Grampos telefônicos – De Sanctis nega autorização para mapeamento geral

“Não possui qualquer fundamento afirmar que haveria acesso irrestrito para monitoramentos telefônicos, ou mesmo para acessar banco de dados das companhias telefônicas de qualquer usuário ou assinante.” A frase é do juiz Fausto Martins De Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, e serve como resposta para reportagem publica pelo jornal Folha de S. Paulo neste domingo (3/8).

Na reportagem, o jornal conta que o delegado Protógenes Queiroz e sua equipe, no comando da Operação Satiagraha, que investiga Daniel Dantas, obtiveram ordem da Justiça que permite o mapeamento de todas as chamadas feitas e recebidas por investigados e por pessoas que liguem para um deles. Como as senhas recebidas pelos policiais para acessar os dados não têm restrição de uso, em tese, eles podem mapear as ligações de qualquer cidadão. A decisão não permite acesso ao conteúdo de conversas.

Em nota enviada para a imprensa, De Sanctis afirma que não tem admitido o uso de senhas que permitam o acesso irrestrito às ligações de pessoas que nem estão sob investigação. Ele explica que esse entendimento faz parte, inclusive, do livro que escreveu sobre lavagem de dinheiro.

O juiz diz que a autorização para obter dados cadastrais é dada apenas para determinado tempo e direcionada a determinadas pessoas. “A busca de informações junto às concessionárias públicas mediante senhas judicialmente deferidas somente é realizada por meio computacional, automaticamente com registro do agente policial solicitante, de molde ser possível detectar, com facilidade, quem fez a pesquisa. Não é possível, pois, a utilização leviana do dispositivo sem que se saiba a autoria, razão pela qual até o momento não foi observado qualquer desvio de conduta funcional.”

Na nota divulgada, De Sanctis considera que dados cadastrais da Receita Federal e das operadoras de telefonia são vendidos irregularmente, “fato que já ensejou a instauração de ação penal contra os seus responsáveis junto à 6ª Vara Federal Criminal”.

Leia a nota

NOTA DE ESCLARECIMENTO

Com relação à matéria jornalística publicada na data de ontem (03.08.2008) na Folha de São Paulo intitulada “Polícia Federal obteve acesso total ao registro de chamadas do país”, impõe-se esclarecer o que segue:

1. A 6ª Vara Federal Criminal não tem admitido a obtenção, de forma ampla, de senhas que possibilitem o fornecimento de dados cadastrais de terminais telefônicos e todos os demais relacionados a um determinado terminal, bem como do histórico das últimas chamadas efetuadas e recebidas, conforme, aliás, pode-se verificar de entendimento constante de livro recentemente publicado acerca da Lavagem de Dinheiro, de autoria do juiz titular, Fausto Martin De Sanctis (cf. Combate à Lavagem de Dinheiro. Teoria e Prática. Campinas: Millennium, 2008, p.117 e 118);

2. Na hipótese de apuração de um caso concreto, e desde que devidamente fundamentado o pedido, é possível a obtenção de senhas viabilizando-se a vinda de informações e a análise policial em tempo razoável para eventuais futuras solicitações. Não teria sentido que, a cada ligação telefônica suspeita, fosse necessário requerer em juízo a expedição de ofício a uma determinada concessionária de serviço público para obtenção de dados cadastrais, sob pena de inviabilizar e tumultuar, desnecessariamente, a investigação.

3. Saliente-se que dados cadastrais da Receita Federal do Brasil e de concessionárias de telefonia, por vezes, são vendidos, de forma irregular em praça pública, fato que já ensejou a instauração de ação penal contra os seus responsáveis junto à 6ª Vara Federal Criminal;

4. Assim, as autorizações somente existem quando vinculadas a uma determinada investigação e a atuação da polícia deve se circunscrever a esta. Ressalte-se que essa utilização nunca foi considerada irregular pelas Cortes de Justiça nos processos que tramitam na 6ª Vara Federal Criminal;

5. Importante mencionar que a autorização restringe-se à busca de informações cadastrais exclusivamente das chamadas feitas pelos investigados ou por estes recebidas e medidas futuras necessitarão que se levem em consideração o teor dos diálogos e a necessidade eventual de maiores informações daqueles que tiveram contatos com os primeiros (investigados);

6. A decisão judicial deferindo a obtenção de senhas deixa claro que a autorização é pessoal e intransferível, fornecida apenas para agentes policiais federais determinados e para a investigação em curso, sendo de sua responsabilidade a utilização indevida do mecanismo;

7. A busca de informações junto às concessionárias públicas mediante senhas judicialmente deferidas somente é realizada por meio computacional, automaticamente com registro do agente policial solicitante, de molde ser possível detectar, com facilidade, quem fez a pesquisa;

8. Não é possível, pois, a utilização leviana do dispositivo sem que se saiba a autoria, razão pela qual até o momento não foi observado qualquer desvio de conduta funcional;

9. A autorização de obtenção de senhas não se confunde com autorização para interceptação de linhas telefônicas porquanto a primeira não leva à segunda, nem indiretamente. Os monitoramentos (interceptações) somente entram em funcionamento após a obtenção de ordem judicial, jamais de maneira automática, ou sem critério, não havendo possibilidade de extensão às outras linhas que se comunicarem com a linha interceptada;

10. No caso de ser relevante para a investigação em andamento o diálogo interceptado, o analista designado para acompanhamento dos trabalhos (agentes policiais) identifica o número e somente a partir daí, e em razão da senha obtida, solicita à operadora de telefonia os seus dados cadastrais (desde, é claro, que exista autorizada ordem judicial);

11. Com os dados obtidos, ele apresenta à autoridade policial um relatório circunstanciado sobre o diálogo mantido entre o investigado e seu interlocutor, sugerindo, se o caso, representação ao Poder Judiciário. Somente após a obtenção da decisão judicial, é que a linha que se comunicou com o monitorado pode ser interceptada;

12. Logo, não possui qualquer fundamento afirmar que haveria acesso irrestrito para monitoramentos telefônicos, ou mesmo para acessar banco de dados das companhias telefônicas de qualquer usuário ou assinante, sendo certo que o procedimento de obtenção de senhas é acompanhado pelo Ministério Público Federal e submetido a real controle da Justiça Federal.

Juízo da 6ª Vara Federal Criminal

Fausto Martin De Sanctis

Juiz Federal

Revista Consultor Jurídico

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