por Pedro Aparecido de Souza
O procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, entrou no Supremo Tribunal Federal com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 3419), cujo relator é o Ministro Cezar Peluso.
Esse pedido de liminar refere-se à cobrança por quaisquer atos registrados ou lançados em livros notariais e de registro, excluídos os atos do Registro Civil, que são cobrados e depositados para as entidades privadas de Mato Grosso: a) Associação Mato-Grossense do Ministério Público (AMMP); b) Associação Mato-Grossense dos Magistrados (AMAM); c) Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de Mato Grosso (OAB-MT).
Segundo o procurador-geral da República, as custas judiciais são destinadas, segundo a Constituição da República, para custeio de atividades específicas da Justiça e jamais para entidades privadas e além do mais, segundo ele, a Constituição determina que as taxas devem tratar de contraprestação devida ao Estado em função dos serviços públicos efetivamente prestados ao contribuinte ou apenas posto à sua disposição.
A ADI 3419 tem como objeto a Lei Ordinária do Estado de Mato Grosso número 7.550 de 03 de dezembro de 2001, publicada no Diário Oficial do Estado de Mato Grosso no mesmo dia. Esta lei destina, em sua tabela “F” o valor de R$ 1,00, (um real), por quaisquer atos registrados ou lançados em livros notariais e de registro, excluídos os atos do Registro Civil. E mais: segundo a lei, em seu Artigo 1º, § 2º, as tabelas serão reajustadas anualmente, por ato do Corregedor-Geral da Justiça do Estado de Mato Grosso, visando à recomposição dos valores dos emolumentos, em virtude de desvalorização da moeda.
No entanto, essa cobrança não é prevista a partir de 2001. A Lei de 2001 apenas regulamenta o novo valor da cobrança. Na verdade a cobrança é prevista em leis muito mais antigas. Para a Associação Mato-Grossense dos Magistrados (AMAM) a contribuição é prevista desde 1974 (Lei nº 3.605/74); para a Associação Mato-Grossense do Ministério Público (AMMP) a contribuição é prevista desde 1981 (Lei nº 4.348/81) e para a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de Mato Grosso (OAB-MT) a contribuição é prevista desde 1980 (Lei nº 5.607/90).
Que a lei é inconstitucional não há dúvida nenhuma. Palmas para a coragem do Fonteles. Mas além da inconstitucionalidade, o princípio da moralidade, da fraternidade, da igualdade, da solidariedade está sendo vitimado de morte. Além de distribuir dinheiro para entidades privadas, o que é inconstitucional, essas entidades são entidades fortemente estruturadas e não são carentes financeiramente. Pelo contrário, até pelas boas administrações que passaram por essas entidades, hoje, elas estão altamente fortalecidas economicamente.
Ou seja, é uma distribuição de rendas às avessas.
Nenhum cidadão em pleno gozo de boa memória iria aceitar que contribuísse para a Associação dos Pedreiros ou Associação das Domésticas. No entanto, contribui-se para essas entidades que, evidentemente, não necessitam de dinheiro de taxas públicas.
E aqui não vai nenhuma crítica a essas honradas instituições. Não foram elas que fizeram a Lei. São apenas beneficiárias. Quem votou e aprovou tal lei infeliz foram os deputados estaduais e o governador do Estado em 2001 a aprovou.
Ou não conheciam a Constituição da República, ou, então, sabendo da inconstitucionalidade resolveram jogar a Constituição da República no leito do rio.
E essas entidades que são tão sérias e honradas, certamente não irão recorrer da decisão do STF. Cabe ao judiciário estadual e a seus membros decidir pela constitucionalidade das leis. Cabe ao ministério público estadual e a seus membros zelar pela aplicação da lei e portanto da Constituição como fiscal da lei. Cabe à OAB-MT e a seus membros denunciar as inconstitucionalidades. Como essas entidades sempre fizeram isso com zelo e hoje têm o respeito dos cidadãos, não se afastarão, dessa vez, da sociedade.
Mas caso continue a Lei a valer, fica uma boa sugestão. Que os deputados estaduais mudem a Lei e passem a beneficiar com a cobrança, a Associação dos Servidores do Judiciário Estadual de Mato Grosso, a Associação dos Servidores do Ministério Público e a Associação de Funcionários da OAB-MT. Caso não haja nenhuma associação dessas, que seja repassado esse dinheiro para instituições carentes.
Afinal, além do Direito, há que haver Justiça.
Pedro Aparecido de Souza é professor universitário e juiz arbital do TAC de Cuiabá