por Caio Scheunemann Longhi
Em tempos de crescente recessão econômica e escassez de recursos, muitas são as vias pelas quais clubes e associações desportivas em geral têm buscado receitas para suprir suas necessidades econômico-financeiras. Esta é, outrossim, a realidade dos clubes destinados à prática do futebol profissional no Brasil, que vêm enfrentando sérias dificuldades para sua manutenção e pronto adimplemento de suas obrigações ordinárias.
Isto tudo, muito embora o futebol profissional seja o esporte mais fomentado do país e a atual safra de jogadores seja uma das melhores dos últimos tempos, com a participação do país nas últimas três finais de Copa do Mundo. Tal situação, de penúria econômica, foi sobremaneira agravada pela extinção do chamado passe dos jogadores de futebol (modificação legislativa operada pela Lei 9.615/98, a Lei Pelé), o que encerrou uma das maiores fontes de recurso dos clubes brasileiros.
Neste escopo, os clubes brasileiros têm buscado, entre outras fontes de receita, firmar parcerias com investidores profissionais do esporte ou do mercado financeiro em geral, com o fito de prover-se de recursos e, com isso, aumentar a competitividade de suas agremiações e times nos campeonatos em que figuram como participantes.
Pois bem, diante da corrente busca de investidores, é mister façamos alguns apontamentos, principalmente no que tange à vedação da participação concomitante de agentes do mesmo grupo financeiro em associações desportivas distintas e que disputem a mesma competição profissional.
Dispõe expressamente a Lei 9.615/98, com as alterações introduzidas pela Lei 9.981/00:
Art. 27-A. Nenhuma pessoa física ou jurídica que, direta ou indiretamente, seja detentora de parcela do capital com direito a voto ou, de qualquer forma, participe da administração de qualquer entidade de prática desportiva poderá ter participação simultânea no capital social ou na gestão de outra entidade de prática desportiva disputante da mesma competição profissional.
§ 1º É vedado que duas ou mais entidades de prática desportiva disputem a mesma competição profissional das primeiras séries ou divisões das diversas modalidades desportivas quando:
a) uma mesma pessoa física ou jurídica, direta ou indiretamente, através de relação contratual, explore, controle ou administre direitos que integrem seus patrimônios; ou
b) uma mesma pessoa física ou jurídica, direta ou indiretamente, seja detentora de parcela do capital com direito a voto ou, de qualquer forma, participe da administração de mais de uma sociedade ou associação que explore, controle ou administre direitos que integrem os seus patrimônios.
A disposição legal prevê, exaustivamente, a proibição de que um mesmo grupo financeiro participe direta ou indiretamente da administração e/ou de investimentos ligados a clubes distintos que integrem campeonatos e competições das séries principais concomitantemente. Vale salientar, entretanto, que a disposição não é taxativa — ou seja, não há previsão expressa de todas as formas de participação econômica encampadas pela vedação legal —, pelo que podemos concluir que a proibição legal abarca e veda a participação simultânea de todo e qualquer conglomerado econômico em clubes distintos e que disputem a mesma competição profissional.
Neste sentido, com o fito de abarcar a maior série de entidades investidoras possíveis, a legislação específica traz ainda à baila qual seria a aplicação deste dispositivo, consagrando que a asseverada proibição se aplicaria ainda a: (i) cônjuges e parentes das pessoas físicas participantes dos investimentos até o segundo grau, (ii) sociedades controladoras, controladas e coligadas participantes de quaisquer investimentos e (iii) fundos de investimento ou condomínio de investidores revestidos sob qualquer forma.
Se de um lado pode-se pensar que tal disposição legal afugentaria investidores interessados em custear clubes diversos em diferentes mercados relevantes, como já ocorreu com o fundo norte-americano HTMF que firmou parcerias com Corinthians e Cruzeiro e estaria abarcado por tal proibição legal, é mister salientarmos que o objetivo deste dispositivo é dos mais louváveis. Busca-se de todo o modo evitar que seja afetado por meio do interesse de parceiros econômicos o próprio espírito de competitividade inato aos esportes.
A intenção do legislador foi, sem dúvida, a de evitar possíveis combinações de resultados para que se buscasse o maior retorno financeiro naquele momento, em evidente prejuízo da competição esportiva como um todo e até dos demais clubes participantes da competição.
Eventual descumprimento da vedação legal aqui tratada acarreta na inabilitação dos clubes beneficiados na percepção de benefícios fiscais e repasses de recursos públicos federais da administração direta e indireta (artigo 27-A, § 4º combinado com o artigo 18 da Lei 9.615/98), afora as punições esportivas específicas a serem determinadas pelas federações e confederações às quais as entidades forem afiliadas.
Vale salientar, ainda, a proibição específica para que quaisquer empresas detentoras de direitos de radiodifusão de sons e imagens patrocinem ou veiculem suas marcas nos uniformes de competições de equipes profissionais. Tal alteração legislativa foi introduzida na Lei Pelé pela Lei 10.672/03, e visa possibilitar a todo clube ter seus jogos e disputas transmitidas pelas redes de rádio e televisão, sem que isto venha a ser avaliado pela emissora por meio de interesses exclusivamente comerciais, de modo a preservar o interesse público do próprio torcedor e da sociedade em geral.
Estes são alguns dos apontamentos legais que devem ter em vista tanto clubes como os conglomerados financeiros que têm interesse de investir e abarcar lucros por meio do futebol profissional brasileiro, inegável fonte de talentos e de receitas que vêm sendo pouco aproveitadas atualmente.
Revista Consultor Jurídico