Shopping é responsável por roubo ou acidente em suas dependências

por Laércio José Loureiro dos Santos

É obvio que o consumidor procura estabelecimentos tais como os shoppings e hipermercados em razão da suposta “segurança” que dariam aos compradores tanto no aspecto de seus bens quanto ao aspecto da integridade física. São verdadeiros fenômenos comerciais impulsionados pela violência urbana.

Portanto, este diferencial de segurança é da própria essência da relação de consumo que tem como fornecedor o shopping-center e o hipermercado. A suposta “segurança” física e de bens é um atrativo comercial evidente. Pais, por exemplo, sentem-se mais tranqüilos com seus filhos dentro de um shopping do que num estabelecimento na rua. As pessoas em geral ficam mais desprendidas quanto a bolsas e carteiras dentro de aglomerados comerciais como estes.

O produto oferecido no mercado de consumo é o de aquisição de produtos cercados de segurança física e patrimonial. Não se trata de um produto apenas e nem de um serviço isolado. Ocorre a fusão dos insumos mercadoria e segurança.

Se, por exemplo, uma criança tem um dedo ou membro decepado pela escada rolante de um estabelecimento esta deve ser indenizada, segundo as regras do Código de Defesa do Consumidor (CDC), já que a segurança é inerente ao negócio de shopping e hipermercado. Da mesma forma uma pessoa vítima de roubo.

Oferecer segurança física e de bens acima da média dos demais segmentos comerciais é do próprio tipo de negócio escolhido. Qualquer diminuição em sua robusta segurança deve ser vista como defeito no serviço. O serviço oferecido pelos shoppings e hipermercados é a venda de produtos com segurança física e patrimonial acima do comum.

Por conta de tal diferenciação destes estabelecimentos é que o STJ entende que até mesmo um assalto dentro deste estabelecimento é de sua inteira responsabilidade, já que, por definição, deve ter mais segurança que os demais estabelecimentos comerciais.

Nesse diapasão já decidiu, aliás, o Colendo STJ (…)”Responsabilidade civil. Ação de conhecimento sob o rito ordinário. Assalto à mão armada iniciado dentro de estacionamento coberto de hipermercado. Tentativa de estupro. Morte da vítima ocorrida fora do estabelecimento, em ato contínuo. Relação de consumo. Fato do serviço. Força maior. Hipermercado e shopping center. Prestação de segurança aos bens e à integridade física do consumidor. Atividade inerente ao negócio.(…)” ( RESP 419059/SP , Min. ANCY ANDRIGHI, DJ 20.11.04 – grifos nossos).

Aparentemente, uma tentativa de estupro não teria nenhuma relação com o oferecimento de produtos tais como alimentos e roupas. Porém, o produto oferecido não é apenas a roupa ou o alimento, mas a roupa e o alimento adquiridos de maneira segura e tranqüila. Em razão da segura e tranqüila aquisição de produtos é que as pessoas procuram shoppings e hipermercados.

As principais conseqüências práticas da existência de relação de consumo com o serviço prestado pelo shopping e pelo hipermercado é o de que eventual acidente em suas dependências será regido juridicamente pela responsabilidade objetiva do réu, a vedação da denunciação da lide, bem como pela inversão do ônus da prova. Tais estabelecimentos oferecem ao mercado não só produtos, mas produtos agregados de segurança física e patrimonial.

Tratando-se de relação jurídica regida pelo Código de Defesa do Consumidor, de rigor a aplicação do artigo 7º do referido Códex e conseqüente solidariedade dos réus.

A legitimidade passiva das partes decorre do disposto pelo artigo 7º, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece o princípio da solidariedade dos fornecedores. Note-se que a regra que estabelece a solidariedade dos fornecedores de produtos ou serviços está intimamente ligada à regra que veda a denunciação da lide.

Tanto a regra da responsabilidade solidária quanto a da impossibilidade de denunciação da lide estão em consonância, ainda, com o estabelecido no artigo 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, ou, seja, “a facilitação” da defesa do consumidor.

Portanto, a fim de evitar intermináveis discussões processuais, o CDC estabelece duas regras em consonância com o princípio da facilitação da defesa do consumidor em juízo: a impossibilidade de denunciação da lide pelo fornecedor e a solidariedade passiva destas mesmas figuras. O consumidor pode, na prática, escolher aquele prestador de serviço em que se afigure mais fácil conseguir a indenização devida.

Desta forma, eventual culpa dos réus deve ser discutida em ação própria e independentemente do consumidor. Se a escada rolante, por exemplo, for imprópria ao uso por culpa do fornecedor do shopping ou do hipermercado estes é que devem — noutra ação — procurar satisfação pecuniária. Da mesma forma, se a empresa de segurança contratada pelo shopping não conseguiu conter um roubo a mão armada que discutam, posteriormente, em ação própria a culpa de cada um.

Note-se, ainda, que a questão da culpa é irrelevante para o consumidor nos termos do artigo 12 do CDC que estabelece, com a clareza do sol a responsabilização objetiva do fornecedor de produto ou serviço.

Desta forma, a facilitação da defesa do Consumidor em juízo inclui a desnecessidade de discutir-se acerca da negligência, imprudência ou imperícia de cada um dos fornecedores, sendo tal questão objeto de ação própria entre os fornecedores, nos termos do parágrafo único do artigo 12 do CDC.

Trata-se da chamada “responsabilidade pelo fato do serviço”. Ou seja, diferentemente da responsabilidade do Código Civil, a responsabilização sob a égide do CDC requer apenas e tão somente o nexo de causalidade e não a existência efetiva de culpa, que, neste caso, é irrelevante.

Assim, a regra aplicável aos shoppings e hipermercados quando ocorrerem acidentes ou crimes é o Código de Defesa do Consumidor, já que — no caso destes estabelecimentos comerciais — não apenas mercadorias estão à disposição do mercado de consumo, mas mercadorias acrescidas do insumo segurança física e patrimonial.

Laércio José Loureiro dos Santos é advogado, sócio do escritório Loureiro dos Santos – Advogados Associados, mestre em direitos difusos pela PUC/SP e professor de Direito Processual Civil na Universidade Paulista (Unip).

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