Do depósito elisivo – da necessidade do depósito integral

Márcio Vicente Faria Cozati

O pedido de falência, realizado com base na impontualidade injustificada (art. 1º da Lei de Falências), cujo rito caracteriza-se pela cognição estrita (art. 11), inexistindo, portanto, dilação probatória, dá ao requerido o peculiar direito de defesa para, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas contados da juntada aos autos do mandado de citação devidamente cumprido, elidir a falência, depositando o valor da obrigação em atraso.
O depósito elisivo pode ser acompanhado da defesa ou feita independentemente de qualquer alegação em juízo. Elidido o pedido de falência com o depósito, a ação se converte, necessariamente, em cobrança individual, uma vez que a instauração do concurso universal está afastada. O depósito tão somente da quantia requerida na inicial, sem qualquer correção, juros ou honorários advocatícios não deve ser aceito, s.m.e., como suficiente para a elisão do pedido falimentar, não tendo, pois, o condão de elidir a falência e, via de conseqüência, extinguir o processo falimentar. O Superior Tribunal de Justiça elaborou a Súmula nº 29, consolidando o entendimento de que, “no pagamento em juízo, para elidir falência, são devidos correção monetária, juros e honorários de advogados”.
Portanto, somente com o pagamento satisfativo da totalidade do débito, vale dizer, do principal e das verbas acrescidas, é dado ao Juiz declarar elidido o pedido falimentar, julgando extinto o processo.
Nossos Tribunais, asseveram que a correção monetária nada acrescenta ao valor do crédito, tendo somente o condão de repor parcialmente os valores perdidos em razão da desvalorização da moeda. Neste sentido: “Pretendendo o comerciante efetuar depósito, tendente a impedir a decretação da falência, este deve compreender a correção monetária do débito” (3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, 12.03.91, no recurso especial nº 6.989-SP, referido pela própria Súmula 29 – Revista do STJ nº 33/238); E ainda: “À evidência que não se pode admitir efeitos elisivos a mero depósito singelo da importância devida quando entre o vencimento e a oferta ocorreu lapso temporal marcado pela inflação. Para que se admita elidido o pedido há que ser ofertado o valor e este não se confunde com o nominal” (1ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, agravo de instrumento nº 134.990-1, 12.06.90).
Entendemos, pois, avalizados pela Súmula nº 29 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, que não basta o simples depósito do valor principal inicialmente cobrado, devendo tal depósito compreender, também, as parcelas devidas de “correção monetária, juros e honorários de advogado”.
Portanto, para elidir-se o pedido de decretação de falência, seria necessário o “depósito satisfativo” da dívida, compreendendo desde logo todas as parcelas que integram a obrigação do demandado, principal e acessória. Como proclamou a 4ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo: “A jurisprudência, sensível ao fenômeno da erosão da moeda, encaminhou-se no sentido de que, depósito singelo não é suficiente para elidir o pedido de quebra, sob pena de estimular a indústria da dívida. O devedor sente que é bom investimento não pagar a dívida descumprindo sua obrigação. Aguarda venha o credor a requerer sua falência para, só então, depositar o valor do débito vencido há muito tempo, livrando-se dos inconvenientes da correção monetária” (Apelação Cível nº 200.064-1, 25.11.93.)
Malgrado o acima exposto, um segundo entendimento, contrário ao nosso, prevalece. Há nobres vozes que consideram elidida a falência pelo depósito do valor histórico da dívida, vale dizer, o valor principal, requerido na inicial do pedido de falência. Os demais valores acessórios (correção monetária, juros, honorários advocatícios, custas e despesas processuais, etc.) são consideradas dívidas de valor, reconhecidas na sentença que extingue o processo em razão da elisão. Neste caso, deverá o então requerente da falência, promover, no juízo competente, a cobrança das verbas complementares, através do procedimento comum, é dizer, execução por quantia certa, consoante o que dispõe o Código de Processo Civil. Nesta seara, há, ainda, quem tenha uma terceira opinião, que considera como condição primordial para prevenir o juízo de falência, o depósito imediato da importância principal devida, porém monetariamente atualizada, de maneira que deverá ser cobrada judicialmente através de execução por quantia certa apenas a demais parcelas complementares, vale dizer, juros, despesas processuais e honorários de advogado.
De todo exposto, devemos concluir que há, na atual doutrina e jurisprudência, três posições quanto à eficácia do depósito elisivo. A primeira, e a que nos parece mais acertada, entende que o depósito, com a finalidade de elidir a falência, deverá ser integral, vale dizer, o valor principal acrescido de correção monetária, juros, honorários advocatícios e despesas processuais. A segunda posição, que até agora prevalece, entende que somente o pagamento do principal elide a falência, devendo ser, os demais valores, cobrados na forma de execução por quantia certa. A terceira posição entende que o pagamento do principal elide a falência, desde que devidamente atualizado, devendo os demais valores, tais como juros, despesas processuais e honorários advocatícios, serem cobrados na forma de execução por quantia certa.

MÁRCIO COZATTI – OAB/SP 121.829 – Advogado em Jundiaí/SP. Ex-Procurador Judicial do Município de Várzea Paulista/SP. Pós-graduado “lato senso” em Direito Empresarial pela Escola Superior de Advocacia – OAB/SP. E-mail: marcio.cozatti@aasp.org.br / nacoz@zaz.com.br

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