O USO DE PEÍCULAS NOS VIDROS E O CTB

Por:Marcelo José Araújo*

I – Histórico

A questão sobre a aposição de películas refletivas ou não sobre as partes envidraçadas dos veículos teve sua regulamentação através da Resolução 747/90, do dia 03/05/90, do Conselho Nacional de Trânsito- CONTRAN, a qual proíbe expressamente a utilização de qualquer tipo de película, reflexiva ou não, nas áreas envidraçadas dos veículos.
No dia 14/09/92 foi editada a Resolução 764/92 do Contran , a qual permitiu a colocação de películas nos vidros dos veículos, desde que dentro dos seguintes padrões:

a) pára-brisa – apenas na borda superior, fora do campo de visão, com no máximo 15 cm de largura, e transmissão luminosa não inferior a 35%.
b) janelas laterais dianteiras – transmissão luminosa não inferior a 70%.
c) janelas traseiras e vidro traseiro – transmissão luminosa não inferior a 50%.
* Os veículos deveriam portar selo que atestasse o atendimento à Resolução.

Apenas dois meses e meio depois, no dia 30/11/92, o então Ministro da Justiça, Dr. Maurício Correa, promoveu um despacho revogando a Resolução 764/92 e revalidando, ou seja, ripristinando expressamente a Resolução 747/90, estando novamente proibida a aposição de películas. Destaca-se que o Contran está subordinado ao Ministério da Justiça.

Em 12/06/94 foi editada a Resolução 784/94 do Contran, a qual regulamenta a “coloração” de vidros nos veículos. Destacamos, porém, que tal Resolução é direcionada à indústria de fabricação de vidros , e não aposição de películas em vidros já fabricados. Aliás, o Art. 4º da Resolução 784/94 expressa exatamente essa intenção reiterando a validade da Resolução 747/90.
O Novo Código de Trânsito, ou Código de Trânsito Brasileiro -CTB ( e não Código Brasileiro de Trânsito), quando ainda em fase de projeto, possuia a redação do seu Art. 111, inciso I a proibição de películas refletivas ou não. Houve, porém, o veto presidencial nesse inciso, com a seguinte razão:

“É certo que o objeto do inciso I inspira-se em razão de segurança do trânsito.
Não obstante, a proibição total de uso de quaisquer adesivos não parece condizente com qualquer noção de razoabilidade . Recomenda-se, por isso, o veto ao dispositivo. a matéria poderá ser objeto de proposta de regulamentação em projeto a ser encaminhado pelo Executivo ao Congresso Nacional.”

Fora feito esse veto, PORÉM, não foi feito qualquer veto no Art. 230, XVI do mesmo Código, no qual consta proibição expressa da colocação de películas refletivas ou não, sendo prevista a retenção do veículo para regularização, além da multa de natureza Grave.
No dia da entrada em vigor do Novo Código, dia 22/01/98, a Lei 9602/98 incorporou ao Art. 111 do Código de Trânsito um inciso III, o qual determina que é vedada a colocação de películas quando houver comprometimento da segurança, na forma de regulamentação do CONTRAN.
Muito bem lembrou o Autor, que o Art. 314 do CTB estabelece que as Resoluções que não conflitem com sua redação permanecem em vigor.

II – Conflito com o Código de Trânsito Brasileiro

O fundamento principal do presente “writ” é que o Autor entende que o CTB revogou implicitamente a Resolução 747/90 do Contran, uma vez que ao incorporar ao Art. 111 o inciso III, estaria permitindo de alguma forma a colocação de películas, forma esta ainda a ser regulamentada pelo Contran. Busca suporte nesse entendimento na própria razão de veto presidencial ao inciso I do mesmo artigo. Os fundamentos desse entendimento já foram devidamente apresentados pelo Autor na inicial.
Diverge, porém, do entendimento da Autoridade Executiva de Trânsito e dos agentes fiscalizadores tal tese, os quais entendem que não houve revogação da Resolução 747/90 do Contran, uma vez que além de não conflitar com o CTB, está a regulamentar o inciso III do Art. 111 até que nova regulamentação a modifique, e o faz amparado nos seguintes fundamentos.

