Semiologia e direito: uma construção da cidadania segundo a epistemologia de greimas

Marcelo Alves Pereira Eufrasio

Professor Universitário – FADIP/UVA
Advogado

RESUMO
O presente trabalho visa construir uma compreensão do sujeito epistêmico e seu discurso sociosemiótico como resultado das leituras em Algisrvas Julien Greimas, semioticista francês que investiga a análise de discurso e a semiótica, ou seja, a representação signica (signos, símbolos e ícones), como elementos presentes na construção das práticas discursivas, inclusive na formação dos direitos do cidadão e da cidadania.
Palavras-chave: epistemologia, sociosemiótica, direito do cidadão.

SEMIOLOGY AND RIGHTS: A CITIZENSHIP’S BUILD ACCORDING TO GREIMAS

ABSTRACT
This paper has objective of building an understanding of the epistemic subject and your discourse social semiotic as readings’ results in Algisrvas Julien Greimas, a french semioticist, he investigates the discourses’ analysis and the semiotic, like this the representation of visual images (signs, symbols, icons), present elements in the construction of discursive practices in the formation of the citizen’s rights and of citizenship.
Key-words: epistelogilogy, social semiotic, the citizen’s right.
Introdução

A construção do sujeito epistêmico e do seu discurso sociosemiótico remetem a questão da cidadania, pois tem seus alicerces no fato de que a melhor maneira que encontramos para estabelecer uma leitura entre o sujeito e seu discurso é na relação com o meio social e a suas necessidades intersubjetivas. Evidentemente que não se trata de estabelecer nenhuma análise profunda em epistemologia e nem tão pouco em semiótica, mas procurar estabelecer uma compreensão dos signos (interpretáveis) visíveis e às vezes até invisíveis que podem traduzir o acesso aos direitos do homem e do cidadão.
A semiótica greimasiana e o papel do sujeito epistêmico

