O conhecimento do Direito

Marco Aurélio Lustosa Caminha
procurador do Trabalho da 22ª Região, professor efetivo de Direito na Universidade Federal do Piauí, mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, doutor em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidad del Museo Social Argentino (Buenos Aires, Argentina)

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RESUMO

Esta monografia é dedicada à realização de abordagens sobre o conhecimento em geral e o conhecimento específico do Direito, visando a proporcionar ao leitor ao menos as noções elementares para que possa se orientar rumo a uma compreensão mais ampla sobre o modo como se forma o conhecimento de sua matéria de trabalho.

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SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO ; 2 CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONHECIMENTO EM GERAL E O CONHECIMENTO JURÍDICO, 2.1 Sobre a possibilidade do conhecimento, 2.1.1 O dogmatismo no Direito, 2.1.2 O ceticismo no Direito, 2.1.3 O relativismo, 2.2 Concepções a respeito do processo de elaboração do conhecimento, 2.3 O permanente questionamento sobre a viabilidade de se submeter o Direito a um conhecimento científico, 2.4 Graus do conhecimento; 3 DISCIPLINAS QUE ESTUDAM O FENÔMENO JURÍDICO, 3.1 Considerações prévias, 3.2 Relação de Disciplinas “propriamente jurídicas”, 3.2.1 Teoria Geral do Direito, 3.2.2 Ciência do Direito, 3.2.3 Dogmática Jurídica, 3.2.4 Teoria do Direito, 3.2.5 Introdução ao Direito, 3.3 Relação de disciplinas “não-propriamente jurídicas”, 3.3.1 Filosofia do Direito, 3.3.2 História do Direito, 3.3.3 Sociologia do Direito , 3.3.4 Psicologia Jurídica, 3.3.5 Direito Comparado, 3.3.6 Lógica Jurídica, 3.3.7 Cibernética Jurídica.. , 3.3.8 Política Jurídica, 4 CONCLUSÃO; 5 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA.

1 INTRODUÇÃO

São muitas as disciplinas que tratam do Direito em suas diversas manifestações, cada uma produzindo um conhecimento particular. Todavia, a maior parte dos profissionais que lidam com o Direito – e aqui se incluem quase todos os que com este atuam na prática – não sabe o motivo da existência de tantas disciplinas estudando a sua própria matéria de trabalho, não sabe distinguir quais dessas disciplinas constituem ciência ou dizer dos critérios que servem para qualificá-las – ou não – com esse “título honorífico”. Muito pouco sabem, os práticos do Direito, também, sobre o processo de formação do conhecimento e outras questões afins, necessários para uma adequada compreensão do assunto em referência.

Por isso, esta monografia é dedicada à realização de abordagens sobre o conhecimento em geral e o conhecimento específico do Direito, visando a proporcionar ao leitor ao menos as noções elementares para que possa se orientar rumo a uma compreensão mais ampla sobre o modo como se forma o conhecimento a respeito de sua matéria de trabalho.

O núcleo da monografia é composto de duas partes que se complementam. Uma dessas partes, consubstanciada no item “2”, contém uma incursão na teoria do conhecimento (1), incluindo o debate histórico sobre a viabilidade de se alcançar o conhecimento científico do Direito. A outra parte (nuclear) da monografia, constante do item “3”, principia-se com o desenvolvimento de possíveis explicações para o problema da diversidade de disciplinas estudando o Direito, e com referência a critérios para qualificar cada disciplina – como científica ou não-científica (subitem “3.1”); e é encerrada com uma menção a várias dentre as disciplinas que estudam o Direito e com a indicação do objeto de estudo de cada uma (subitens “3.2” e “3.3” e respectivas subdivisões).

No item “4” da monografia consta uma conclusão, que consiste numa síntese das observações principais da parte nuclear.

2 CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONHECIMENTO EM GERAL E O CONHECIMENTO JURÍDICO

Os números “2.1” a “2.4”, a seguir, embora sejam breves, contêm os temas principais da teoria do conhecimento em geral e especificamente sobre do conhecimento jurídico.

2.1 Sobre a possibilidade do conhecimento

Duas correntes de pensamento se destacam no debate sobre a possibilidade do conhecimento: o dogmatismo e o ceticismo (Reale, 1998, p. 158). Mas se impõe a menção a uma terceira vertente, o relativismo, que consiste em um dogmatismo parcial, que muitos autores confundem com o ceticismo, conforme se verá adiante.

Dogmatismo é o pensamento atribuído à “(…) corrente que se julga em condições de afirmar a possibilidade de conhecer verdades universais quanto ao ser, à existência e à conduta, transcendendo o campo das puras relações fenomenais e sem limites impostos a priori à razão” (Reale, op. cit., p. 158-159).

O dogmatismo pode ser total ou parcial. É total o dogmatismo quando a afirmação da possibilidade de se alcançar a verdade última é feita tanto no plano da especulação, quanto no da vida prática ou da Ética, inexistindo barreiras intransponíveis ao conhecimento humano. O dogmatismo total crê na livre possibilidade de acesso à realidade em si, sem quaisquer dúvidas quanto à rigorosa adequação entre o pensamento e a realidade. O dogmatismo parcial acredita na possibilidade de atingir-se o absoluto em dadas circunstâncias e modos quando não sob certo prisma (Reale, 1998, p. 158).

O dogmatismo total pode ser encontrado em Hegel, para quem o pensamento tem absoluta identidade com a realidade. O dogmatismo parcial apresenta duas vertentes: o dogmatismo teorético, que concentra autores que se julgam aptos a afirmar a verdade absoluta no plano da ação; e o dogmatismo ético, reunindo autores que somente admitem tais verdades no plano puramente especulativo. David Hume e Kant são exemplos de autores que estão na primeira vertente. David Hume duvidava da possibilidade de atingir as verdades últimas enquanto no plano teórico, mas afirmava as razões primordiais de agir, estabelecendo as bases de sua Ética ou de sua Moral. Kant também achava impossível o conhecimento absoluto, porém, no plano da ética ele era dogmático, sustentando que o homem, na vida prática, deve obedecer a imperativos categóricos, que não se revelam à razão teórica, mas à vontade pura, descortinando-lhe o mundo noumental (Reale, 1998, p. 159-160).

É possível ser dogmático em um sentido e relativista (dogmático parcial) em outro, como é o caso de Pascal, que não duvidava de seus cálculos matemáticos e da exatidão das ciências enquanto ciências, mas tinha dúvidas sobre a possibilidade do conhecimento absoluto no plano do agir ou da conduta humana (Reale, op. cit. p. 160).

O ceticismo “implica uma constante atitude dubidativa ou em todos os graus e formas de conhecimento, convertendo a ‘incerteza’ em característico essencial dos enunciados da Ciência como da Filosofia” (Reale, 1998, p. 162). A Filosofia Cética ou Escola Cética provém de Pírron de Elis. Este filósofo viveu na Grécia no tempo de Alexandre Magno e o acompanhou em sua expedição ao Oriente, tendo morrido por volta de 270 a.C. Tornou-se conhecida como Pirronismo a forma extrema do ceticismo grego de Pírron, que consistia na pregação da necessidade de suspender o assentimento. Considerando que para o homem as coisas são inapreensíveis, a única atitude legítima é a de não julgá-las verdadeiras ou falsas, nem belas ou feias, nem boas ou ruins etc. (Abagnano, 2000, p. 764).

Assim como o dogmatismo, o ceticismo se manifesta de forma parcial ou total. O ceticismo total ou radical – ou Pirronismo, como visto – costuma ser repudiado. Céticos parciais correspondem àqueles que são céticos quanto a alguns problemas da realidade ou da vida, ao mesmo tempo em que são dogmáticos em relação a outros problemas, como é o caso de Pascal, já mencionado, a quem se atribui um ceticismo ético ao mesmo tempo em que se diz dele tratar-se de um dogmático quanto à sua matemática e em relação às ciências, enquanto tais (Reale, 1998, p. 163-164).

Resta ainda dar a noção de relativismo. Este, conforme afirmado anteriormente, é uma manifestação do dogmatismo, porém, um dogmatismo parcial. Reale condena a atitude de muitos autores que consideram as doutrinas relativistas (entre elas, por exemplo, o criticismo de Kant e o positivismo de Augusto Comte) como uma expressão do ceticismo, pois “(…) o ceticismo nunca abandona a atitude dubidativa do espírito, mesmo quando enuncia juízos de natureza científica (…) e o relativismo baliza o conhecimento humano, excluindo de suas possibilidades a esfera do absoluto, mas daí não resulta que o relativismo possa ser considerado cético. Os relativistas declaram que se conhece parcialmente, mas sustentam a certeza objetiva do pouco que se conhece, até que se não prove a sua invalidade” (Reale, 1998, p. 162).

Dada a noção básica acerca do dogmatismo, do ceticismo e do relativismo, passa-se, nos três tópicos seguintes, a tratar dessas doutrinas especificamente com relação ao conhecimento do Direito.

2.1.1 O dogmatismo no Direito

Como visto, grosso modo, o dogmatismo afirma a possibilidade de atingir-se a verdade com certeza e sem limites a priori (Reale, 1998, p. 162). No Direito, o dogmatismo se revela, principalmente, por meio das doutrinas do Direito Natural e do Direito Positivo. Reale (1998, p. 161) aponta como exemplos, embora parciais, de dogmáticos no Direito “os ‘construtores de sistemas racionais de Direito’, tão em voga na época do Iluminismo(…)”, assim como “os contratualistas de vários matizes, ou (…) os juristas que pretenderam plasmar o Direito Positivo mediante o encadeamento formal de raciocínios inicialmente assentes em verdades evidentes ou reveladas” e, ainda, “(…) a concepção tomista do Direito Natural, (…) ao subordinar o Direito ao justo(…)”.

Os dois extremos do dogmatismo jurídico estão representados nas teorias de Hegel e Kant. Na teoria hegeliana, “a posição dogmática atinge sua expressão máxima, superando o dualismo entre Direito Natural e Direito Positivo, pois no processo dialético em que o real e o pensamento se identificam, não há que falar em dever ser ou em valores jurídicos, porque tudo se resolve na realidade jurídica como expressão do espírito objetivo”. Por sua vez, para Kant, é rígida a distinção entre o mundo da realidade e o dos valores (Reale, 1998, p. 162). Atribui-se aos filósofos do Direito contemporâneos a renovação de algumas teses fundamentais do hegelismo, assumindo características de uma terceira solução – a da polaridade ser-dever-ser –, que constitui um meio-termo entre a identificação hegeliana daquilo que é com o que deve ser e a rígida distinção formal Kantiana entre o mundo da realidade e o dos valores (ibid.).

2.1.2 O ceticismo no Direito

Ao longo da história, sempre existiu quem negasse a possibilidade de se encontrar fundamentos para o Direito, alegando que este não tem qualquer fundamento intrínseco e exprime apenas autoridade e força. Em Roma, o embaixador da Grécia Carnéades de Cirene teria gerado perturbação com sua dialética, ao sustentar que o critério do justo não se funda na natureza. O mesmo pensamento foi formulado pelos modernos céticos franceses dos séculos XVI e XVII, como Montaigne e Pascal. De Montaigne, é expressiva a seguinte indagação: “que bondade será essa, que da banda de lá do rio é delito (?)”; e de Pascal, estas ‘constatações’: “mudando o clima, muda a justiça. Três graus de elevação no pólo derrubam a jurisprudência. Um meridiano decide da verdade… Divertida justiça que um rio limita! Verdade aquém dos Pirineus, erro além” (Vecchio, 1979, p. 333; Gusmão, 1985, p. 68).

O ceticismo no Direito tem se manifestado quando se discute sobre a possibilidade de determinar-se o valor da justiça de maneira universal, ou sobre a viabilidade de um conhecimento do fenômeno jurídico dotado de certeza e de natureza científica. Duvida-se “(…)da objetividade do justo, quer em virtude dos critérios mutáveis que a História do Direito nos revela, quer pela não menos desconcertante variedade do sentimento jurídico, ou pelo conflito entre a justiça e os demais valores” (Reale, 1998, p. 164-165).

2.1.3 O relativismo

Adotada a orientação de Reale (1998), de não confundir o dogmatismo parcial como uma manifestação do ceticismo, tem-se que concluir que o relativismo consiste na posição daqueles que crêem na viabilidade de se alcançar um conhecimento do fenômeno jurídico que, mesmo sendo parcial, é estreme de dúvidas (op. cit., p. 165).

