Gilda Figueiredo Ferraz de Andrade*
Na qualidade de advogada militante e de conselheira da maior e mais importante seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, estive e estou atenta aos últimos e candentes debates a propósito das declarações do Exmo. ministro Marco Aurélio, presidente do E. Supremo Tribunal Federal, e chefe supremo do Poder Judiciário da nação.
Nesse contexto, pois, não poderia deixar de expressar publicamente, e aqui o faço por convicção e sob a fé de meu grau, uma vez que o profissional do direito, o advogado, “indispensável à administração da Justiça”, nos termos da Carta Política vigente, não pode e não deve silenciar quando se depara frente a frente com a injustiça, esta sob as mais variadas formas e matizes.
Não, S. Excelência, o i. min. Marco Aurélio Mendes de Farias Mello não me constituiu sua procuradora para defendê-lo das últimas, injustas e reiteradas declarações, venia permissa, que encontraram respaldo e amparo na imprensa escrita nacional e que, contra S. Exa publicou alguns editoriais que não correspondem à realidade dos fatos, colocando S. Exa repita-se, injustamente, na “bola da vez”.
Isto porque S. Exa, o eminente presidente da Corte Suprema, em entrevista a determinado, sério e prestigiadíssimo jornal paulista, externou e reiterou seu entendimento contrário à “Reforma do Sistema Previdenciário” da forma como estaria sendo conduzida e levada a efeito a proposta a ser talvez implantada pelo atual governo.
Afirmou na oportunidade S. Exa tão somente que (as tais reformas) “dificilmente prosperariam em um Estado Democrático de Direito, principalmente se tentarem derrubar o instituto do direito adquirido”.
Concessa venia, o i. presidente de nossa Corte Suprema, ao assim se expressar, não transgrediu, como se pretendeu lançar, “mandamento ético basilar”, mas ao revés, S. Exa nada mais fez que tornar público, afirmando, de forma categórica, enfática, carismática e veemente, características e virtudes próprias de seu caráter, – que não permitiria que o instituto do direito adquirido fosse atropelado pela Reforma do Sistema Previdenciário então anunciada.
Ora. Ora. Se tais declarações de S. Exa, que tornaram notórios seu entendimento e seu mister – o de Guardião da Constituição Federal -, que não o responsabilizem, como se pretendeu, pelas já quotidianas oscilações de mercado, de câmbio e de índices econômicos e “qui plus est”, como se publicou, as declarações de S.Exa. amedrontaram potenciais investidores estrangeiros, que talvez pudessem interpretá-las como “indícios inquietantes” de malogro do governo Lula neste particular, já que o governo que o precedeu fracassou no combate ao déficit do sistema previdenciário, este sim, verdadeira pedra de toque que se pretende e que se deve combater, mas sem atropelar direitos adquiridos, ou, em outras palavras, sem que se alterem as regras de um “jogo” já iniciado.
Em verdade, “voto vencido” ou não entre seus pares na Corte Suprema que ora preside, S. Excelência não se intimida em externar publicamente uma de suas principais funções, a de guardião da Constituição Federal do país.
Há que merecer o necessário registro, S.M.J., que possui S.EXA. brilho próprio, e, se “atrai ou não os holofotes”, não se lhe pode culpá-lo por ser carismático, eloqüente, uma vez impensável o argumento de que teria S.EXA. “atração pelos holofotes e propensão a ser, intencionalmente, a voz dissonante no Supremo Tribunal Federal, como publicado.
O i. Presidente e ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mello é dono e senhor absoluto de uma personalidade obstinada pela busca da Justiça. Seu brilhante curriculum vitae é auto-explicativo.
Aos 35 anos de idade apenas, já era empossado ministro da mais alta Corte Trabalhista do país, o Tribunal Superior do Trabalho. Desta forma, e com a autoridade que lhe foi legitimamente conferida – a de chefe do Poder Judiciário dessa Nação -, S.Exa nada mais fez que defender e explicar, de forma categórica, firme, eloqüente, que o instituto do direito adquirido não será e não seria atropelado para viabilizar a aventada, sonhada e nunca efetivada Reforma do Sistema Previdenciário enquanto estivesse ele ocupando a Presidência do Supremo Tribunal Federal.
Não, S. Exa não “provocou” o debate em tela, tampouco “brigou com os fatos”. Antes de tudo, S. Exa procurou e trouxe à baila a discussão acerca do instituto do direito adquirido, que seria fatal e lamentavelmente afrontado, caso este malsinado Projeto de Reforma do Sistema Previdenciário que lhe foi apresentado fosse realmente implantado pelo recém-eleito governo do presidente Lula.