II.a)

O inciso III remete ao Contran a competência de regulamentar a aposição de películas nos vidros dos veículos caso não haja comprometimento da segurança. Fora explicado no histórico acima que durante o prazo de dois meses e meio no ano de 1992 a Resolução 764/92 permitiu a aposição de películas dentro dos padrões estabelecidos, porém, por despacho do Ministro da Justiça houve a revogação de tal Resolução e a ripristinação expressa da Resolução 747/90, com proibição absoluta. Seus fundamentos eram em relação ao devido controle no atendimento dos padrões por parte das autoridades fiscalizadoras, entendendo ser mais prudente a proibição total do que a permissão dentro de padrões de difícil controle.

Conclui-se que a Resolução 747/90 do Contran não conflita com o CTB, e sim regulamenta seu Art. 111, inciso III ao estabelecer que não há excessões para colocação de películas nas áreas envidraçadas.

II.b)

A Resolução 784/94 do Contran que regulamenta a “coloração” dos vidros dos veículos reitera a prevalência da Resolução 747/90 para o caso de “aposição de películas”. Destacamos que a “coloração” dos vidros está relacionado com o processo de fabricação do vidro (película colocada entre as camadas do vidro como um sanduíche), enquanto que a “aposição” fruto dessa discussão é sua colocação no vidro já fabricado.

A conclusão do ítem anterior permanece, reforçada por uma resolução que permite a colocação de películas, só que na fase de confecção do vidro e e não posterior. A Resolução 784/94 do Contran também não conflita com o CTB e ainda estabelece um critério de regulamentação do Art. 111, inciso III , ou seja, a “aposição” da película no vidro pronto que é vedada, e a “aposição” sobre o vidro em fase de fabricação, para promover sua “coloração”, a qual estaria com isso determinando qual é o caso em que não há comprometimento da segurança.

II.c)

Se considerarmos que apesar das justificativas apresentadas nos ítens II.a) e II.b) acima, e que não apenas a Resolução 747/90, mas também a 784/94 estivesse revogada, ainda assim permanece no Código de Trânsito Brasileiro a proibição expressa e sem qualquer excessão da aposição de películas no Art. 230, inciso XVI, qual seja:

Art. 230. Conduzir o veículo:

XVI – com vidros total ou parcialmente cobertos por películas
refletivas ou não, painéis decorativos ou pinturas;

Infração- grave;
Penalidade- multa;
Medida administrativa- retenção do veículo para regularização;

Dessa forma, diferentemente daquilo que concluiu o Autor, a ausência de regulamentação por parte do Contran não viria a permitir a colocação de películas, e sim a proibir de forma expressa pelo próprio CTB. Nesse caso, ausência é proibição e não permissão. Só seria possível concluir como o Autor se tivesse sido vetado o inciso I do Art. 111 e o inc. XVI do Art. 230, ambos do CTB.

Se o Contran fizer uma regulamentação permitindo a colocação de películas dentro de determinados padrões é que haverá conflito entre essa possível Resolução e o Art. 230, XVI do CTB, onde se poderá argumentar que uma Resolução não poderá autorizar aquilo que expressamente está vedado no Código, salvo se for revogado o referido artigo.
Conclui-se que se não houve revogação da Resolução 747/90 do Contran pelo CTB, a proibição da “aposição de películas” é por regulamentar o inciso III do Art. 111 do CTB, não estabelecendo excessões, estando em consonância com o Art. 230, XVI do mesmo CTB. Se houve revogação da Resolução 747/90, por conflitar com o CTB, a proibição decorre do Art. 230, XVI do CTB, o qual proíbe sem excessões a “aposição de películas”, o qual supriria tal regulamentação.

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