Paulo Castelo Branco*
Quando conheci o líder estudantil José Dirceu, ele estava no alto de um muro nas imediações do Calabouço, no Rio de Janeiro. Éramos jovens estudantes e eu assistia às manifestações e ouvia as palavras do hoje primeiro-ministro do governo Lula. Naqueles tempos de 1968, o homem falava pelos cotovelos e se impunha como um dos modificadores da humanidade.
A ditadura se fortaleceu, e o Zé desapareceu. Voltou tempos depois, sem ninguém saber e, calado, se estabeleceu como comerciante lá pelo interior do Paraná. Na volta da democracia, falando baixo para não assustar os militares que já se dispunham a entregar o poder, o Zé foi se firmando como político importante, mas sempre como articulador e não como voz forte no plenário do Congresso Nacional.
Hoje, chefe da Casa Civil, o ministro José Dirceu, do alto da sua verdadeira identidade e com a função de calar as palavras dos seus antigos aliados, vem, aos poucos, eliminando os que permanecem na convicção de que as reformas somente se farão se forem em benefício da população carente e desejosa de soluções tanto prometidas pelo Partido dos Trabalhadores.
O ministro tem sido duro até mesmo com o vice-presidente José Alencar, que, apesar do curto período nos bancos escolares, formou-se como um dos maiores empresários brasileiros e dá aulas de conhecimentos políticos e econômicos. Mas, mesmo assim, José Dirceu resolveu desafiar a segunda mais importante autoridade da nação, afirmando que a questão dos juros altos é assunto do ministro da fazenda e que este é o responsável pela política determinada pelo presidente Lula; opiniões dos outros não interessam e devem ser tomadas apenas como palavras, palavras, palavras.
Foram palavras o que mais ouvimos nestes anos de promessas sem fim, palavras foram proferidas dos palanques, seminários, aglomerações e em outras tantas situações, como forma de incutir na cabeça do eleitor a garantia de melhores tempos; tempos estes que não chegam e que demorarão um pouco a chegar, segundo os não radicais do poder. Estas mesmas palavras devem ter sido proferidas na intimidade da quarta reunião ministerial que o presidente realizou nessa segunda-feira. Foi mais uma rodada de avaliação de ministério sem recursos e cheio de idéias a serem implantadas no segundo mandato presidencial; se houver, pois Lula é contra a reeleição há muitos anos.
Mas, somente palavras não serão suficientes para encher a barriga do povo, que já está com “fome dez”, aguardando a vez nestes cinco meses cravados de governo. O que se vê é a imagem cada vez mais robusta do presidente, mesmo tendo ao seu lado a fiscal que vigia não somente o assédio, como a boca de comer e não a de falar do companheiro-presidente, já cansado de não realizar os seus sonhos de trabalhador-operário, mas sem se cansar de prometer que um dia o sonho será real.
A realidade, no entanto, já se aproxima com outras imagens, como a de Maria “baixinha”, irmã do presidente, que se aventurou num verdadeiro programa alimentar e, tal qual o povo brasileiro, fez dieta, emagrecendo 16 quilos, desde 1º de janeiro, ganhando um carro zero quilômetro, o qual terá o tanque cheio com desconto de R$ 0,06 por conta da redução de 20% do preço do petróleo. Estes benefícios que já chegaram aos bolsos dos funcionários públicos, que tiveram 1% de aumento nos salários e que descontarão, em nome da estabilidade da moeda, 20% sobre as suas aposentadorias. Assim segue a roda da vida e da fortuna.
Vivemos num país tropical, abençoado por Deus, sem intempéries e com um futuro cada dia mais distante. Tudo será bom desde que possamos comprar o novo livro do imortal Paulo Coelho, que relata o que é possível fazer em onze minutos e não em quatro anos, ficando quase sem palavras. Se não der certo, restará ao povo, na sua infinita fé, comprar na feira do Guará uma foto ou imagem de São Lula e acender uma vela.
Paulo Castelo Branco é advogado e ex-secretário de Segurança Pública do DF.