Autor: Dr. Marcus Vinícius Guimarães de Souza*
INTRODUÇÃO
O termo liminar, no âmbito da ciência do direito, constitui-se em expressão complexa e controvertida que inúmeras vezes é usado tecnicamente de maneira equivocada.
Consiste em uma designação genérica que traduz os mais diversos institutos jurídicos processuais de maneira simplificada, como nas hipóteses vertentes do despacho liminar positivo, da apreciação liminar do juiz etc.
Entretanto, com o decorrer dos últimos anos, um especial significado ganhou suma importância em nosso ordenamento jurídico. Trata-se da liminar como forma efetiva de revestimento instrumental de providências cautelares em ações de conhecimento, cujo objeto próprio e particular fez com que os nossos legisladores procurassem prover de forma especifica a sua viabilidade, garantindo a plena efetividade do pronunciamento jurisdicional de caráter cognitivo.
Considerando que a expressão providências cautelares possui uma abrangência generalizante, torna-se necessário, então, distingui-las dos demais institutos cautelares, quais sejam: a própria expressão providência cautelar, a medida liminar e a medida cautelar, a fim de que se possa analisar e absorver o significado específico que alude a cada um desses institutos.
Nesse sentido é que se apresenta tal trabalho, o qual procura delinear a distinção entre aqueles institutos pertencentes à disciplina cautelar, buscando conceituar o termo medidas liminares, identificando o seu objeto e a sua natureza jurídica, analisando, também, quais os requisitos específicos para a sua concessão, e, por fim, quais os recursos, cabíveis contra a mesma, no caso de deferimento ou indeferimento de tal medida liminar.
1) CONCEITO DE MEDIDA LIMINAR
Para a doutrina mais abalizada, a medida liminar constitui-se num autêntico provimento judicial, de natureza complexa e binária do tipo administrativo-cautelar. É efetiva provisão judicial obrigatória se comprovado estiver que os efeitos imediatos do ato impugnado ou da omissão, caracterizadora de outra lesão de direito liquido e certo ou equivalente, ameaçam frustrar os objetivos da própria ação que expressamente a admite ou naquelas em que tal admissão à considerada como forma de antecipação in limine por intermédio da ação instrumental cautelar, nos casos de ações principais que não possuem tal previsão de maneira expressa.
Assim, a sua finalidade é de impedir a consecução do ato, ou de seus efeitos, ou afastar a omissão consoante a tradução da natureza da ilegalidade, do abuso de poder, da lesão ao patrimônio publico etc.
Essa provisão judicial possui caráter emergencial, traduzindo-se em solução acauteladora de um possível direito agravado no instante do ajuizamento da respectiva ação, ou ameaçado com esse agravo, o que em ambos os casos poderá impor prejuízo irrecuperável se não for assegurado de imediato, tornando inócua a concessão da segurança desejada, a efetiva repressão a danos ao meio ambiente, lesões ao patrimônio público ou a qualquer outro tipo de tutela vindicada, demonstrando-se, por efeito tardio qualquer provimento judicial meritório, tendente ao reconhecimento de direito já impossível de ser exercido, quer parcial ou totalmente.
As razões acima expostas vieram a contribuir de forma decisiva para a criação de tal provimento judicial por parte de nossos legisladores.
Faz-se necessário ressaltar que o próprio vocábulo liminar traduz essa idéia de antecedente em relação ao assunto ou objeto principal. Portanto, a medida liminar deve ser tomada sempre com o inafastável e exclusivo intuito de garantir a inteireza da sentença.
2) DISTINÇÃO ENTRE OS TERMOS: MEDIDA LIMINAR, PROVIDÊNCIA CAUTELAR E MEDIDA. CAUTELAR
Mister torna-se, ainda, salientar que embora os termos medida liminar, providência cautelar e medida cautelar pertençam ao mesmo instituto, possuem significados específicos, distinguindo-se um dos outros. A medida liminar vem a ser uma forma de exteriorização de determinada providência cautelar, consistindo no continente envoltório. Já a providência cautelar é o conteúdo generalizante, que traduz em seu bojo um conteúdo específico, o qual seja: a medida cautelar, sendo esta nominada ou inominada. Logo.
A providência cautelar vem a ser o todo, que possui um pedido especifico, que é a medida cautelar; sendo que ambas de forma geral ou particular, respectivamente, formalizam-se através da medida liminar.
Para que a medida liminar seja deferida, é preciso que ela contenha, além dos pressupostos tradicionais, pelo menos 2 (dois) os requisitos genéricos: a relevância dos motivos em que se assenta o pedido da inicial e a possibilidade da ocorrência de lesão irreparável do direito do autor, se vier a ser reconhecido na decisão de mérito.
Portanto, não há um vínculo entre os motivos do ajuizamento da ação de conhecimento e os do pedido de liminar.
3) OBJETO DA MEDIDA LIMINAR
Em face de tal inexistência, verifica-se que o objeto da medida liminar não é o mesmo da ação meritória originariamente ajuizada.
Aquela possui exclusiva referembilidade processual; enquanto essa versa sobre o direito material controvertido. Enquanto o objeto do mandado de segurança é o ato coator ilegal ou abusivo, que constranja, lese ou ameace o direito do impetrante; a medida liminar leva em consideração o eventual risco de qualquer inviabilidade executiva da decisão terminativa de caráter meritório. Traduzindo-se como uma garantia para que haja, realmente, a produção dos efeitos devidos na solução final do pedido meritório.
Constitui-se, portanto, de extrema necessidade delinear as diferenças entre os objetivos das diversas ações que prevêem a medida liminar, incluindo-se neste rol aquelas ações principais que se instrumentam por ações cautelares preparatórias ou incidentais, em relação à própria medida liminar, embora esses objetivos estejam de uma certa maneira inferida no objetivo desta.
4) OBJETIVOS DA MEDIDA LIMINAR
Os objetivos da medida liminar podem ser considerados de forma particular e o outro como final ou último. O objetivo particular consiste em acautelar um direito que pode ou não ser reconhecido ao final da sentença, não se tratando de uma antecipação da decisão meritória; embora haja interpretações que vinculam de maneira errônea os objetivos das ações com os da medida liminar, e consideram desnecessária a suspensão ou a ratificação da medida nos casos de julgamento preliminar no sentido de improcedência do pedido, ou julgamento pela procedência do mesmo, respectivamente, o que não coaduz com as verdadeiras características fundamentais dessa medida.
