AUTARQUIA, EMPRESA PÚBLICA E SOCIEDADE DE ECONOMIA

É sabido que as autarquias, juntamente com as empresas públicas e sociedades de economia mista, integram a administração pública indireta, sendo as primeiras pessoas jurídicas de Direito Público e, as segundas, de Direito Privado. Mas não são apenas esses os traços distintivos entre umas e outras. Às autarquias só devem ser outorgados serviços públicos típicos, e não atividades industriais ou econômicas, ainda que de interesse coletivo, campo de atuação das empresas públicas e sociedades de economia mista.

A nova Emenda Constitucional nº 19 alterou o art. 173, § 1º da Constituição Federal,cuja redação dispunha que a empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica sujeitam-se ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas.

É preciso citar a enorme polêmica travada na doutrina e na jurisprudência a esse respeito.

De um lado, no Supremo Tribunal Federal, podemos citar, o ministro Paulo Brossard para quem não me parece que o preceito alcance as autarquias. Ele alude a empresas públicas, sociedade de economia mista e outras entidades, que não as autárquicas… Que entidades são essas? A Constituição não diz. Mas elas não são, nem poderiam ser, as autarquias. (RE 153.523-7-RGS). Para o ministro, seria um arrematado absurdo que a Constituição deixasse de empregar o vocábulo de uso corrente na linguagem legal (ou seja, autarquia), para escondê-lo sob o eufemismo e outras entidades, pois quando o texto constitucional quer referir-se a autarquia ele o faz sem subterfúgios. E, finalmente, constituindo a autarquia segmento do serviço público, é imune, como a União, se for federal, como o Estado, se for estadual, como o Município, se for municipal; não está sujeita a obrigações tributárias, por conseguinte; a ela não se pode referir o parágrafo 1º do art. 173 da Constituição.

De outro lado, o professor e ministro Carlos Velloso, também do Pretório Excelso, defende a tese de que, nos termos do multicitado art. 173, parágrafo 1º da Constituição de 1988, a autarquia que exerce atividade econômica sujeita-se ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias. Da mesma forma, se uma empresa pública ou mista não exerce atividade econômica, mas é prestadora de serviço público, não está ela sujeita ao regime próprio das empresas privada. (trechos extraídos do mesmo acórdão). O atual art. 173, parágrafo 1º, com a redação da EC 19/98 dispõe:

A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre…

A questão se acirrará.

Será válida, portanto, a interpretação colhida sob o pálio da Constituição de 1967? Isto é, de que seria possível que uma autarquia explorasse atividade econômica e continuasse com personalidade de direito público (?). É que a regra do citado parágrafo 2º do art. 170, não custa rememorar, dizia respeito, apenas, às empresas públicas e sociedades de economia mista. No regime da Constituição de 1988, isso não ocorre, dado que, conforme vimos, a regra do parágrafo 1º do art. 173, da CF/88, diz respeito às empresas públicas, às sociedades de economia mista e outras entidades que explorem atividade econômica. (min. Carlos Velloso).

Seja como for, é importante registrar, que, mesmo no regime da Constituição anterior, o ministro Carlos Velloso sustentava referido entendimento que, com maior razão, continuou sustentando sob a Constituição de 1988, no sentido de que seria possível distingüir as empresas públicas e as sociedades de economia mista prestadoras de serviço público daquelas outras constituídas para o fim de exploração, pelo Estado, de atividade econômica e que seria possível estabelecer, para ambas, regimes jurídicos distintos. (Empresas Estatais: Responsabilidade e Controle, em RDP 85/81). Por seu turno, defende a professora Maria Silvia Di Pietro, em sua obra Parcerias na Administração Pública, São Paulo: Atlas, 1996, p. 34, que é de duvidosa constitucionalidade a criação de empresas estatais para a prestação de serviços públicos, pois o art. 175, caput da Constituição Federal (não alterado), diz que incumbe ao poder público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, a prestação de serviços públicos.

Como visto, o texto em vigor não só suprime a locução e outras entidades que explorem atividade econômica, no art. 173, parágrafo 1º, como se refere a empresa pública, sociedade de economia mista e subsidiárias que explorem atividade de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços (e aqui não os adjetiva como públicos), ou seja, sem fazer distinção, existente na doutrina entre empresas públicas e sociedade de economia mista prestadoras de serviços públicos e aquelas outras que são constituídas para o fim de exploração, pelo Estado, de atividade econômica.

Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira
Procuradora do Ministério Público junto ao Tribunal de
Contas do Distrito Federal e autora do livro Reforma
Administrativa, o Estado, o Serviço Público e o Servidor

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