Por Valacir Marques Gonçalves
O colunista Cláudio Humberto escreveu: “Justiça seja feita: sem pessoal nem recursos materiais suficientes, a Polícia Federal cumpre com profissionalismo a decisão do juiz de submeter os americanos ao mesmo tratamento que eles dispensam aos brasileiros”.
Esse comentário tem os dois lados da moeda. Afinal de contas, por que se efetua um serviço sem condições para tal? Por que a Polícia Federal precisa mostrar ao mundo que é desatualizada, sem meios, sem pessoal suficiente, sem planejamento, contando apenas com o profissionalismo de seus integrantes? A pergunta precisa ser feita. Quem está sendo humilhado? São os alegres turistas americanos em férias, que chegam vestindo a camisa da seleção brasileira, ou a Polícia Federal, com agentes correndo de um lado para o outro, com “mavikas” debaixo do braço. E o povo acha que, finalmente, o império americano está “de joelhos aos nossos pés”?
Deve-se concordar com imprensa quando dizem que a implantação do processo de controles nos Estados Unidos é o resultado de um ano de planejamento. A medida brasileira foi adotada com precipitação inacreditável, sem dar tempo a Polícia Federal de produzir uma rotina eficiente.
A legitimidade intelectual desta discussão nos leva àquela velha pergunta que teima em não calar: A quem interessa uma Polícia Federal nesses moldes? A quem interessa termos um modelo de segurança incapaz de controlar suas fronteiras?
Até quando o país será dependente de grampos telefônicos, que podem sim ser usados, como meios, não como um fim. Quem os governantes estão tentando enganar?
Chega a ser revoltante a incompetência implantada. Os “técnicos” que governam para equilibrar despesas e atender as exigências do FMI (que tanto abominavam), só pensam em aumentar impostos, CPMFs, taxar aposentados e viúvas, pedágios e outras diabruras, com uma falta de criatividade.
Para resolver os problemas do país, poderiam pensar em outras soluções. Podemos citar um exemplo gritante: a famosa “Ponte da amizade”, a fronteira do Brasil com o Paraguai. São milhões de impostos desperdiçados na exibição na televisão, em rede nacional, do contrabando e o lançamento de pacotes de cima da ponte para dentro do rio. Dá-se empregos para chineses, coreanos enquanto os trabalhadores brasileiros clamam por trabalho para poder sustentar as famílias, entrar no mercado de consumo e fazer circular a riqueza em benefício de todos.
Alguém se apressará em dizer que é muito difícil controlar as fronteiras de um país do tamanho do Brasil. Isso é uma balela atroz e inaceitável. Basta investir, basta querer, para usar palavras da moda: basta ter vontade política.
Enquanto isso, pra cobrar pedágio a eficiência é fantástica. São centenas de postos privatizados, onde dia e noite entra dinheiro, canalizando recursos que são obtidos para grupos que se lucram em nome de modernizar estradas. É óbvio que é um bom negócio. Basta acontecer qualquer “feriadão”, milhões de pessoas contribuem sem qualquer problema.
Por que existem filiais de Bancos nas mais remotas localidades do Brasil? Pode-se fazer qualquer tipo de movimento bancário em agências “online”, que dão qualquer tipo de informação. Que milagre foi esse? Quem foram os gênios que implantaram essa maravilha tecnológica? Isso tudo foi implantado sem alardes. O custo-benefício todos sabem. Os Bancos estão com lucros enormes, e expandem cada vez seus serviços e uma eficiência (para os acionistas deles, claro) inegável.
Para citar outros exemplos, o Brasil consegue fazer com que milhões de contribuintes declarem o imposto de renda via internet, um sistema elogiado no mundo inteiro. Até nossas eleições: enquanto a potência tecnológica e econômica que são os Estados Unidos leva dias e dias para apurar sua eleição com trapalhadas vergonhosas. O Brasil consegue implantar um sistema exemplar, digno de inveja de grandes potências, que está sendo até exportado.
Por tudo isso, é difícil entender por que a Polícia Federal de um país que detém uma das maiores economias do mundo, que consegue um superávit comercial de 24 bilhões de dólares, mas não consegue modernizar seus órgãos de segurança. É difícil entender por que os dirigentes não têm interesse de colocar suas polícias em condições de igualdade com as polícias de países com o mesmo potencial. O povo brasileiro não agüenta mais tanta violência e injustiça, que chega a ponto de chefes de família serem expulsos de seus lares por bandidos e traficantes.
Muitos já falaram sobre esse assunto, mas falam ao vento porque não há ninguém interessado em solucionar o que está todo mundo vendo. O que há de errado com os discursos sobre o óbvio é que eles corrompem a consciência com a sua repetição e ninguém se importa mais, achando que é normal o anormal.
Será difícil haver a mudança desejada por todos, mas as denúncias devem continuar. O Brasil tem que encontrar o caminho. Os governantes um dia vão entender que não é tão difícil, basta querer.
Valacir Marques Gonçalves é formado em Direito e Jornalismo, agente de Polícia Federal e diretor do Sindicato dos Policiais Federais no Rio Grande do Sul.