Se existisse tal vínculo, a medida liminar deixaria de ter a forma instrumental que tem; e passaria a versar sobre o mérito, fazendo com que o magistrado deixasse de observar um dos princípios norteadores do Direito: o do contraditório.
E tal inobservância é inadmissível no atual estágio de evolução de nossa ciência jurídica. Por isso, há a necessidade de se suspender expressamente a liminar eventualmente deferida, se julgado improcedente o pedido meritório; sem o que se deve entender que continua a medida a produzir seus efeitos até que transite em julgado a sentença, operando-se o seu conseqüente efeito preclusivo. Isto porque, sendo outros os motivos de sua concessão, a decisão que apenas não reconhece o direito vindicado na ação própria não implica, tacitamente, em considerar a desnecessidade de tal medida até o transcurso do prazo recursal.
A regra é mantê-la até a decisão final, se a lesão continua sendo iminente, potencialmente destruidora do direito que ainda poderá ser reconhecido. Daí o seu objetivo final, o qual seja de garantir a inteireza do decisum e de sua conseqüente executabilidade plena.
5) NATUREZA JURÍDICA DA MEDIDA LIMINAR
Consoante o mestre italiano Calamandrei, a natureza jurídica da medida liminar se encontra exatamente na medida cautelar como provimento provisório judicial, que antecipa a decisão da lide, ainda que carente de ratificação ou revogação subseqüente dada pela sentença de mérito.
Entretanto, alguns doutrinadores, entre os quais Liebman e Chiovenda, rechaçam qualquer possibilidade de que a medida cautelar nossa a vir a antecipar a decisão da lide.
A medida liminar, na qualidade instrumental formalizante de providências cautelares, alude sempre a uma jurisdição impropriamente considerada, com referembilidade exclusivamente processual, desprovido de qualquer intenção de satisfatividade do direito reclamado.
Tendo por sentido único e específico o de prover o efetivo acautelamento ao processo em que se discuti a lide, sem tecer considerações sobre o tema, e ao conseqüente direito material controvertido que a envolve. Sendo, portanto, imprescindível que a tutela não satisfaça a pretensão própria do processo principal para não se esvair de sua índole acautelatória.
A medida liminar, conforme quase que unanimidade dos doutrinadores, possui natureza jurídica cautelar, havendo divergência não quanto esta, mas sim quanto o caráter antecipador ou não do pedido de mérito, questão esta já suscitada e abordada anteriormente.
Todavia, é necessário analisar, ainda, se essa decorre de um poder discricionário do juiz quanto da apreciação dos pressupostos para a sua concessão. E, neste sentido, a opinião prevalente da doutrina contemporânea é a de que a medida liminar é uma facultas do magistrado que deve ser fundada nos critérios de oportunidade e conveniência do Estado-juiz em garantir a própria efetividade da decisão final. Mas, essa faculdade não deve ser confundida com liberalidade do juiz, a qual pressupõe generosidade ou prodigalidade incompatíveis com tal função.
A partir dessa óptica, infere-se que a medida liminar é de natureza jurídica administrativo-cautelar. Natureza jurídica administrativa, devido ao seu caráter discricionário, sendo apreciada com a prudente valoração em torno da oportunidade e conveniência da concessão, que para tal deve-se avaliar se nela estão contidos todos os pressupostos e requisitos para tal concessão.
E natureza cautelar, porque objetiva garantir a efetividade da sentença, sem almejar tocar no seio do conflito, ainda que como antecipação provisória do que decidirá o juiz, a posteriori, quando analisar o mérito da causa.
6) REQUISITOS ESPECÍFICOS PARA A CONCESSÃO DA MEDIDA LIMINAR
A concessão de liminar é medida de absoluta excepcionalidade, quer seja em mandado de segurança como na qualidade de antecipação da tutela cautelar. Tornando-se nítida a sua vinculação à efetiva presença de todos os pressupostos indispensáveis, quais sejam: o periculum in mora, o fumus boni iuris, a relevância dos motivos alegados, a não produção do denominado periculum in mora inverso que abrange também a chamada grave lesão à ordem púbica, além do requisito especifica para a concessão de antecipação cautelares em forma de liminar prevista no artigo 804 do CPC; sem os quais jamais pode ser deferida tal concessão, em virtude do princípio da legalidade e a que deve se a ter o magistrado no exercício da função jurisdicional.
6.1) O PERICULUM IN MORA
O periculum in mora se constitui no primeiro e mais importante dos requisitos indispensáveis para a concessão de medidas liminares em mandado de segurança ou como antecipação de cautela, no caso de à medida cautelar em ação com idêntica designação.
Em matéria tributária é a condição necessária, mas não suficiente, para o eventual deferimento da medida liminar vindicada ou mesmo para a sua concessão ex officio.
Fundamenta-se no receio da existência de um dano jurídico, referindo-se ao interesse processual presente na busca permanente da obtenção de uma real garantia quanto à própria efetividade da solução final a ser ditada pelo Poder Judiciário.
Deve-se, pois, ser aferido através do juízo próprio de probabilidade, com comprovada plausibilidade de existência de dano, justificado receio de lesão de direito e/ou existência de direito ameaçado e nunca no genérico juízo de possibilidade. Esse receio deve ser objetivamente fundado, calculado, de forma a mais precisa possível, pelo exame das causas já expostas em existência, capazes de realizar ou operar o efeito indesejado que deve ser, por conseqüência, afastado.
A comprovação de seu fundamento deve permitir, no mínimo, a plausibilidade, sem o que o juízo restritivo de probabilidade acabaria se transformando em juízo de possibilidade.
A avaliação da plausibilidade deve ser feita pelo juiz, segundo as regras do livre convencimento, sem, contudo dispensar a fundamentação ou motivação de tal convencimento.
Logo, a sua decisão não deve ser baseada em critérios subjetivos, mas sim objetivos, em relação aos fatos provados, dos quais resulte tal plausibilidade.
Ainda, vale ressaltar que o risco de dano deve corresponder a fatos que venham a desequilibrar efetivamente uma situação preestabelecida entre as partes, de modo que o perigo preexistente ou coexistente com o nascimento da pretensão, realmente justifique a tutela cautelar em forma de medida liminar.
