Ajufe dialoga, mas rechaça ameaças corporativistas

por Jorge Maurique e José Carlos Garcia

A Ordem dos Advogados do Brasil ofereceu representação contra o Juiz Federal Substituto Itaboraí Vlamir Costa Magalhães perante o Conselho Nacional de Justiça, acusando-o de atos ilegais e abusivos na expedição de mandados de busca e apreensão em escritórios de advocacia. Proliferaram notas oficiais, editoriais e artigos firmados por advogados em jornais de grande circulação fazendo coro à tese de descalabros e atos ilegais e abusivos que estariam sendo praticados por juízes “particularmente os federais”.

Ainda pior: vêm tomando corpo incitações, feitas, muitas vezes, por dirigentes da OAB ou de entidades representativas dos advogados, para que estes resistam ao cumprimento de mandados pela Polícia Federal, caso eles mesmos, advogados, os entendam como genéricos ou abusivos.

Acreditamos que a OAB tem toda a legitimidade para defender as prerrogativas dos advogados daquilo que possam considerar atos ilegais, de qualquer natureza, inclusive judiciais. Mas não podemos silenciar quando a Ordem, de tão longa e bela trajetória nas lutas democráticas, pretende intimidar juízes, através de impugnações a decisões judiciais por via disciplinar, diretamente no Conselho Nacional de Justiça, em vez de servirem-se os eventuais prejudicados das inúmeras vias recursais disponíveis em nosso

sistema processual, e até mesmo suprimindo o que seriam as instâncias naturais competentes para apreciar pretensa falta disciplinar de magistrado federal.

Tanto que a decisão do Corregedor do CNJ, ministro Pádua Ribeiro, foi tomada neste exato e correto sentido: não conhecer de medida disciplinar contra conteúdo de decisão judicial, cuja contrariedade deve ser expressada através de recurso à instância superior competente, e remeter as alegações de violação de dever disciplinar do juiz à Corregedoria-geral da Justiça Federal na 2.ª Região, do Tribunal Regional Federal, com sede no Rio de Janeiro.

Aceitar outra conclusão seria o oposto exato do que dizem defender

as lideranças dos advogados: não preservar a dignidade da advocacia e o sigilo das relações profissionais do advogado com seu cliente, em homenagem ao princípio da ampla defesa, e sim intimidar juízes que, de forma fundamentada nos autos do processo, decidem pela realização de diligências, eventualmente em escritório de advocacia, ameaçando estes juízes com o risco da punição disciplinar.

Entretanto, é ainda mais grave a situação quando dirigentes da OAB incitam os advogados ao descumprimento de mandados judiciais, conclamando-os inclusive ao enfrentamento com os policiais federais que os cumprem. Os advogados são essenciais à administração da Justiça, é o que diz o texto constitucional, mas não estão investidos de jurisdição, não são juízes, e não podem propugnar o simples desacato à ordem judicial válida e em vigor.

Ao fazê-lo, as lideranças dos advogados estão patrocinando grave ilegalidade e afrontando a independência e a dignidade do Poder Judiciário; estão, ainda, generalizando sobre todos os juízes a pecha de autoritários, de abusivos, de praticantes de atos ilegais e espetaculosos; estão legitimando interpretação absurda de que se devem presumir ilegítimos e ilegais ordens judiciais válidas e vigentes, quando a ilegalidade de uma decisão judicial é exceção excepcionalíssima, e deve ser revista pelos próprios órgãos

judiciais competentes, sob pena de pretender-se legitimar aos advogados, e não aos demais cidadãos, uma autotutela ilimitada de seus direitos e prerrogativas que nenhuma autoridade pública ou cidadão tem no Brasil.

Trata-se, aqui, de harmonizar e equilibrar aspectos fundamentais de uma sociedade democrática: independência e autonomia do Judiciário, viabilidade e eficácia da investigação criminal, respeito ao direito de defesa e às prerrogativas da advocacia. Tema de tal forma delicado não combina com ataques diretos na mídia, campanhas de outdoor e televisão contra os juízes ou incitação ao descumprimento de ordens judiciais. Exigem maturidade e

responsabilidade, diálogo e transparência.

A Associação dos Juízes Federais do Brasil – AJUFE estará sempre aberta ao diálogo fraterno e às polêmicas francas e sinceras, mas rechaçará com veemência as iniciativas corporativistas que não meçam responsavelmente suas implicações institucionais.

Por isso mesmo a AJUFE realizou no último dia 07 de julho Ato Público em Defesa da Independência do Poder Judiciário, no Auditório do Fórum da Justiça Federal na Avenida Rio Branco, no Centro do Rio, quando se posicionou pela vedação de ataques a atos jurisdicionais pela via correicional e pelo reconhecimento do caráter subsidiário do poder correicional do Conselho Nacional de Justiça, sob pena tanto de solapar os atuais mecanismos de controle quanto de inviabilizar o funcionamento desse relevante órgão.

Revista Consultor Jurídico

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