por Carolina Penteado da Costa Galvão e Mateus Leandro de Oliveira
A atividade imobiliária no Brasil vem passando por um momento de muitas transformações nos últimos anos em decorrência de grandes inovações comerciais e alterações legislativas que influenciam de forma decisiva os negócios imobiliários e demandam dos diversos atores do mercado imobiliário a necessidade de atualização jurídica constante.
Esta necessidade não é exclusiva das empresas que desenvolvem empreendimentos imobiliários ou comercializam imóveis, mas de todas as empresas em geral, instituições financeiras, fundos de pensão e, inclusive, pessoas físicas que realizam qualquer tipo de negócio imobiliário, investem em papéis lastreados em recebíveis imobiliários ou utilizam-se da locação de imóveis como fonte de renda.
As empresas do mercado imobiliário, nesses últimos dez anos, especializaram-se, ainda mais, em segmentos específicos de atuação, com vistas a otimizar suas atividades, o que possibilitou o desenvolvimento de novos produtos e formas de atuação, criando desafios em face da legislação brasileira. Exemplo bastante claro é o caso das operações “Built-to-Suit”, também conhecidas por “locação sob encomenda”, realizadas com freqüência. Por se tratar de operação bastante complexa, envolvendo o regramento de suas diversas fases, depende de árduo trabalho jurídico de estruturação contratual com a finalidade de viabilizar o empreendimento, vez que a legislação brasileira não prevê de forma detalhada as regras aplicáveis a este negócio.
Além das inovações criadas pelo próprio mercado houve um crescimento bastante acentuado no número de novas leis e alterações legislativas relacionadas à atividade imobiliária.
Esse movimento de inovações na legislação imobiliária e urbanística teve grande impulso com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que consagrou a função social da propriedade como direito e garantia fundamental (art. 5º, XXIII) e como princípio geral da atividade econômica (art. 170, III), além de dedicar um capítulo específico à Política Urbana (artigos 182 e 183), inserido no título que trata da Ordem Econômica e Financeira. Tais dispositivos delinearam alguns instrumentos de política urbana a serem utilizados na ordenação dos espaços urbanos, que possibilitam uma interferência maior do Poder Público na propriedade privada, o que poucas décadas atrás era inaceitável.
Foram, ainda, aprovados, sancionados, promulgados e publicados: (a) o Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90), aplicável aos casos de comercialização de imóveis entre empresas e consumidores finais, entre outros, demandando um trabalho rigoroso de adaptação dos contratos aos novos preceitos legais; (b) a Lei do Inquilinato (Lei n. 8.245/91), aplicável às locações de imóvel urbano, residencial e comercial, que prevê diversos preceitos de ordem pública, em relação aos quais as partes não podem contratar de modo contrário; (c) a Lei dos Fundos de Investimento Imobiliário (Lei n. 8.668/93) que, em conjunto com a Instrução n. 205/94 da Comissão de Valores Mobiliários – CVM, possibilitou essa nova forma de investimento, em que os recursos são destinados à aplicação em empreendimentos imobiliários; (d) Lei do Sistema de Financiamento Imobiliário (Lei n. 9.514/97 e MP 2.223/2001), regulamenta o Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI), a securitização de créditos imobiliários, o regime fiduciário, a Letra de Crédito Imobiliário (LCI) e a Cédula de Crédito Imobiliário (CCI); (e) o Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257/2001), que atendendo aos preceitos dos artigos 182 e 183 da Constituição Federal, institui e regulamenta uma série de novos instrumentos de política urbana e verdadeiros institutos jurídicos; (f) o novo Código Civil (Lei n. 10.406/2002), que alterou inúmeros aspectos relacionados ao direito imobiliário, por exemplo, os novos preceitos aplicáveis ao condomínio em planos horizontais, agora expressamente denominados condomínio edilício. Vale lembrar, que a lista acima menciona apenas algumas das principais inovações e alterações legislativas que influenciaram o mercado imobiliário nos últimos anos.
Não obstante as leis federais acima relacionadas, é de extrema importância atentar para as peculiaridades da legislação de cada município, já que em matéria de Direito Urbanístico, os municípios têm competência para legislar. Ou seja, a legislação municipal também tem reflexos nos negócios imobiliários, dada a amplitude dos poderes conferidos ao Poder Público municipal. Neste sentido, no município de São Paulo, entre diversas outras, tivemos a Lei da Operação Urbana Água Espraiada (Lei n. 13.260/2001) e o Plano Diretor Estratégico (Lei nº 13.430/2002), que geram inúmeras discussões e necessidade de adequação das operações imobiliárias à nova realidade.
Nota-se que a legislação aplicável aos negócios imobiliários tem se tornado cada vez mais complexa e dinâmica, haja vista o grande número de projetos de lei em discussão, tais como os que tratam da lei de loteamentos, do patrimônio de afetação, do zoneamento, da lei do inquilinato, dentre outros.
Nesse sentido, além da necessidade de atualização jurídica constante, torna-se imprescindível adotar todas as medidas necessárias para assegurar que os negócios imobiliários e os imóveis estejam plenamente de acordo com a legislação vigente, bem como em sintonia com os projetos de lei em discussão, valendo-se, sempre que necessário, de assessoria especializada.
É preciso, ainda, que o debate de temas envolvendo o Direito Imobiliário e o Direito Urbanístico seja cada vez mais incentivado, de forma a sedimentar a utilização dos mecanismos já desenvolvidos e a fomentar a criação de novos produtos, propiciando a evolução do mercado imobiliário com o dinamismo que hoje se impõe.
Carolina Penteado da Costa Galvão é sócia do escritório KLA – Koury Lopes Advogados
Mateus Leandro de Oliveira é advogado do departamento de Direito Imobiliário do escritório KLA – Koury Lopes Advogados