A semiótica conceituada por A.J. Greimas (1) é a Ciência que estuda os problemas da significação ou sistemas de significação, ou ainda, o conjunto dos sistemas semióticos utilizados pelo homem. Diante das diversões representações sígnicas, enfocamos a questão da cidadania e de algumas relações imagéticas dos direitos do cidadão no mundo, demonstrando que o homem é um sujeito atuante dentro do discurso semiótico.
No entanto, essa relação não é unilateral ela se faz na dualidade ou na multilateralidade, quando o sujeito considera sua dimensão do eu com o outro, essa é a possibilidade de tornar o sujeito consciente do ato de compreender. Além do que, esse processo sofre uma continuidade, nunca está definido e acabado, mas está em mutação e construção. Nesse sentido, “O sujeito e o seu discurso são, semioticamente, objetos em constante evolução” (GREIMAS, 1986, p.169).
A constatação de que o sujeito epistêmico e seu discurso têm vários níveis de entendimento para compreender como o sentido é construído nas práticas discursivas, nos
leva a considerar os discursos filosófico, epistemológico, científico e pedagógico (2) como etapas de um longo trajeto do sujeito epistêmico e de seu discurso para uma dinâmica cognitiva, em que não se tem efetivamente nenhuma conclusão definitiva, mas no que melhor se traduz em “instâncias do ato cognitivo”.
Essa luta incessante por um “pensamento de produção do conhecimento” nas relações humanas e, mais especificamente nas relações que possam identificar os signos e sinais da
presença da cidadania no meio intersubjetivo do sujeito epistêmico e do seu discurso, remete necessariamente a seguinte distinção: “[…] o saber transmitido veicula ‘valores de conhecimento’. Haveria, assim associada à noção de objeto científico, a de valores diferenciais: valor filosófico, valor epistemológico, valor científico, valor pedagógico” (GREIMAS, p.167-169).
Por essa razão, reforçado na idéia de sociosemiótica ou semiótica discursiva, que tem
em Greimas seu principal precursor, fica evidente a necessidade de estabelecer um
diálogo com esses valores filosófico, epistemológico, científico e pedagógico para compreender a relação existente entre a linguagem e a sociedade, ou seja, a produção de sentidos entre o significante e o significado (3). Essa é a missão da representação da cidadania numa linguagem sociosemiótica.
Aspectos da sociosemiótica aplicada ao fenômeno da cidadania
De modo geral, é preciso analisar a operação de leitura do mundo social através do discurso sociosemiótico e do seu sujeito epistêmico nos leva a refletir sobre o papel do cidadão na formação e construção da cidadania.
Nesse sentido, a cidadania pode ser representada semioticamente falando por uma Carteira de Identidade (RG), por um Título de Eleitor ou por um Registro de Nascimento Civil, mas também por um emprego digno, por uma conta de água da minha residência ou pelo boletim escolar do meu filho. Esses signos nos dão indícios de que o homem em sociedade, vivendo em relações intersubjetivas com os outros e participação de um órgão regulador da sociedade chamado Estado. Podendo nestes termos, ser considerado um cidadão que exerce sua cidadania.
Porém, a cidadania efetiva é uma construção, não se trata apenas de uma condição predisposta pelo Estado Democrático de Direito regrado por leis e convenções é também necessariamente uma conquista de todos os dias, passo a passo sem operações milagrosas e
nem fórmulas prontas.
O texto abaixo ajuda a descobrir elementos imagéticos da luta pela cidadania, pois representa o discurso sociosemiótico e o sujeito epistêmico a maneira das necessidades históricas dos sem-teto ou sem-terra no Brasil.
Terra sem dono
povo no pano
gente de fome
sistema consome
dono em luta
atrás da disputa
com forte e mordaz
sem sorte e voraz.
É o povo da terra
que vive na serra
na busca do chão
pra fugir do sertão
pois a fome consome
este povo sem nome
que não quer trabalhar
no sistema à escravizar
sem um palmo de terra
que a morte encerra
o grito do pobre
da família nobre
atrás do sustento
do pão e do invento …
Protege o filho diante da queda
a mãe de consolo, em bala e pedra
que já sabe viver
no viver e no sofrer
na morte e na vida
na vida partida.
As cercas massacram
os pobres arrasam
este povo de fome
que a terra consome (4).

Em meio às cenas de violência que pesam contra a formação do cidadão, não há que destacar adjetivos para cidadania, cidadania dos excluídos, dos pobres, dos ricos, dos negros, dos nordestinos. Enfim essa conquista é universal e personalíssima, o papel de cada
indivíduo na sociedade é marcado por essa relação entre a participação e a conscientização.
E, quando a semiótica se propõe a trabalhar o discurso e o sujeito epistêmico está presente todos esses elementos discutidos à cima: terra, vida, morte, luta, fome, mãe, chão, sertão. Toda a terminologia traz em seu bojo uma significação, melhor ainda uma representação do signo de algo, talvez até uma cena que vimos ou vivemos.
A linguagem epistêmica dos valores filosófico, científico, epistemológico e pedagógico acaba instigando à experiência da conquista da cidadania, não apenas dos signos e ícones que disciplinam e regem a sociedade, como por exemplo, os documentos pessoais, mas o sentido da conscientização e da participação que pode ser revelada pelas experiências de linguagens que são necessariamente experiências de conhecimentos.
A valorização das práticas sociais e das práticas de significação na análise do discurso do sujeito epistêmico é de extrema importância, principalmente porque são nas práticas
discursivas que estão as estratégias para a construção de sentidos e, o sentido e a representação dos signos da cidadania não estariam excluídos desse processo de assimilação da linguagem verbal como fenômeno social, enquanto discurso.
Diante dessa constatação Chauí chega a afirmar que todas as percepções que temos, cores, seres espaciais e temporais se relacionam na nossa personalidade como vivências psicológicas individuais, mas também segundo o que afirmamos anteriormente, as leis, normas, “[…] princípios de estruturação e organização das coisas, que são as mesmas para todos os sujeitos […]. É com essa estruturação e organização que lida o sujeito. A vivência é singular (minha). O conhecimento é universal (nosso, de todos os humanos)” (1999, p.118).
A representação da noção de cidadania conquistada é avivada pelo poema A fome consome a terra, representação essa que denota como o sujeito epistêmico apresenta nos seus vários níveis de conhecimento as “instâncias do ato cognitivo”.
Esse processo, afirma Coquet é um conjunto de conceitos científicos num sentido interconceptual, em que o espírito científico é responsável pelo conjunto coerente de idéias. E esse conjunto de idéias é fruto da constatação de que o sujeito nos seus aspectos pessoal, coletivo, dialético e indutivo tem consciência desse ato de compreender.
Considerações finais
A descoberta da morte física é um nascimento para o mundo da consciência da cidadania, traduzido nas entrelinhas do poema: A Fome consome a terra, ou seja, processo epistêmico do sujeito, da ignorância da miséria para o despertar da luta pela cidadania.
A partir da ignorância nasce a luz, do abandono e da exploração surgem os conhecimentos: filosófico (ideologias), científico (descobertas), epistemológico (passado histórico-social) e pedagógico (formação e educação do homem), esses atos cognitivos fazem nascer à cidadania ativa pela conquista e pela participação.