Em suma, o periculum in mora vem a ser o receio, objetivamente fundado, quanto à existência de efetivo dano jurídico, de difícil ou impossível reparação, durante o curso da ação que instrumentaliza o pedido meritório.
6.2) O FUMUS BONI IURIS
O fumus boni iuris consiste num juízo de especifico de exame de probabilidade de deferimento futuro da pretensão meritória que associa o mérito de conteúdo cognitivo ao mérito cautelar, destacando-se por isso.
Juntamente com o periculum in mora, constitui o próprio e especifico conteúdo meritório da providência cautelar, e em especial da ação cautelar, não podendo ser entendido, em nenhuma hipótese, apenas como simples condição especifica da ação instrumental autônoma cautelar ou de seu substrato liminar, salvo quando o juízo valorativo se dirige única e exclusivamente para os requisitos de concessão e não para o seu conteúdo.
A grande maioria dos doutrinadores entende que a relevância do fundamento do pedido se encontra adstrita ao requisito do fumus boni iuris, outros defendem a existência concomitante do mesmo, tanto no primeiro requisito específico para a concessão de liminar, que vem a ser o periculum in mora, quanto no segundo requisito, o fumus boni iuris.
Entretanto, para Reis Friede, a relevância do fundamento do pedido representa um requisito autônomo, perfazendo a Segunda fase do juízo próprio de admissibilidade da medida liminar em conjunto com a não produção do periculum in mora inverso. Já que a primeira fase é formada pelos dois primeiros requisitos supramencionados.
As leis anteriores de 1936 e de 1939 já traziam em seu bojo a relevância do fundamento do pedido e a irreparabilidade futura do eventual dano, como requisitos para a concessão de liminar. A lei nº 1533/51 em seu artigo 70, inciso II, absorveu, também, tais requisitos.
A inovação trazida pela nova lei foi quanto da concessão ex officio, que até então era ponto controvertido entre alguns doutrinadores.
Uns negavam tal possibilidade de concessão, pois entendiam que a liminar deveria, obrigatoriamente, fazer parte do pedido na petição; e outros a admitiam, negando tal exigência. Com o advento da lei nº 1533/51, essa dúvida foi dirimida entendo-se que para a sua concessão não é necessário que ela seja objeto do pedido, em virtude dela decorrer da própria natureza do ato a ser desfeito, cabendo ao próprio magistrado valorizar o fundamento do pedido, dispensando a anterior necessidade de provocação pelo impetrante no mandamus. Logo, o fundamento relevante é facultas do magistrado, através de sua competência discricionária, permitindo a livre apreciação da existência do requisito, ora em questão, a fim de que junto com os demais requisitos, inerente as medidas cautelares e as providências cautelares como um todo, deferir a concessão se convencido que nela estão contidos todos os requisitos indispensáveis para o mesmo ou na falta de um daqueles requisitos indeferi-las.
6.3) O PERICULUM IN MORA INVERSO
O periculum in mora inverso consiste, exatamente, no afastamento da eventual concretização de grave risco de ocorrência de dano irreparável ou de difícil reparação, contra o réu como conseqüência direta da própria concessão da medida liminar eventualmente deferida ao autor.
A não produção do periculum in mora inverso deve ser um pressuposto inafastável para a decisão final pela concessão da medida liminar, uma vez que em nenhuma hipótese é lícito salvaguardar o interesse de uma parte em detrimento a outra.
6.3.1) O PERICULUM IN MORA INVERSO E 0 RISCO DE GRAVE LESÃO A ORDEM PÚBLICA
O periculum in mora inverso abrange em sua plenitude, o chamado risco de grave lesão à ordem pública, sem, contudo, esgotar o instituto; pois a concessão da liminar, em alguns casos, pode inverter o risco jurídico e atingir o particular.
Esse requisito possui uma dimensão muito mais ampla que transcende ao simples requisito expresso em lei, em virtude da especificidade de cada disposição normativa que as qualifica como espécie do gênero maior.
6.3.2) O PERICULUM IN MORA INVERSO E A CAUÇÃO OU CONTRACAUTELA
A lei prevê indenização, no caso de eventuais prejuízos provocados pelo deferimento da providência cautelar, desde que esta tenha sido promovida de forma maliciosa ou por erro grosseiro pela parte vindicante.
Porém, nem sempre, tal indenização alcança a própria irreparabilidade dos danos impostos ao réu pela própria efetivação da medida. Há casos, ainda, em que eventuais prejuízos não são indenizáveis por ausência dos requisitos para tanto; e nem mesmo a caução em garantia ou contra cautela pode ser indicada como efetiva solução ao problema.
Faz-se, então, necessário uma rigorosa observância do requisito da não produção do periculum in mora inverso, a fim de que a concessão da liminar não venha a causar danos irreparáveis ao réu ou a terceiros. Não obstante, haver situações em que a caução ou contracautela exigida pelo julgador se torna eficaz para resguardar o equilíbrio entre as partes.
Vale ressaltar que não existe uma regra geral que vincule o deferimento da medida liminar à apresentação de uma garantia ou que a produção de uma contracautela obrigue ao magistrado a concessão da mesma.
No entanto, há uma parcela minoritária da doutrina e da jurisprudência que sustentem tal vinculação.
6.4) REQUISITO ESPECIAL CONSUBSTANCIADO NO ART. 804
DO CPC
Para concessão de medida liminar como antecipação de tutela na ação cautelar, além dos requisitos inerentes a toda e qualquer medida, ora já mencionados, deve-se ainda ser constatada a indispensável observância do pressuposto especial expresso no artigo 804 do CPC, que assim prescreve: “E licito ao juiz conceder liminarmente (…) a medida cautelar, sem ouvir o réu, quando verificar que este, sendo citado, poderá torná-la ineficaz (…)”.
Deve-se, pois, comprovar que a antecipação da medida cautelar, em forma de liminar é absolutamente indispensável, em face do risco plausível de que a concessão normal da medida cautelar, posterior a contestação, sem a antecipação in limine, será ineficaz, esvaziando seu conteúdo e por conseqüência, o seu próprio objetivo.
Logo, somente é admissível tal antecipação, quando da regular citação puder a mesma se tornar ineficaz.
