Justiça: uma questão de sorte

Douglas Mondo

Toda pessoa física ou jurídica ao procurar o Estado através do Poder Judiciário para dirimir um conflito de interesses, busca uma satisfação jurisdicional baseada na legalidade e na justiça.

De acordo com nosso ordenamento jurídico, qualquer decisão judicial sempre deve estar em consonância com a lei, com a jurisprudência e em não as havendo, com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito, dentro dos limites do pedido formulado pela parte.

O artigo 5º do Decreto-Lei nº 4.657 de 4 de setembro de 1942, chamado “Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro” estipulou que na aplicação da lei (justiça) o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

Isso quer dizer na prática que os juízes são livres para decidirem, dentro da amplitude dos limites legais, de acordo com as necessidades dinâmicas da sociedade e não estão atrelados a nenhuma vinculação jurisprudencial.

Tudo isso é muito bonito, mas jamais passa pela cabeça de qualquer pessoa que ao buscar a satisfação de sua pretensão junto ao Poder Judiciário estará amparado – na maioria das vezes – apenas na velha e surrada sorte.

Não é raro em cidades onde haja mais de uma vara cível ou trabalhista, para casos semelhantes, para não dizer idênticos, haverem decisões diferentes e conflitantes entre si.

Não é raro também, câmaras de tribunais regionais emanarem decisões conflitantes para casos iguais ou semelhantes.

Para dirimir o dissídio jurisprudencial havido, pode-se recorrer ao Superior Tribunal de Justiça que acabará satisfazendo aquela pretensão jurisdicional e finalmente a verdadeira justiça estará sendo aplicada.

Para percorrer todo esse caminho nos meandros do Poder Judiciário e finalmente a pessoa física ou jurídica ver restabelecida a pretendida justiça, no mínimo terá gastado uma pequena fortuna e perdido alguns anos de sua preciosa vida.

Ao final – com toda certeza – acabará sentindo na garganta aquele velho gosto de injustiça e na maioria das vezes seu advogado “pagará o pato”, pois “advogado bom é aquele que resolve logo a questão”.

Não é raro ainda, numa mesma questão judicial, num mesmo processo, termos duas decisões emanadas de segunda instância e conflitantes entre si.

Por exemplo, num agravo de instrumento interposto numa carta de sentença que reconhece uma citação havida e numa apelação nos autos principais que não reconhece a mesma citação.

Em caso atual, decisões de primeira e segunda instância que reconhecem a superveniência do término das bandas cambiais, ocorrido em 1999, havendo a necessidade de um novo indexador para os contratos de arrendamento de bens móveis em consonância com o Código de Defesa do Consumidor.

E as decisões em contrário na manutenção das regras contratuais, como “lei entre as partes”.

Alguns juristas defendem a súmula vinculante como saída para tais casos e ao encontro da celeridade processual, já que obrigaria juízes a decidirem de acordo com jurisprudência determinante.

Por outro lado, isso engessaria o Poder Judiciário no acompanhamento da própria dinâmica da sociedade, já que demoraria muito tempo até que houvessem mudanças nas referidas súmulas e as pessoas não teriam uma justiça rápida e prática no atendimento de suas necessidades jurisdicionais.

De qualquer forma, na prática temos hoje uma justiça morosa, cara e não satisfatória aos anseios de uma sociedade que exige cada vez mais rapidez e identidade entre a verdade formal e a material.

Na prática também, todo advogado militante sabe que seu papel vai além de patrocinar a causa de seu cliente e que – na maioria das vezes – se vê fazendo o papel de “aplicador da justiça”, que cabe unicamente ao Estado, cada vez mais distante de seu verdadeiro papel constitucional.

Dentre a inúmeras reformas que o país necessita, a do Poder Judiciário talvez seja a mais importante, já que o descrédito que o cidadão comum adquiriu quanto à aplicação da justiça acabou por difundir uma cultura de impunidade e de verdadeira injustiça social.

E isso para uma instabilidade jurídica e política é como um mero despacho interlocutório perdido entre “diga a parte contrária um simples carimbo de cartório” mas ao final sempre vem o … cumpra-se.

DOUGLAS MONDO é advogado civilista e empresarial. Fundador, ex-presidente e atual vice-presidente do Conselho de Segurança de Jundiaí, SP; Acadêmico fundador e presidente da Academia Jundiaiense de Letras Jurídicas e palestrante jurídico.

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