Consumidor sem garantia

Os denominados shoppings populares, camelódromos ou mesmo, os camelôs de rua, estão abarrotados de mercadorias oriundas da Cidad del Leste, Paraguai. São aparelhos eletrônicos diversos, brinquedos, cosméticos, ferramentas, cds, utensílios etc. Será que estes produtos possuem garantias? E se apresentarem defeitos de “fabricação”, o nosso código de proteção e defesa do consumidor está apto a defender este consumidor?

A Lei n. º 8.078/90 criou o conhecido Código do Consumidor, que, em seus artigos 2º. e 3º, define o que seja: consumidor, fornecedor, produto e serviço. Equiparando a fornecedor “os entes despersonalizados”, denominação que abarcaria estes comerciantes informais e, por conseguinte, esta lei protetiva se aplica a essa modalidade ilícita de fornecedores.

A teoria assim preconiza, mas a pratica é bem outra, senão vejamos: estes produtos não são importados legalmente, pelo contrário, trata-se de mercadorias de procedência criminosa, fruto de contrabando (artigo 334, do Código Penal). Assim sendo, como estes fornecedores, denominados pela lei de “entes despersonalizados” vão emitir a devida nota fiscal, a qual é obrigatória, em conformidade com o artigo 1º, inciso V, da Lei n. º 8.137/90 (penaliza com pena de reclusão de 2 a 5 anos a não emissão da nota fiscal).

Seriam então estes consumidores amparados pelo artigo 18 do Código do Consumidor, que prevê a garantia obrigatória, não necessitando de nota fiscal. Pois estes “fornecedores” teriam 30 dias para reparar os vícios de qualidade dos produtos que comercializaram ou devem substituir, este produto por outro da mesma espécie, caso não seja possível, restituir a quantia paga ou fazer um abatimento proporcional ao preço.

Em tese, a resposta é afirmativa, mas, sem a nota fiscal, fica difícil fazer prova da data da aquisição e da espécie do produto, o que prejudicaria as reclamações administrativas do consumidor. O que, necessariamente, remete o consumidor ao Poder Judiciário comum ou ao Juizado Especial Cíveis, situação de que nenhum de nós, brasileiros, gostamos, pois é sinônimo de muita demora crônica.

Imagine a situação de um brinquedo eletrônico ser adquirido em um camelô que, na data da venda, estava às margens de uma via pública central. Constatado o defeito do produto, no dia seguinte, será que iríamos encontrar este “fornecedor” nesse mesmo local, pelo menos para informar o endereço da assistência técnica? Neste caso, de que adiantaria a garantia legal mencionada?

Vimos que, pelo caminho legal, a vida do consumidor, para estes casos, não é nada fácil. Entretanto, vislumbro que, pela estrada da cidadania, ela é perfeitamente possível. Vivemos em um estado de direito de um regime democrático, em que cidadania nada mais é de que um conjunto de direitos e deveres. Adquirir um produto de um fornecedor legalmente estabelecido, exigir a nota fiscal e o termo de garantia devido fazem parte deste contexto.

Na hipótese de ser o consumidor uma pessoa de poucos recursos financeiros, também sugerimos uma conduta legal e de bom senso: adquirir seus produtos em lojas populares, conhecidas coloquialmente por “1.99”. Apesar da baixa qualidade dos produtos lá encontrados, o consumidor tem condições de fazer valer seus direitos, pois se presume que a importação é legal e a expedição do documento fiscal é perfeitamente possível. O que, tanto para o consumidor, quanto para o fornecedor e o Estado fica de bom tamanho, havendo o recolhimento do imposto devido, o que é vantajoso para todos.

Assim, o consumidor deve se conscientizar de que seus direitos dificilmente lhe serão ofertados, sendo que ele terá que conquistá-los, e sua luta e árdua, nestes casos. Porém, fazendo sua parte, que é fazer suas compras em lojas estabelecidas. Agindo como cidadão, as coisas ficam bem mais facéis para todos, inclusive para os órgãos de defesa do consumidor. Portanto, consumidor, faça o seu dever de casa, aplique cidadania nos “pirateiros”.

*ANTÔNIO CARLOS DE LIMA
Delegado titular da Decon-GO, doutorando em Direito e professor da UNIP e FASAM

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