A doutrina majoritária entende que se concedida tal medida antecipadora em decisão originária; e não tiver sido observado o disposto no artigo supracitado, a mesma poderá, Independente dos demais requisitos presentes, ser impugnada ou mesmo poderá ser cassada através de recurso administrativo.
Portanto, se não havia possibilidade da medida cautelar se tornar ineficaz, com a citação, e mesmo assim, foi deferida a sua antecipação liminarmente, esta poderá ser cassada por mandado de segurança em virtude de da violação ao artigo 804 do CPC.
Não obstante, uma pequena parcela de a jurisprudência admitir à possibilidade do deferimento da antecipação cautelar in limine, especialmente quando a tutela cautelar é requerida mediante a efetivação da caução em garantia ou contracautela.
Em suma, para a concessão de liminar é necessário que se encontrem presentes os requisitos autorizadores da mesma, quais seja in: o periculum in mora, o fumus boni iuris, a relevância do fundamento do pedido, o periculum in mora inverso e o pressuposto especial previsto no artigo 804 do CPC; os quais vinculam o magistrado e diminuem o grau de liberdade deste ao decidir discricionariamente. Quando deferida a liminar, ela se constitui em decisão interlocutória, devendo der fundamentada, afastando a idéia negativa que se tem sobre a facultas discricionária do magistrado, a qual jamais pode ser entendida como sinônimo de liberalidade, pois se assim fosse, haveria uma incompatibilidade do magistrado com a função exercida pelo mesmo, o que afetaria as estruturas do nosso ordenamento jurídico.
7) RECURSOS ADMISSÍVEIS EM MATÉRIA CAUTELAR
Feita a explanação sobre o conceito, objeto e natureza jurídica das medidas liminares. Delineados os contornos sobre a divergência dos termos providência cautelar, medida liminar e medida cautelar. E, analisados os requisitos específicos para a concessão de medidas liminares e providências cautelares.
Resta, ainda, verificar quais os recursos cabíveis em matéria de cautelar, consoante a doutrina e a jurisprudência, levantando os pontos pacíficos e, imprescindivelmente, conflitantes a respeito desse instrumento de direito instrumental.
7.1) CONCEITO DE RECURSO PARA A DOUTRINA
Inicialmente, vale ressaltar que a expressão recurso apresenta diversos conceitos, dentre os quais podem ser destacados: o de Câmara Leal, citado por Vitorino Prata Castelo em sua obra Prática Penal da Segunda Instância, que assim o conceitua:
“É o meio processual de provocar, nos casos expressamente previstos em lei, a reforma, pelo próprio prolator, ou pela instância superior, de uma decisão final ou interlocutória”.
Já, para Morais de Carvalho, Ramalho e Melo Freire citado por João Claudino de Oliveira Cruz em sua obra Dos Recursos no Código de Processo Civil, a definição de recurso vem a ser, respectivamente:
“Recursos são os meios de direito tendentes à reforma da sentença”.
“Recurso é o meio de direito que tem por fim a reforma da sentença”.
“Recurso é a legítima provocação que para o juiz superior faz a parte agravada por fato do juiz inferior”.
Para João Monteiro, citado por Borges da Rosa in Comentários ao Código de Processo Civil, recurso é “a provocação a novo exame dos autos, para emenda ou modificação da primeira sentença”.
E, para Afonso Fraga, citado pelo mesmo autor, o termo recurso possui uma inerente complexibilidade, apresentando, pelo menos 3(três) acepções básicas: a primeira em latíssimo Celso sendo todo o meio legitimo de que a parte se serve para defesa de seus direitos, como a contestação, as exceções, as razões etc; a segunda em lato Celso, como todo o meio empregado em juízo pela parte vencida para obter a reforma, in totum, ou em parte, da sentença de primeira instância; e, a terceira em stricto sensu, sendo esses mesmos meios quando interpostos da primeira para a segunda instância.
7.2) RECURSO: CONCEITO AMPLO
Assim, com base nos diversos conceitos acima expostos, conceitua-se recurso como o meio ou instrumento de provocar o reexame de decisões, proferidas pelo julgador originário (de primeira, segunda ou instância especial e extraordinária) atendidos determinados requisitos previstos na norma jurídica, como legitimidade do recorrente, interesse do recurso, sucumbência da parte etc.
Embora, haja opiniões como as do professor Bento de Faria, Melo freire e Souza Pinto que, em termos gerais, entendem que recurso é o instrumento hábil para provocar reexame da decisão, proferido pelo julgador originário, simplesmente por julgador diverso e de instância superior.
Data vênia, não parece procedente tal assertiva, haja vista existirem decisões impugnadas através de recursos que podem ser reexaminadas pelo próprio julgador ou equivalente de mesma hierarquia, embora, em regra, os recursos sejam apreciados por outro julgador de instância superior.
7.3) NATUREZA JURÍDICA: CORRENTES
Após, a conceituação do instituto em análise, torna-se necessário verificar qual a sua natureza jurídica, havendo duas correntes que tentam explicar tal natureza. A primeira sustenta a tese de que constitui o recurso em uma efetiva ação distinta e autônoma em relação aquela que se vinha exercitando no processo, possuindo, natureza constitutiva, pois visa em termos gerais, a remoção de um procedimento.
E para sustentar tal tese, os seus defensores, de forma geral, argumentam que o recurso, não obstante originar-se de fatos verificados dentro do processo a decisão recorrida, equivale a sua essência, ao próprio fundamento do fato extraprocessual que dá origem a ação primitiva.
E, ainda, argumentam que, em determinadas ocasiões, a circunstância fática de que as pessoas legitimadas para a interposição do recurso não correspondem às mesmas que detinham a legitimação originária para a causa, como no caso específico do terceiro interessado e do próprio Ministério Público, detentores de legitimação expressamente prevista na lei processual em vigor.
Em contra partida, a segunda corrente, formada pela maioria dos doutrinadores, consoante o profº Barbosa Moreira, conceituam o poder de recorrer como simples aspecto, elemento ou modalidade próprio direito de ação exercido no processo, confrontando-se com o argumento central da primeira corrente, o qual era a existência do chamado fato originário, que por si só, tornaria autônomo o recurso, como ação distinta em relação à principal. Portanto, para essa segunda corrente, os recursos teriam natureza jurídica não constitutiva.