Infelizmente, o ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, e seu estilo transparente, carismático, verdadeiro, foi e tem sido injustamente atacado e, sem sombra de dúvida, por conta de suas declarações, S. Exa obteve o incômodo lugar de “bola da vez”.
Mas de quem? A quem interessa ou interessaria o enfraquecimento do Poder Judiciário, quem se beneficiaria com o aventado atropelo do direito adquirido?
Impossível deixar de registrar a exemplar e brilhante carreira por ele galgada. Trata-se de um magistrado com eme maiúsculo, professor universitário, detentor de uma caráter obstinado, concessa venia, na busca incessante de fazer e de aplicar a Justiça.
Pouco importa se é ele “voto vencido” ou não na Corte que preside, mas possui S. Exa, com toda certeza, verdadeira obstinação pelo ideário da Justiça, não se intimida e jamais se intimidará com as circunstanciais simpatias e antipatias da mídia e dos próprios jurisdicionados.
Quando ministro do Tribunal Superior do Trabalho, deixou ali extensa e magnífica obra, e seus Votos de então naquela Corte Laboral assemelham-se a obras de primeira grandeza.
Hoje, ao defender a Constituição Federal e via de conseqüência, ao defender o instituto do direito adquirido, pronto a ser atropelado, externou S. Exa seu entendimento como técnico do Direito posto, sem transgredir princípio ético algum, mas antes, defendendo a Lei Maior, como aliás lhe compete em suas atuais funções de atual Presidente da mais alta Corte de Justiça do país.
Argumentos afloram e tentam, sem êxito, culpá-lo por seu estilo franco, cativante, carismático, verdadeiro, virtudes que sem sombra de dúvida atraem a mídia, tantas vezes forçosamente calada pela omissão e pela opressão.
As declarações de S.EXA. não oferecem risco algum aos “investidores” estrangeiros e muito menos interferem no que se denominou chamar de “risco Brasil”. Não. S. Exa não está a merecer o rigorismo expresso nos editoriais que o censuraram.
Como culpá-lo por defender publicamente a Lei Maior? Como não admirar a sua lucidez de suas declarações, a transparência em suas atitudes profissionais, o espírito de liderança, a invulgar independência, o inegável carisma e finalmente, como não reconhecer em sua personalidade, polêmica ou não, o aguçado senso de Justiça e a aversão à injustiça e ao desequilíbrio social?
Sua carreira galgou merecidos e elevados degraus, e “voto vencido” ou não, S.EXA. assumiu o mais alto posto na hierarquia Judiciária quando tomou posse como presidente de nossa Suprema Corte.
Independência, transparência em suas atitudes, e tantas outras qualidades impregnadas no caráter de S.EXA., ministro Marco Aurélio talvez possam colidir, nos dias de hoje, S.M.J, com a velha e vetusta máxima que “os juízes só falam nos autos”.
Ora, se assim fosse, estaríamos todos tapando “o sol com a peneira”, porquanto mais que cediço, enquanto profissionais do Direito, ser inviável o atropelo de institutos tais quais o do direito adquirido, como se pretendeu.
Não, a postura de S. Exa em suas últimas declarações ora sob comento, não estão à busca dos “15 minutos de fama”, até porque sua inteligência e saber jurídico são notórios, e seu brilhantismo, incontestável. Muito menos age S. Exa com vistas a atrair a atenção da mídia, especializada ou não.
Suas “polêmicas” declarações técnicas não foram responsáveis pela oscilação de bolsas de valores, do mercado de câmbio e muito menos pelo “sobe-e-desce” de índices econômicos. Suas declarações tampouco fizeram flutuar o já famoso “risco Brasil”. Apenas manifestou S. Exa irrestrito respeito ao Estado Democrático de Direito.
Demais disso e a este propósito, a própria imprensa tem por dever cobrar das autoridades ética, dignidade, lealdade, postura e dignidade, virtudes impregnadas e escancaradas na independência e no caráter do i. magistrado e atual presidente do Poder Judiciário do país..
O i. ministro Marco Aurélio Mendes de Farias Mello, com singular fidalguia, didática, galhardia e independência ao defender o direito adquirido nada mais fez que dizer a verdade e colocar os “pingos nos is”.
De fato, optou ele pela verdade, doa a quem doer. E por vezes a verdade dói!
Gilda Figueiredo Ferraz de Andrade é advogada trabalhista em São Paulo e conselheira da seccional paulista da ordem dos Advogados do Brasil.