro do previsto.
Para a coordenadora, isso se deve à lentidão da Justiça e pela falta de defesa. “A média de tempo de prisão provisória de um detento que tem advogado particular chega a cair pela metade em comparação com os que dependem de assistência judiciária gratuita”, afirma. De acordo com a coordenadora, existe uma cultura do cárcere no país.
Segundo ela, os números podem estar subestimados, pois não estão considerados cerca de 60 mil presos provisórios que aguardam julgamento em delegacias e cadeias públicas. Segundo Márcia de Alencar, apenas Pernambuco e Rio Grande do Sul não mantêm presos provisórios em cadeias e delegacias.
Entre os presos provisórios, Márcia afirma que há 80 mil aguardando julgamento por delitos de baixo ou médio potencial ofensivo, que não deverão ser condenados com a privação da liberdade. “São aqueles clássicos casos do homem que furtou um pote de margarina ou cometeu crimes ambientais, de trânsito, calúnia ou difamação, estelionato, entre outros”, afirma.
“O que ocorre é que eles aguardam entre as grades até o julgamento por crimes pelos quais, se condenados, poderão receber penas alternativas e sair em liberdade. Ou seja, eles são vítimas de uma pré-condenação. É como se, independentemente do resultado final do processo, a pessoa já tivesse de ser penalizada”, completa.
Penas alternativas
Segundo dados do Ministério da Justiça, pela primeira vez, em 2007, o número de penas alternativas aplicadas nos casos em que houve condenação foi equivalente às sentenças de prisão. Para Márcia, é um marco histórico.
Mas segundo levantamento da Direito GV, pelo menos 25% das condenações ainda poderiam ser substituídas por penas alternativas. São presos condenados a até quatro anos de prisão. “Penas dentro desse limite são aplicadas por crimes sem uso de violência ou grave ameaça. Ou seja, ainda estamos condenando à prisão pessoas que não representam perigo à sociedade”, constata a professora e pesquisadora Maíra Rocha Machado.
A defesa de penas alternativas é fundamentada em números que mostram a falta de eficiência do sistema prisional em recuperar os presos. A taxa de reincidência de condenados à prisão varia entre 70% e 85% nas penitenciárias do país. Entre os que cumprem penas alternativas, o índice cai para 2% a 12% de reincidência. “Isso porque, na maioria das vezes, são pessoas que cometeram crimes acidentais ou residuais. Quanto menos tempo ficarem presos, menos contaminados serão pelo sistema penitenciário”, afirma Maíra.
Ampliação da defensoria
A Defensoria Pública de São Paulo está cheia de casos em que tenta reverter a prisão provisória de pessoas acusadas de tentativa de furto, furto de um pé de alface, de alças de caixão de cemitério, entre outros. “A maioria dos pedidos de liberdade que fazemos é negado. Neste último caso, a justificativa foi falta de comprovante de residência. Como isso seria possível, se são moradores de rua? O que percebemos é que quanto maior a vulnerabilidade social do acusado, maior a chance de sua prisão provisória ser mantida”, afirma a defensora Eleonora Nanni Lucenti.
O Programa Nacional de Segurança Pública e Cidadania promete investir, até 2011, R$ 17 milhões por ano para fortalecer as defensorias públicas . Até 30 de junho, foram empenhados R$ 6 milhões, distribuídos entre São Paulo, Rio, Espírito Santo, Pernambuco, Bahia e Pará. Segundo a defensora Carmen Silvia de Moraes Barros, do Núcleo de Situação Carcerária da Defensoria de SP, seriam necessários 250 defensores para acompanhar as execuções penais no Estado. Atualmente, são 37 nas Varas de Execuções Criminais.
Revista Consultor Jurídico