Fazem parte dessa corrente, entre outros autores, Barbosa Moreira, Ugo Rocco, Zanzucchi, Carnelutti. E, com fundamento em tal corrente doutrinária, conclui-se pela natureza jurídica do recurso como ato jurídico, stricto sensu, de caráter postulatório, pelo qual o seu respectivo titular exerce apenas uma modalidade do direito de ação.
7.4) O RECURSO E 0 DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO
O recurso e o duplo grau de jurisdição são expressões praticamente complementares que guardam, em suas respectivas traduções, necessariamente um nítido grau de interdependência e, por conseqüência, obrigam a uma compreensão complementar, por parte do intérprete, que transcendi a simples análise isolada de ambos os termos, impondo, por efeito, uma reflexão sistemática.
Pela sua própria natureza entisica, complexa, e controversa; o princípio do duplo grau de jurisdição exige uma perfeita compreensão, a fim de que se possa demonstrar, com clareza, as suas mais diferentes possibilidades de interpretação, quer de forma isolada ou sistemática.
Para isso, torna-se necessário à distinção entre os dois alcance básico da expressão duplo grau de jurisdição. O primeiro, em lato sensu, é o gênero; e o segundo, em strictu sensu, é a espécie. Logo, aquele abrangeria três possibilidades básicas de reapreciação da matéria: o Princípio do Duplo Exame; Princípio do Duplo Grau Propriamente dita; e o Princípio da Dupla Instância.
7.5) O PRINCIPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO
O Princípio do duplo exame não deve ser confundido com o princípio do duplo grau de jurisdição stricto sensu, embora haja algumas características semelhantes entre os mesmos, como: a reapreciação prévia da matéria impugnada pelo mesmo órgão que proferiu a decisão recorrida.
Entretanto, no princípio do duplo exame há apenas a efetiva possibilidade de retratação do julgador primitivo, sem a qual o recurso interposto, necessariamente, é apreciado por órgão diverso e hierarquicamente superior. Esse é o caso, por exemplo, do agravo de instrumento.
No princípio do duplo grau de jurisdição stricto sensu encontram-se presentes algumas diferenças deste em relação aquele, como: a efetiva presença do efeito devolutivo do recurso, a impossibilidade absoluta de apreciação da matéria impugnada pela instância superior; e a não retroatividade dos recursos sujeitos a esta espécie.
Assim, as principais características fundamentais do princípio do duplo grau de jurisdição stricto sensu são:
1- O reexame da matéria impugnada, em 2º segundo grau de jurisdição, pelo órgão julgador primitivo;
2- O efetivo e excepcional funcionamento do 2º (segundo grau) de jurisdição na 1ª(primeira) instância, ou na originária;
3- O caráter último da nova decisão a ser proferida, que substituirá a primeira, encerrando em caráter definitivo, o litígio estabelecido entre as partes;
4- A existência efetiva do efeito devolutivo nos seus instrumentos
Recursais próprios.
7.6) O PRINCÍPIO DA DUPLA INSTANCIA
E, por fim, o último princípio componente do princípio do duplo grau de jurisdição lato sensu que é o princípio da dupla instância. Este é o mais representativo de todos os princípios que compõem aquele.
E, por esta razão, alguns autores sustentam a tese segundo a qual o princípio da dupla instância se confunde com o próprio princípio do duplo grau de jurisdição, admitindo a perfeita identidade entre os dois princípios e, por via de conseqüência, a própria inexistência dos demais princípios componentes do duplo grau, anteriormente analisados.
Embora, haja opiniões contrárias a tal tese; em virtude desta reduzir de forma simplista a identidade entre os princípios. Dentre as principais características do princípio da dupla instância destacam-se:
1- O reexame da matéria impugnada, em 2º (segundo grau) de jurisdição pelo órgão de 2º (segunda) instância;
2- O funcionamento-regra do grau de jurisdição na 2º (instância);
3- O caráter último da nova decisão a ser proferida que substituirá a primeira, encerrando, em caráter definitivo, o litígio estabelecido entre as partes;
4- A existência efetiva do efeito devolutivo nos seus instrumentos recursais próprios.
Feita essa análise, indispensável, sobre o conceito e a natureza jurídica do termo recurso, torna-se mister, agora, verificar quais os recursos cabíveis em matéria cautelar, dando continuação à abordagem cerne desse trabalho.
7.7) RECURSOS CONTRA O INDEFERIMENTO DA MEDIDA LIMINAR
Consoante posição majoritária, o pronunciamento judicial que indefere, total ou parcialmente, o pedido de medida liminar possui efetivamente natureza jurídica de despacho de mero expediente, que conforme o artigo 504 do CPC, não comporta qualquer recurso, salvo impugnação através de reclamação, especificadamente nos casos de subversão da ordem processual.
Segundo Liebiman, em notas a tradução do instituto de Chiovenda, ensina que “despacho de Nero expediente” ou “ordinatório” são os que dispõem simplesmente sobre o andamento do processo; enquanto que “despachos interlocutórios” são os que decidem questões controversas relativas à regularidade e a marcha processual, sem lhe pôr fim.
Em virtude do pronunciamento judicial que indeferi total ou parcialmente a medida liminar não se propor a decidir questões controversas sobre a marcha processual, coube a doutrina, pelo princípio excludente, denominá-lo de despacho de mero expediente, o qual não comporta recorribilidade, haja vista, a virtual irrecorribilidade stricto sensu destes despachos.
Todavia, a jurisprudência tem legitimado sua modificação através do instituto da correição, ainda que irremediavelmente associada à restrita condição de efetiva presença da “subversão da ordem”.
Faz-se importante frisar que, quando admitida, ainda que com restrições, a modificação do ato judicial, por via correcional, esse fato por si só, afasta, de forma definitiva, a possibilidade de impugnação através de qualquer outro meio, conforme previsão constitucional, e infraconstitucional, a qual dispõe em seu artigo 5º, inciso II da Lei nº 1533/51:
“Art. 5º. Não se dará mandado de segurança quando se tratar: II – de despacho ou decisão judicial, quando haja recurso previsto nas leis processuais ou possa ser modificado por via de correição”.
Vale ressaltar que, o pronunciamento judicial indeferitório da medida liminar emana do denominado poder cautelar genérico ao qual se atribui, consoante a maioria dos autores, natureza efetivamente discricionária.
O poder discricionário, como já visto, confere efetiva liberdade ao magistrado de escolha de determinadas providências para resguardar a integridade de direitos ou interesses que estejam sendo ameaçados ou violados.
Pela discricionariedade, aquele aprecia os critérios de conveniência e oportunidade para adotar as medidas liminares, com vista a afastar dano iminente que ameace, no seu entendimento, direito das partes antes da entrega definitiva do ofício jurisdicional.
Logo, o magistrado através desse poder, tanto pode se convencer do deferimento, como do indeferimento da liminar, não emergindo desse fato qualquer ilegalidade ou abuso de poder que autorize, dentro dos estreitos limites dos requisitos do mandamus, a impetração da ordem constitucional como ação autônoma de impugnação ou de qualquer outra forma de recurso lato sensu, incluindo neste diapasão os recursos sticto sensu como o agravo, reestruturado pela Lei nº 9 139/95.
Portanto, a facultas do magistrado outorgada pelo legislador, para que aquele conduza o processo com base nela, nada mais e do que o exercício do direito subjetivo inserto no art. 798 do CPC. Insuscetível de impugnação por qualquer via, consoante reiteradas decisões dos Tribunais Superiores e da própria Suprema Corte.
Assim sendo, seja pela discricionariedade do ato judicial que indefere a medida liminar, seja pela irrecorribilidade de tal ato, por ser simples despacho ordinatório, conclui-se que é absolutamente impossível a impugnação desse ato judicial por qualquer meio, com exceção dos recursos administrativos de correição parcial, quando efetivamente presente seu pressuposto fundamental; inclusive através do mandado de segurança contra ato judicial ou do recurso de agravo, conforme a opinião, quase que unânime, da doutrina e da jurisprudência, como se depreende das citações:
“A medida liminar é providência concedida a critério do juiz. A lei reserva à discrição do magistrado suspender o ato atacado in limine, se diante das circunstâncias da impetração entender, na sua prudente avaliação do direito e dos fatos, que há fumus boni iuris e periculum in mora, bem como, em contrapartida, permite-lhe revogar a medida, se convencer da inoportunidade de sua iniciativa” (Miguel Jeronymo Ferrante, in Decisão Denegatória de Liminar em MS, RF 305/89, p.341).
“A suspensão liminar está facultada ao juiz para que não frustre o direito reclamado, quando bem fundado o pedido. É uma apreciação que o juiz terá que se mover com certa liberdade (…)” (Castro Nunes, Do Mandado de Segurança, 58 ed. 1956, p. 348).
“Afirmamos que da medida liminar não cabe recurso. Estabelecem o art. 504 do CPC para munidade única ao seu regime recursal os despachos de mero expediente. Para efeito de nosso estudo, soa bem mais clara a afirmativa excludente do Código de Processo Civil português, de 1967, no art. 679:” Não admitem recurso os despachos de mero expediente nem os proferidos no uso legal de um poder discricionário “(J.M. Othon Sidou, in Hábeas Corpus, Mandado de Segurança e Ação Popular, 3ª ed. Forense, Rj, p. 232)”.
7.8) RECORRIBILIDADE DO PRONUNCIAMENTO JUDICIAL INDEFERITÓRIO DE MEDIDA LIMINAR
Não obstante, a maioria dos doutrinadores e da jurisprudência sustentarem a tese da irrecorribilidade do pronunciamento judicial indeferitório de medida liminar, há uma pequena parcela, sobretudo, da jurisprudência, que defende ponto de vista contrário, no sentido da absoluta e ampla recorribilidade do pronunciamento judicial que indeferi a medida liminar, qualificando, inclusive, esta manifestação do juiz como efetiva decisão interlocutória, passível, portanto, do recurso processual de agravo (Lei nº 9139/95) e, até mesmo, do recurso lato sensu consubstanciado no mandado de segurança como ação autônoma de impugnação. Consoante transcrição abaixo:
A concessão, ou a denegação de liminar envolve decisão (e não Nero despacho) “(Athos Gusmão Carneiro, in Liminar na Segurança Individual e Coletiva, R. AJUFE, mar. /jun. 92, p.24)”.
“A liminar em cautelar é uma decisão interlocutória, agravável de instrumento” (ac Unân. Da 6ª Câm. Do TJRJ no agr. 716/88, rel. Perlingeiro Lovisi; Adcoas 1989, nº 123.715).
Contudo, esses autores, data vênia, esquecem de que a não-concessão da medida liminar fere apenas interesses e jamais direitos de qualquer das partes que não atinge o mérito da questão trazida ao conhecimento do Poder Judiciário considerando, sobretudo, que o indeferimento, in limine da providência cautelar não permite qualquer antecipação da tutela através da avaliação do fumus boni iuris.
Considerando que a apreciação da medida liminar é um ato tipicamente discricionário do juiz, fundado naqueles critérios já mencionados, e em última análise visa garantir a efetividade de sua própria decisão definitiva posterior, somente a este mesmo julgador poderá ser outorgado o poder legítimo de decidir quanto à real necessidade de tutela acauteladora; do contrário a desnaturaria do próprio objetivo da providência cautelar, desvinculando-a, em parte, da decisão final que será proferida pelo juiz da causa na instância originária.
Ressalta-se, que o direito brasileiro não admite a hipótese de um mandado de segurança ou qualquer outro instrumento, inclusive o recurso de agravo, servir como meio idôneo para simplesmente se sobrepor ao critério de interpretação da norma jurídica pelo magistrado originariamente competente para o julgamento da questão levada ao seu conhecimento salva entendimento contrário, até mesmo porque não é possível a interposição de mandado de segurança contra ato puramente judicial, no sentido de exclusivamente discricionário.
“(…) Em falta de recurso, o mandado de segurança é meio hábil para afastar ilegalidade de que seja eivado um ato de autoridade judicial, embora não deva sobrepor-se ao critério de justiça do juiz” (ac. no Mandado de segurança nº 76.987, das Câmaras Reunidas do Tribunal de Alçada de São Paulo, relator designado Afonso André, Rev. dos Trib. vol. 378, ps. 250-252).
7.9) RECURSOS CONTRA O DEFERIMENTO DA MEDIDA LIMINAR
A doutrina, quase que unânime, defende a tese de que a manifestação do magistrado no sentido da concessão in limine da providência cautelar requerida, ou concedida ex-ofício, constituise em típica decisão interlocutória (art. 162, § 2~, do CPC/ 73), passível por seu turno do recurso próprio de agravo, particularmente.
Com a recente introdução do efeito suspensivo pela lei nº 9.139/95.
“Da decisão que concede a medida liminarmente (…) caberá o recurso de agravo de instrumento” (Alexandre de Paula, in CPC Anotado, 4 a ed., ERT, SP, p.2883).
“A concessão liminar de qualquer medida cautelar é decisão eminentemente agravável (…)” (ac. unân. da 3ª Câm. do 2º TACivSP de 10.11.81, na apel. 133.326, rel. juiz Francisco Murilo Pinto, RT 557/137).
A concessão da medida liminar como decisão incidente, se não fosse a sua excepcional efetividade-capaz de produzir prejuízos irreparáveis à outra parte (requerido ou impetrado)- em contraposição da anterior ausência do imediato efeito suspensivo do seu meio próprio de impugnação, ou seja, o recurso de agravo.
Por esta razão, a doutrina e a jurisprudência têm admitido o mandado de segurança como instrumento provedor do imprescindível efeito suspensivo ao recurso de agravo interposto, ao seu tempo contra a decisão concessiva de medida liminar, não obstante as diversas críticas a esse entendimento manifestadas por aqueles que entendem que a simples previsão do recurso específico de pedido de cassação da medida liminar ao presidente do tribunal a que se encontra vinculado o magistrado prolator do decisum já se constituiria em motivo suficiente para afastar qualquer necessidade de criar uma nova modalidade de recurso com mesmo objetivo e efeito.
Mais recentemente, o mandado de segurança parece ter evoluído de sua condição básica de simples instrumento, passando a se constituir efetivamente em uma verdadeira ação autônoma de impugnação, não mais simplesmente interino ou provisório capaz de, in limine, simplesmente suspender a eficácia da medida liminar concedida pelo juízo a quo, independente da interposição do recurso de agravo e em flagrante caráter substitutivo ao recurso especifico (pedido de cassação ao presidente do tribunal a que se encontra vinculado o julgador), expressamente previsto na legislação de mandado de segurança (art. 4 0 da Lei n 0 4.348/64) e recentemente ampliada para todos os tipos de providencias cautelares, concedidas in limine, inclusive ação popular, ação civil pública e ações cautelares de modo geral (art. 4 da Lei nº 8.437/92), muito embora, antes do advento da referida lei, o disposto no art. 4 da lei nº 4.348/64 já fosse utilizado, por analogia, as diversas situações de deferimento de medidas. Liminares em ações não mandamentais.
Convergem diversos entendimentos no sentido da possibilidade de ajuizamento de medidas cautelares – em lugar do mandado de segurança-objetivando o mesmo fim, não obstante tal posição jurisprudencial constituir-se em ponto de vista praticamente isolado, considerando o entendimento majoritário no sentido de que a providencia cautelar referida no artigo 21, IV do RISTE é a própria medida liminar, ínsita na ação manda mental.
Por outro lado, nos últimos anos, parcela pouco expressiva da doutrina (e praticamente isolada na jurisprudência) tem entendido pela possibilidade ampla de interposição da ação autônoma de impugnação mandamental também nos casos de indeferimento da medida liminar, com conseqüente concessão in limine da providencia cautelar vindicada em flagrante e, inadmissível caráter substitutivo (e verdadeiramente subversivo) a competência jurisdicional originária.
É válido ressaltar que o mandado de segurança na qualidade de ação autônoma de impugnação — diferente das demais formas de recursos (do tipo stricto sensu como agravo de instrumento ou do tipo administrativo como pedido de cassação ao presidente do tribunal) -, possui diversos pressupostos específicos para sua admissibilidade que se traduzem, principalmente pela comprovação da ilegalidade ou abuso de poder na prolação do ato impugnado em face de efetiva existência do direito liquido e certo a amparar o direito do recorrente, e ainda a efetiva competência do órgão ad quem para apreciação do mandado de segurança como meio recursal.
Por último, temos o meio jurídico idôneo de impugnação lato sensu à decisão concessiva de medida liminar (que nesse particular também aplicável aos casos de indeferimento da providência cautelar in limine) o pedido de reconsideração da decisão (ou simplesmente pedido de revogação, como prefere alguns), dirigido diretamente ao magistrado prolator ao decisum (ou do despacho no caso de não concessão da medida postulada), e com nítido objetivo de — através de novas ponderações — fazer o julgador refletir sobre o alcance de sua decisão (ou de seu pronunciamento) e dos eventuais danos de difícil ou impossível reparação que poderão advir quando da efetivação da medida.
7.10) REVOGAÇÃO, CASSAÇÃO E PEREMPÇÃO DA MEDIDA LIMINAR
A revogação de liminar tem sido considerada por alguns autores como impróprio pelo simples fato de que no direito administrativo, a expressão assume um significado diferente, ou oportunidade, incompatível, portanto com a liquidez e certeza pertinentes ao mandado de segurança.
Consoante LÚCIA VALLE FIGUEIREDO
“Não se deve em nenhuma hipótese, falar em revogação de medida liminar quando se está pensando em termos judiciais, uma vez que essa medida não se coloca propriamente ao livre e absoluto arbítrio do juiz, dependendo para sua concessão, muito pelo contrário, da efetiva existência de pressupostos”.
E absolutamente óbvio que tal situação só será possível se, durante o curso da lide, advir qualquer fato novo que, uma vez verificado, provocaria afastamento do fundamento da liminar.
A medida liminar pode ser revogada a qualquer tempo – por tratar-se de medida cautelar – conforme dispõe expressamente o art. 807 do CPC. Para esse ato, é dispensável audiência prévia do requerente ou impetrante, pois o rito especial ‘ sumaríssimo ‘ dos writs constitucionais, assim como o rito ‘sumário’ da ação cautelar não comporta instauração de processos incidentes, com discussão e apresentação de provas fora do momento fixado por lei.
Em relação à perempção ou a caducidade será decretada ex-ofício ou a requerimento do Ministério Público, a doutrina tem entendido ser necessário o oferecimento de oportunidade para que o impetrante sane a inércia processual que está a acarretar tão grave decisão da autoridade judicial, aplicando-se, subsidiariamente, pela coincidência do principio processual, a norma prevista no art. 267, §10 do CPC.