Referências Bibliográficas

CHAUI, Marilena. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 1999.
COQUET, J-C. O sujeito epistêmico e seu discurso. In: GREIMAS, A.J. e LANDOWSKI, E. Análise do discurso em Ciências Sociais. São Paulo: Global, 1986, 157-170 pp.
BITTAR, Eduardo Carlos Bianca. Semiótica Jurídica: sentido e discurso do Direito. In.: _______. Curso de Filosofia do Direito. 2.ed., São Paulo: Atlas, 2002. p. 421-234.
SANTAELLA. Lúcia. Para se ler o mundo como linguagem. In.:______________. O que é
Semiótica. São Paulo: Brasiliense, 1983, 23-31 pp.

Notas
( ) A análise do discurso ou o que ficou convencionado chamar de semiótica discursiva ou sociosemiótica nasce nos anos 1960 com o semioticista francês Algirvas Julien Greimas para compreender a dimensão sensível da significação ou da semiose em ato. Com isso, temos em vista compreender como o sentido é construído nas praticas discursivas, tratando de estabelecer estratégias para a análise do devir do sentido e da mutação dos sentidos.

(2) No capítulo intitulado “O Sujeito Epistêmico e seu Discurso” de Coquet, disponível em Análise do discurso em Ciências Sociais de Greimas, Jean-Claude. Coquet distingue na análise científica os quatro discursos que foram retirados da obra clássica de Bachelard ‘O racionalismo aplicado’ que levam a formação de um diálogo entre uma semiótica discursiva e a formação continua dessas instâncias do ato cognitivo, que são: o discurso filosófico, epistemológico, científico e pedagógico.
(3) Greimas entende por ‘significante’ como sendo um dos dois componentes do signo (tudo aquilo que tem significado, um elemento do código, constituído dentre dessa relação significante-significado), o que pode veicular a informação por meio de suportes sonoros ou visíveis. E, ‘significado’ como sendo, um dos dois elementos que compõem o signo, no que constitui a informação veiculada, no plano do conteúdo em oposição ao plano da expressão.
(4) ‘A fome consome a terra’ é de nossa autoria e trata-se de uma leitura em linguagem conotativa do contexto histórico e social que envolve a concentração de terras no Brasil desde de 1530 e, que hoje é tratada como caso de polícia, reprimindo os excluídos da terra. Esse texto foi inspirado nas cenas retratadas pela imprensa durante a chacina de Eldorado dos Carajás-Pará em 17 de abril de 1996, quando foram mortos pela polícia dezenove sem-terra e 51 feridos.

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