Assistindo de camarote

“Evidente que a corrupção no Brasil não está estabelecida em um partido somente, pois, nesse caso, seria fácil extirpá-lo da sociedade…”

Estou embriagado. Embriagado de notícias sobre corrupção e o mar de lama que atinge as autoridades de nosso país. Nos jornais, parece que todos viraram inquisidores da “Santa inquisição da moralidade”, culpando da esquerda à direita, de estarem chafurdados no mar da podridão.

Cansei! Procurei um livro para ler. À noite, terminava de ler “Mês de Cães Danados” do Moacyr Scliar, enquanto via o noticiário da meia-noite, martelando os escândalos e denúncias de corrupção que envergonham a nação. Ao mudar o canal, no “Programa do Jô” o tema central era política e acusações de que este ou aquele parlamentar “passa a mão” no dinheiro do povo.

Passo a recordar a história de Scliar, que narra a vida de um gaúcho, desde a infância, seus costumes da fronteira, a família rica e caudilha, terminando seus dias como um mendigo na grande Porto Alegre.

O gaúcho, na história, narra o movimento “pela legalidade”, que aos gritos de Brizola, encastelado no Palácio Piratini, lutou pela posse do seu cunhado Jango na presidência, após a renúncia de Jânio Quadros.

Mas o livro não é sobre política? Qual é a razão, então, de me queixar da programação da TV, que só fala de política? Na realidade, estou de ressaca com tantas notícias sobre corrupção, com escândalos noticiados de manhã, à tarde e à noite (só falta o escândalo da madrugada)

E amigos me perguntam, me ligam, questionando qual a razão dos artigos que escrevo no Correio do Estado, “blindarem” (palavra da moda) o PT e seus militantes. Uns dizem, e até ironizam: “Maidana, é prá acabar!”. Outros, mais debochados, fazem gracejos, dizendo que “na certa sou vítima” dos demagogos do PT – querendo adivinhar meu voto.

Não! Não estou “blindando” ninguém. Assim como o personagem “Mário Picucha” de Scliar, estou analisando os fatos e vendo que muitos levados pelo calor das emoções, estão transformando uma parte num todo. Os petistas estão virando mendigos da moralidade, independentemente de quem seja.

Mas não podemos misturar uma parte com o todo e afirmar que todos os petistas são corruptos, numa radicalização sem limites. Confesso que já votei no PT, como vários brasileiros que acreditaram nas promessas de um Brasil melhor. Confesso, mais uma vez, que não sou filiado a nenhum partido e que, num país onde as legendas são frágeis, geralmente votamos no “candidato” e não no partido.

Evidente que a corrupção no Brasil não está estabelecida em um partido somente, pois, nesse caso, seria fácil extirpá-lo da sociedade. Existe gente boa no PT, como existe gente boa em outros partidos. Homens honestos, patriotas, preocupados com a coisa pública, ao contrário de outros que são obcecados pelo poder.

E o fato de somente alguns dirigentes do PT terem sido expostos na mídia, e aberto sua “vida pregressa” de negócios escusos, outros tantos políticos, que se dizem paladinos da moralidade, não suportariam uma simples confrontação entre seu patrimônio com a renda. Em razão do passado de “inquisidor da moral pública”, o PT hoje leva as pauladas e, pelo “centralismo democrático” que rege o partido, a demora nas respostas está levando o partido para o “fundo do poço”.

E não foi por falta de alerta, não foi por falta de conselhos da “ala boa do partido” que todo o “mar de lama” começou a submergir. Se militantes que não tinham sequer onde morar, andavam de ônibus ou bicicleta, hoje, em pouco tempo, com parcos salários que recebem em cargos comissionados, são proprietários de carros importados, palacetes e chácaras, alguma coisa está errada.

A defesa fica difícil, quando se tem notícia de que antes de chegar ao poder, “companheiro” só tomava “cachaça” e hoje recusa qualquer bebida que não seja uísque de 18 anos. As mordomias dominaram o ego dos “companheiros”, que se aborrecem quando alguém critica a “vida suntuosa” que levam, respondendo com voz ríspida “que não fizeram voto de pobreza”.

Não, companheiro! Ninguém estava pedindo para virar mendigo igual ao personagem de Scliar. Apenas estávamos supondo que um dia “alguém divulgaria” as mordomias e, então, o discurso de “lutar pelos excluídos” seria de palavras vazias.

No entanto, aqueles que aconselhavam os “companheiros” do perigo do luxo e das mordomias sofreram a exclusão, a indiferença, a distância, enquanto os “novos aliados” e os oportunistas de plantão foram recebidos de braços abertos.

E hoje, depois que o “inverno de cães danados” passar, não sei o que restará do PT para a história, mas, com certeza, o Brasil terá outra cara. E eu? Estou só assistindo de camarote.

Sergio Maidana
Advogado em Campo Grande-MS (sergiomaidana@ig.com.br)

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