O cárcere e a agonia da superlotação

Marcelo Lessa Bastos

Muito se tem reclamado acerca da superpopulação carcerária que é um problema não somente nosso, mas de todo o Brasil. As cadeias já não comportam mais os presos que custodiam, os quais, não raras vezes, se vêem na contingência de terem que se revezar em turnos para poderem dormir, já que não há espaço e nem acomodações para todos. Isto sem falar na insalubridade, na falta de saneamento e de condições mínimas para uma vida digna.

O problema existe há décadas e sua solução, decerto, não virá da noite para o dia, porque é preciso mais do que recursos; é preciso vontade administrativa para investir tais recursos num setor que, politicamente, não dá retorno.

A construção das Casas de Custódia em nosso Estado é um passo pioneiro. O caminho começou a ser trilhado mas, certamente, ainda há muito a ser percorrido: infra-estrutura, pessoal qualificado, e muitas, muitas outras Unidades Prisionais.

Todavia, é preciso que encaremos o problema sem hipocrisia. A questão da superlotação das cadeias no Brasil deve ser vista num contexto muito mais amplo: existe, neste país, um déficit ainda maior de moradia. Dezenas e dezenas de famílias vivem em condições muito piores que os presos: também têm que dividir cubículos onde mal cabe uma pessoa; têm que dormir pai, mãe e filhos, muitos filhos, em uma única cama; não têm saneamento básico; e o pior: não têm nem comida, o que os presos não têm do que reclamar.

Um detalhe: essas famílias nada fizeram para passarem por todas essas privações; já os presos, se lá estão, é porque fizeram por onde merecer. Muitos deles, aliás, mereciam ainda coisa muito pior.

Numa escala de valores, é natural que o Administrador canalize seus recursos para aquelas famílias que, apesar das privações, resistiram em passar para o outro lado.

Não é que os presos devam ser esquecidos nas masmorras. De forma alguma. Mas é preciso, de uma vez por todas, que nos conscientizemos de que o problema é muito mais amplo e que as soluções hão de vir a seu tempo, observadas as devidas prioridades. Que eles pensassem duas vezes antes de escolherem seu destino.

Devemos ter pelos presos a mesma consideração que eles tinham por nós, enquanto soltos. Nem mais, nem menos.

Marcelo Lessa Bastos
Professor de Direito Penal
e Processual Pena
Promotor de Justiça
2ª Promotoria de Proteção aos Direitos Difusos

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