por Antonio Rayol
Em meio a uma crise política causada por denúncias de corrupção que parecem se renovar a cada dia, o presidente da República veio mais uma vez a público, na noite do último dia 23 de junho, em cadeia nacional de rádio e TV, para repetir o já monocórdio discurso de que “este governo não rouba, não deixa roubar e et cetera e tal…”.
Talvez o presidente tenha sido convencido por algum conselheiro “lua preta”, de que a mera repetição insistente de tal construção retórica (tal e qual um mantra), pode fazer com que todos acreditem nela, inclusive ele próprio!
O presidente também aproveitou a oportunidade para louvar o trabalho da imprensa, do Ministério Público e da Polícia Federal, repetindo já enfadonha manobra de tentar fazer crer a todos que seu governo é responsável pelo trabalho de instituições sobre as quais não exerce (nem poderia exercer) nenhum tipo de comando.
Como deve ser em um Estado de Direito Democrático a imprensa exerce seu papel de forma livre e independente, a despeito dos interesses e humores de qualquer governo, o que significa dizer que para um jornalista sério, encômios ou críticas do presidente têm o mesmo valor, ou seja, nenhum!
Dependendo do contexto, inclusive, considerando de onde venham, críticas sinceras podem ser mais lisonjeiras e desejáveis do que elogios nem tanto.
A propósito, fica até difícil entender elogios à imprensa em um governo que há bem pouco atrás pretendia estabelecer um “conselho” com poderes para até mesmo suspender ou cassar o exercício profissional de jornalistas que se portassem de modo inconveniente.
Quanto ao Ministério Público, trata-se de instituição absolutamente autônoma, com atuação pautada pelo cumprimento da Lei no interesse da sociedade, completamente desvinculada de qualquer governo e Poder da República.
Portanto, o trabalho do Ministério Público, também não pode ser creditado na conta de realizações de quem quer que seja, por conta de supostas “cruzadas” contra a corrupção!
Em dado momento do discurso em questão, o presidente afirmou que usará toda a “força da lei” contra aqueles que forem considerados culpados por desvios de conduta, em mais um equívoco claro já que quem processará e julgará, promovendo a aplicação de toda a “força da lei” contra os eventualmente culpados será o Poder Judiciário.
O Poder Executivo, chefiado por nosso presidente, não tem nada a ver com isso! Finalmente, em igualmente já requentado discurso, foi afirmado que “nenhum outro governo combateu a corrupção como este tem combatido”, sendo apresentadas como argumento a corroborar tal assertiva, as inúmeras operações policiais desenvolvidas pelo Departamento de Polícia Federal.
Para parcelas expressivas de nossa sociedade (infelizmente menos esclarecidas), fica a impressão de que a Polícia Federal é uma espécie de guarda pretoriana, que só investiga e prende quando o presidente manda, idéia equivocada que se não é boa para a instituição policial federal pode ser igualmente danosa para o governo no caso da polícia cometer algum erro sério, o que desafortunadamente sempre pode acontecer.
Entretanto, no caso de um fracasso policial é muito pouco provável que o presidente faça um pronunciamento assumindo a responsabilidade!
O Departamento de Polícia Federal está ligado administrativamente ao Poder Executivo através do Ministério da Justiça, mas não depende de aval ou de autorização do governo para cumprir suas atribuições constitucionais, o que faz dentro dos limites da legislação, sob a fiscalização do Ministério Público e do Poder Judiciário!
Qualquer observador atento pode perceber que algumas das operações deflagradas ultimamente pela Polícia Federal são resultado de investigações iniciadas anos atrás, ainda sob outro governo federal.
A nova forma de atuar do DPF também só foi possível graças à introdução de novas e sofisticadas ferramentas de gerenciamento de informações (softwares p.ex.), que foram adquiridas e começaram a ser implantadas ainda no governo anterior, conforme noticiado à época pela imprensa, ao longo do ano de 2002.
Os servidores do Departamento de Polícia Federal, reais responsáveis pelos sucessos da instituição, queixam-se de salários defasados e da falta de melhores condições de trabalho.
O governo da república, ao mesmo tempo em que procura capitalizar politicamente o prestígio popular obtido pelo trabalho dos policiais federais, faz ouvidos moucos às reivindicações da categoria.
Não é justo!
Revista Consultor Jurídico