por Ricardo Alípio da Costa
Temos acompanhado as manobras de dominação de mercado e eliminação da concorrência orquestrada pelas multinacionais fabricantes de pneus novos no Brasil, infelizmente com a parcimônia do Executivo federal, em detrimento do consumidor.
Tudo começou em maio de 1991, quando estas empresas encontraram terreno fértil ao pressionar o governo a boicotar a importação de pneus usados, que se destinavam às indústrias de reforma de pneus, para impedir o avanço do consumo destes. Em setembro de 2000 foi a vez dos pneus remoldados produzidos na Europa, embora certificados por órgãos de notória idoneidade internacional, mas que aqui foram barrados sob falso argumento ambiental.
Este ano o boicote é contra os pneus novos produzidos na China. Ora são portarias, ora são resoluções que criam, modificam ou extinguem direitos como se leis fossem, sem qualquer debate ou participação democrática das partes interessadas. Até mesmo os parlamentares ficam algemados por regimentos que impedem a votação do projeto de lei que trata do assunto e do mercado como patrimônio da nação.
Em recente debate levado a efeito no Supremo Tribunal Federal, no episódio dos pneus usados e reformados, os ministros contrários à importação teceram longas considerações filosóficas sobre a proteção ao meio ambiente sem atentarem que jamais foi realizada qualquer perícia técnica que comprovasse os efeitos deletérios dos pneus importados ao meio ambiente.
Falaram de riscos de proliferação de vetores de doenças, que podem ocorrer com qualquer pneu que não seja devidamente estocado ou armazenado e não apenas com os importados, não ponderam que a livre iniciativa e livre concorrência são princípios consagrados pela Constituição Brasileira e que a liberdade de escolha do consumidor por produtos que melhor atendam às suas necessidades também é um direito fundamental.
Isto sem falar que as malsinadas portarias são regulamentos autônomos pela comprovada inexistência de leis que lhes dêem suporte e, ainda, que a defesa do meio ambiente é um princípio que deve ser conjugado em concomitância com o princípio do desenvolvimento econômico. Princípios constitucionais são valores fundamentais e harmônicos entre si e não preceitos que se canibalizam.
Não bastasse a facilidade com que o poder econômico se apropriou do mercado brasileiro por governos permissivos e portarias autoritárias, agora é a vez dos pneus novos da China e da acusação, pelas mesmas multinacionais, que os produtores chineses querem dominar o mercado nacional pela prática do dumping (venda de produto por preços abaixo do preço de custo ou de venda em seu mercado de origem) quando, na verdade, querem consolidar sua hegemonia no mercado brasileiro pela força das portarias.
Para completar o descalabro, o governo recentemente elevou de 0% para 15% a alíquota do IPI dos pneus remoldados, mantendo em 0% o IPI dos pneus recauchutados e recapados. As multinacionais também reformam pneus usados pelos processos de recapagem e recauchutagem onde o governo manteve a alíquota do IPI em 0%. Este é o Brasil, “um país de todos”.
Revista Consultor Jurídico