É importante frisar que a expressão Ministério Público, contida nesse artigo ten o significado de’ representante judicial da pessoa natural ou jurídica’.
Quanto à cassação da eficácia da medida liminar (lato sensu), ULDERICO PIRES DOS SANTOS afirma;
A decisão que revoga a liminar em mandado de segurança não comporta qualquer recurso. Não há lei qualquer sucedâneo legal estabelecendo-o’.
Para ele, o recurso cabível nesse caso, é o que o impetrante pode interpor contra a sentença final que julga o pedido de segurança, lembra que se a liminar concedida for cassada, ela se tornará insubsistente em definitivo face às características de precariedade e provisoriedade de que se reveste.
Para revogá-la, bastará ao juiz convencer-se de sua inconveniência ou de sua desnecessidade.
7.11) SUSPENSÃO DE MEDIDA LIMINAR E 0 PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
Segundo SERGIO FERRAZ;
‘Tanto a suspensão quanto à revogação da liminar estão previstos no art. 20 da lei n 0 4.348/64, ainda que — invocando o art. 807 do CPC — aparentemente contrariam a idéia do devido processo legal em que está inserido o próprio princípio do contraditório, colocando em possível risco o direito da parte que obteve, através da medida liminar (e por vias transversais), determinada antecipação dos efeitos buscados pela sentença.
Para o professor HELY LOPES MEIRELLES, quanto ao contraditório da parte impetrante sobre o pedido de suspensão;
‘Embora exista o dever de motivar o despacho cassatório de modo a evidenciar as razões que justificam e legitimam o ato, fica sempre reservado ao elevado critério do presidente do tribunal a valoração intrínseca da conveniência e oportunidade da suspensão da medida liminar, conforme pode ser constatada na recente decisão de suspensão de liminar do E. TRF da 2 0 Região’.
7.12) DO RECURSO CABÍVEL CONTRA O DESPACHO QUE APRECIA A SUSPENSÃO DA MEDIDA LIMINAR
Tanto a lei nº 4.348, como o RISTF, como o RISTJ, como a lei nº 28/90, indicam o agravo como sendo o recurso hábil no combate a decisão presidencial que deferiu a suspensão da liminar.
Para o professor HELY LOPES MEIRELLES;
Se for cassado, o liminar ou suspenso o efeito da sentença, cabe agravo regimental, sem efeito suspensivo’.
A questão fundamental, entretanto, cingi-se não aos casos em que o presidente do tribunal entende pela a suspensão da medida liminar, mais exatamente nos casos em que o presidente, contrariando o pleito da parte interessada, decide pela não suspensão.
O Supremo Tribunal Federal, através da Súmula 506, pacificou o entendimento segundo o qual, o agravo a que se refere o art 4º da lei nº 438/64, cabe, tão somente, do despacho do presidente do STF que defere a suspensão da liminar em mandado de segurança e não do que denega.
A lei nº 8437 de 30 de junho de 1992 inovou ao dispor em seu art. 40, § 3º, que “do despacho que conceder ou negar a suspensão caberá agravo no prazo de cinco dias”, eliminando por sentença toda e qualquer dúvida a esse respeito.
7.13) LEGITIMIDADE AD CAUSAM PARA REQUERER SUSPENSÃO DA MEDIDA LIMINAR
O Art 4º da lei nº 4.348/64 e o art. 4º da lei nº 8.437/92 determinam que o requerimento da suspensão deverá ser feito pela pessoa jurídica de direito público interessado ou pelo Ministério Público.
Tais dispositivos encerram uma conceituação defeituosa e por isso, deverão ser interpretados racionalmente, para que possam atingir seus objetivos.
Quanto à competência para examinar o pedido de suspensão da medida liminar, existe discordância tanto na doutrina como na jurisprudência. Logo, sendo a medida liminar concedida pelo juízo de primeira instância, competirá ao presidente do tribunal competente para apreciar o recurso suspender ou não a liminar, conforme o art 4º da lei nº 8.437/92.
No entanto, se a liminar for concedida pelo presidente ou vice-presidente do tribunal, já decidiu anteriormente o STF que o pedido cabível deveria ser dirigido diretamente para a própria Suprema Corte, e não, através do agravo regimental, dirigido perante o próprio tribunal originário uma vez que, a competência para apreciar o pedido seria no caso, do presidente do supremo (STF, RECLAMAÇÃ0 1 72-5-SP, IN RT612/201).
A pessoa jurídica de direito público, que preenche os requisitos do art. 4º lei 348/64, pode pedir ao presidente do tribunal a que pertence o relator, quando a competência é originária do tribunal, para que suspenda a execução da liminar então concedida C RT 663, Jan/91, p. (56).
CONCLUSÃO
As providências cautelares, em seu sentido genérico, ou em sentido específico o de medida cautelar; ou na sua forma instrumental de medida liminar; traduzem urna das mais importantes manifestações criadas pelo nosso ordenamento jurídico para garantir que o Estado-juiz cumpra com a sua função jurisdicional, de maneira equânime e justa.
Ao longo deste trabalho, constatou-se que os termos supra citados, embora pertençam o ao mesmo instituto, não são expressões sinônimas e, portanto, devem ser utilizados de forma correta, para se alcance o real sentido dos mesmos.
As providências cautelares representam o conteúdo generalizante, o qual possui um pedido específico, que é a medida cautelar; sendo que ambas se exteriorizam através da medida liminar.
Esta, conforme a maioria dos doutrinadores, é um provimento judicial de natureza jurídica administrativo-cautelar, possuindo objeto próprio e distinto da ação cognitiva.
Em decorrência de sua natureza jurídica, a concessão da medida liminar está vinculada a presença de requisitos específicos retro mencionados; sem quais é inadmissível seu deferimento.
Mister cabe ressaltar ainda, que os recursos em matéria de liminar divergem quanto o deferimento ou indeferimento da concessão da mesma. Sob esta óptica, a grande maioria dos doutrinadores, entendem que não cabe recurso contra o ato que indefere a concessão da mesma.
Admitindo, apenas, no caso de arbitrariedade do magistrado os recursos de natureza administrativa, como a reconsideração e a correição.
Mas, se o recurso é contra ato que deferiu a liminar é absolutamente cabível, podendo ser feito através de agravo e de mandado de segurança ou dos recursos administrativos.