O dono da ética

Estou me sentindo afrontado. As palavras do nosso presidente Lula, dizendo não existir ninguém no País mais ético do que ele, me deixaram contrariado. Imaginei, ao caminhar pelo fórum da nossa cidade, os magistrados, que levam uma vida espartana, na reclusão de seu trabalho, procurando distribuir Justiça, também se sentindo afrontados.

Imaginei os promotores de Justiça, que perseguem a Lei e a ordem, e os delegados de polícia, pessoas que correm atrás de bandidos, que arriscam a vida para tentar equilibrar uma tranquilidade social. Como estariam se sentindo com as palavras do presidente?

Ao sair à rua, vi um policial fazendo sua ronda, prestando seus serviços à nação, prendendo traficantes e bandidos que muitas vezes lhe oferecem “propinas” e dinheiro sujo, mas prefere viver com seus parcos rendimentos, numa vida modesta e honesta. Como estaria se sentindo com as palavras do presidente?

Passo em frente à padaria, onde seu proprietário levanta-se de madrugada para abrir a empresa, paga seus tributos em dia, os salários aos seus empregados e as duplicatas a seus fornecedores. O que estaria pensando o padeiro?

Nas fábricas, nas lojas, nas ruas e nas repartições públicas, todos os brasileiros se sentem afrontados, sabendo que ninguém é tão ético como o nosso presidente Lula, que nos jogou em uma vala comum. Pensei em minha mãe, que a vida inteira procurou pagar suas contas em dia e que prefere o sacrifício a pedir dinheiro emprestado a alguém, mesmo que seja para um banco. Minha mãe também é uma imoral, Sr. Presidente?

Realmente o nosso presidente pecou nas palavras, como vem pecando sistematicamente com suas frases de efeito, sem medir as consequências do cargo que ocupa. Alega o Sr. Presidente que seu pai e sua mãe eram analfabetos e por isso ensinaram-lhe a ser um homem honrado, e que “a elite brasileira” quer retirá-lo do cargo. Pergunto: qual elite, Sr. Presidente?

Quando morava em Miranda, existiam dois clubes, um da “sociedade” (o da “elite” para o presidente), e outro dos “ferroviários” (que era do “povão”), sendo os dois frequentados por nossa família. Eu sou elite, Sr. Presidente?

Ao passar dos anos, e da luta dos brasileiros para sobreviver, tenho notícias de que nenhum clube social em Miranda está aberto. A elite se infiltrou no povão, Sr. Presidente?

Onde está a elite, Sr. Presidente? Ela existe? Mas a Receita Federal não está todo dia multando e prendendo empresários por sonegação? Que elite pobre é esta, Sr. Presidente? Às vezes chego a pensar que o Sr. nunca conheceu realmente o Brasil que administra, mas somente os bacanas dos jardins paulistanos, e iguala uma centena de high-net-worth individuals – HNWI (indivíduos de alto patrimônio líquido) com a grande maioria dos brasileiros que pagam 27,5% de Imposto de Renda e que, no ano seguinte, além dos valores retidos, pagam milhares de reais ao fisco e vivem devendo no “cheque-especial” (pagam mais imposto de renda, do que os 16 mil reais que o publicitário Marcos Valério pagou este ano).

O que está ocorrendo, meu “companheiro” presidente? Qual a razão de tamanha indignação com o povo brasileiro? Agora todos aqueles que estão contrariados com o seu silêncio catatônico sobre o Caixa 2 do PT, dinheiro não contabilizado, gastos supérfluos, são imorais em questionarem o “homem público”?

Nós só queríamos, Sr. Presidente, que “Vossa Excelência” falasse claramente que não tem nada a ver com o dinheiro que saiu das empresas de Marcos Valério, tampouco recebeu algum dinheiro suspeito do ex-tesoureiro Delúbio, ou que sabia de assessores recebendo presentes para “arrumar” contratos públicos, e que o Sr. nada tem a ver com esta bandalheira.

Mas o Sr. se cala. O Sr. só abre a boca para criticar “a elite”, que não sei qual é. A elite bancária não pode ser, haja vista que seu Governo é recordista mundial de “juro real”, taxando-os hoje em 14, 1% (descontando a inflação), bem na frente da Hungria, a segunda colocada, com a taxa de 5,1%.

Qual elite, Sr. Presidente, que está querendo “ derrubá-lo” do Governo?! A elite política também não pode ser, eis que tem a maioria no Congresso e fez reformas impopulares que sequer seus opositores de “direita” conseguiram na história da República. Esta mesma elite, Sr. Presidente, está todos os dias na CPI arrumando desculpas para as ilegalidades cometidas, passando ridículo com desculpas esfarrapadas. Mas o Sr., Presidente Lula, continua insistindo em ver fantasmas no meio da noite que atravessa, mesmo que eles não existam (ou existem?).

Só peço, Sr. Presidente, que ao menos respeite os brasileiros honestos e éticos que conheço. Por favor, não seja arrogante. Seu mandato é até dezembro do ano que vem, mas não está acima da Lei e, se errou, será punido conforme merecer.

Sergio Maidana
Advogado em C. Grande (sergiomaidana@ig.com.br)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.


Você está prestes a ser direcionado à página
Deseja realmente prosseguir?
Atendimento