Uma série de crimes violentos com a participação de menores de 18 anos, tem ensejado debates em torno da necessidade de diminuição da faixa etária que dá início a responsabilidade penal.
É necessário dar-se à execução das penas nesses casos – superando uma séria objeção dos que se opõem à redução da idade para a maioridade penal – um tratamento especial
O assunto tem sido tratado pelos “formadores de opinião”, metidos a penalistas e por alguns outros jejunos em matéria penal, de forma simplista.
Alinho-me entre os postulantes de uma redução da idade da dita maioridade penal. Esta tem sido uma tendência majoritária das legislações modernas. Colaciono, entre outros, nesse sentido, o Código Penal português (art. 19), o Código Penal cubano (art. 16), o Código Penal chileno (art. 10, 2º), o Código Penal boliviano (art. 5º), que fixam em 16 anos o início da responsabilidade penal. O Código Penal russo em seu artigo 16 e o Código Penal chinês no seu art. 14, fixam a maioridade penal em 16 anos, mas a reduzem para 14 anos nos delitos de homicídio, lesões graves, roubos, e outros crimes de igual relevância. O Código Penal da Etiópia (cujo projeto se deve a Marc Ancel), prevê o início da responsabilidade penal aos 15 (quinze) anos em seu art. 53. O Código Penal francês, de recente edição (1992), reduz a maioridade penal aos 13 anos. O que me parece um exagero.
No caso brasileiro, não basta revogar o art. 228 da Constituição Federal como sugeri em trabalho – Direito Penal e Revisão Constitucional – encaminhado ao Ministro Jobim, e publicado na Revista dos Tribunais. Não basta revogar o artigo 27 do Código Penal. Não é suficiente que seja previsto um novo e menor parâmetro etário para o início da responsabilidade penal. É necessário que venha convenientemente disciplinado, ou seja, acompanhado de algumas disposições que sabiamente o regulem. Sem essas medidas é provável que a redução etária da responsabilidade penal se converta em uma forma de incentivo à criminalidade.
Em primeiro lugar, é preciso dar-se à lei certa flexibilidade, permitindo-se ao juiz, em casos especiais, possa, ao invés de aplicar a lei penal, usar das sanções previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente. Aliás, o Código Penal Militar, em seu art. 50 (atualmente inconstitucional em virtude do art. 228 da Constituição Federal), dispõe a responsabilidade penal aos 16 anos, desde que o acusado “revele suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter criminoso do fato e determinar-se de acordo com esse entendimento”. Tal norma constava no frustrado (por não ter entrado em vigor) Código Penal de 1969. Essa disposição faculta ao juiz, face o caso concreto, o exame das condições mentais do réu, e, conseqüentemente, decidir sobre a conveniência da aplicação da lei penal.
Em segundo lugar, é recomendável dar-se à atenuante prevista no artigo 65, I, do C. Penal, uma nova redação prevendo, na aplicação da pena aos delinqüentes menores de 21 anos, uma obrigatória redução da pena de 1/3 (um terço) até a metade, como já prevê o mencionado art. 50 do Código Penal Militar. Trata-se de uma orientação legal presente, de uma maneira geral, nos códigos penais contemporâneos.
Por último, é necessário dar-se à execução da pena nesses casos – superando uma séria objeção dos que se opõem à redução da idade para a maioridade penal – um tratamento especial. Não é nem sequer pensável que venham cumprir penas juntamente com os delinqüentes adultos. É necessário que as penas sejam executadas em estabelecimentos carcerários especiais, onde o tratamento penitenciário, rigorosamente individualizado, e de responsabilidade de pessoal realmente qualificado, possa ensejar uma efetiva educação do infrator, alfabetizando-o, se necessário, e dando-lhe uma formação profissional. E, principalmente, viabilizando uma gradativa inserção na sociedade, procurando-lhe um lugar no mercado de trabalho.
Objetar-se-á que tais disposições não serão cumpridas. Não é improvável. Mas poder-se-iam, para prevenir o descumprimento, prever punições de caráter tributário, administrativo, e mesmo penal, para os Estados, os entes públicos e as pessoas que fossem incumbidas da execução de penas para os sentenciados na faixa etária em causa.
Faça-se a redução do patamar etário da responsabilidade penal para 15 ou 16 anos, mas com competência e seriedade. Aliás, a incompetência e a carência de seriedade no enfrentamento de problemas penais têm resultado em leis absurdas e inócuas, e também, em decisões desastradas, inclusive do egrégio Supremo Tribunal Federal. Mas esta é outra “estória”…
* Luiz Luisi
Advogado e Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul