Cadin municipal – Prefeito de SP imita governo e prejudica contribuintes

por Raul Haidar

Pelo Decreto 45.882, publicado no Diário Oficial do Município do dia 7 de maio, o prefeito de São Paulo criou o ‘Cadastro Informatizado de Devedores’, onde serão registrados os débitos dos contribuintes e do qual deverá constar também os nomes dos sócios ou administradores das empresas consideradas devedoras de tributos municipais. A Secretaria de Finanças deverá baixar regulamento a respeito.

Tudo indica que estamos diante de uma nova espécie de ‘Cadin’, o famigerado cadastro de inadimplentes criado a nível federal, que tantos transtornos já foram criados aos contribuintes e que a Justiça vem considerando inconstitucional.

De fato, se o contribuinte deve tributo, cabe ao poder público a cobrança, para o que dispõe de uma lei do tempo da ditadura, a lei de execuções fiscais, que já concedeu inúmeros benefícios ao governo.

A criação desses cadastros, em verdade, serve apenas para pressionar de forma injusta o devedor, até para que este pague tributo que poderia questionar legalmente.

O Supremo Tribunal Federal, através da Súmula 547 já decidiu que ‘Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte … exerça suas atividades profissionais.’

Em matéria publicada no jornal Gazeta Mercantil, o professor Ives Gandra da Silva Martins foi categórico ao condenar essa espécie de cadastro, afirmando: ‘O Cadin foi criado em 1941 e, desde 1946, o Supremo vem considerando que esse tipo de pressão é inconstitucional. Sou da opinião de que a União deveria ser a primeira a ser incluída no Cadin, porque é a maior caloteira, seguida pelas estatais e pelos municípios.’

Como é público e notório, o município não paga em dia seus compromissos, nem mesmo aqueles decorrentes de sentenças judiciais transitadas em julgado. Enquadra-se, com precisão, no conceito de ‘caloteiro’, utilizado pelo professor Ives.

O Município vem, há muitos anos, negligenciando na cobrança de sua dívida ativa. Ao que parece, não possui procuradores em quantidade suficiente ou não promove as medidas adequadas e previstas em lei para essa cobrança. Trata-se, pois, de credor incompetente, incapaz ou negligente.

A criação de um ‘Cadastro de Devedores’ é uma bobagem. Se é para uso externo, como o Cadin, vai gerar muitos conflitos na Justiça, não só porque vem criado por um simples decreto, sem base em lei, como principalmente pelo fato de que , se pretender sancionar alguém, a sanção será repelida pela Justiça, como tem ocorrido sistematicamente com o cadastro federal. Trata-se, pois, de algo ilegal e desagradável.

A Prefeitura, afinal de contas, deve saber quem deve, pois existe um sistema de inscrições na dívida ativa que há tempos serve para alimentar os bancos de dados da Secretaria de Finanças e viabilizar as cobranças judiciais. Tal cadastro, aliás, é acessível até pela Internet. Assim, o ‘cadastro’ é inútil. Em síntese, o decreto une o inútil ao desagradável…

Consta que a ‘brilhante idéia’ teria sido do atual Secretário de Finanças, que seria funcionário de carreira do Ministério da Fazenda, onde parece ter se habituado com a estranha mania de se pretender “legislar” sem consulta ao Legislativo, através de portarias, instruções ou coisas desse tipo.

Mas como os auditores da receita são profissionais de alto nível intelectual, muito bem preparados e treinados e o prefeito é pessoa que tem bom senso, além de ser bem assessorado na área jurídica, é razoável supor que tal decreto venha a ser revogado e que tal ‘cadastro’ não seja efetivamente criado. A menos, é claro, que se queira instaurar no Município o caos que reina na Receita Federal…

Revista Consultor Jurídico

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