O relativismo, historicamente, tem-se apresentado sob várias formas. Destacam-se o relativismo criticista e o relativismo positivista. O relativismo criticista, ou “kantismo”, é a doutrina originária de Kant, segundo a qual o homem não pode conhecer senão fenômenos, considerando-se fenômeno aquilo que é suscetível da experiência. Kant subordina o conhecimento do objeto a algo que preexiste logicamente em nosso espírito, às formas a priori da sensibilidade e às categorias do intelecto. O relativismo positivista, ou “comtismo”, teve início com Augusto Comte e, como o “kantismo”, exclui o absoluto da possibilidade de conhecer, contrapondo-se à metafísica tradicional. Ambos partem, porém, de pressupostos diversos, pois, ao contrário de Kant, Comte não admite qualquer subjetividade a priori, estabelecendo uma correlação progressiva entre o processar-se dos fenômenos e o pensamento que no real encontra a fonte de seu desenvolvimento (Reale, 1998, p. 165-167).

Segundo Reale, mais doutrinas poderiam ser inseridas entre os relativistas, como, por exemplo, o convencionalismo gnoseológico, o pragmatismo e muitas outras. Segundo o convencionalismo gnoseológico, há algo de convencional no saber científico, na medida em que sempre existe uma preocupação de adaptar as respostas a certas conveniências ditadas pelo êxito, pela segurança etc. Assim, por exemplo, o pensamento de Hans Vaihinger, sustentando o caráter puramente ficcionalista de todo conhecimento: afirmamos algo como se houvesse certeza, por sua utilidade biológica. Por sua vez, o pragmatismo sustenta que devemos resolver o problema do conhecimento e do alcance do conhecimento reconhecendo que a teoria se insere ou se integra como momento da “ação” ou da vida prática, a tal ponto que os “elementos formais” da Lógica são “formas de dada matéria” (op. cit., p. 168-169).

2.2 Concepções a respeito do processo de elaboração do conhecimento

Na discussão do problema atinente ao processo de elaboração do conhecimento, destacam-se três correntes: o empirismo e o racionalismo, que têm debatido entre si ao longo da história; e a moderna dialética, que parece superar os questionamentos das duas outras.

O empirismo, cuja forma mais radical e mais moderada são representadas, respectivamente, pelo positivismo de Augusto Comte e pelo empirismo lógico ou neopositivismo do Círculo de Viena, tem como principal característica a suposição de que o conhecimento nasce do objeto. No empirismo, o vetor do conhecimento parte do real para o racional (não é a razão que toma a iniciativa), o conhecimento flui do objeto, refere-se especificamente a ele e só tem validade quando comprovável empiricamente. É o conhecimento, para o empirismo, uma descrição do objeto, que é tanto mais exata quanto melhor apontar as características reais deste. O papel do sujeito seria semelhante ao de uma câmara fotográfica, ou seja, registrar e descrever o objeto tal como ele é. Enfim, a preocupação fundamental do empirismo, em qualquer de suas correntes, consiste em reduzir todo o conteúdo do conhecimento a determinações observáveis (Marques Neto, 2001, p. 3).

Por sua vez, para o racionalismo, o vetor epistemológico vai do racional para o real (a razão é que toma a iniciativa), constituindo o objeto real mero ponto de referência, quando não é praticamente ignorado, como ocorre na forma extrema do racionalismo, que é o idealismo (2). Para o idealista, o conhecimento nasce e se esgota no sujeito, como idéia pura… Não se conhecem as coisas, mas sim representações de coisas ou as coisas enquanto representadas (…), o que não implica necessariamente numa negação do real, mas na concepção de que é impossível conhecer as coisas tal como elas são em si mesmas. Uma forma moderada de racionalismo é representada pelo denominado intelectualismo, que atribui à razão o papel de conferir validade lógico-universal ao conhecimento, embora sustente que este não pode ser concebido sem a experiência. O fundamento do ato de conhecer, segundo o racionalismo, está no sujeito… “O pensamento opera com idéias, e não com coisas concretas. O objeto do conhecimento é uma idéia construída pela razão” (Marques Neto, op. cit., p. 6).

A moderna dialética parte de uma crítica ao empirismo e ao racionalismo, atacando os pressupostos fundamentais tanto de uma como de outra corrente, sobretudo nas suas formas extremas, representadas pelo positivismo e pelo idealismo. As epistemologias dialéticas tratam sob um enfoque novo o problema da relação entre o sujeito e o objeto: discordam quer da concepção metafísica empirista como idealista, que separam o sujeito cognoscente do objeto real que é conhecido… O que importa é a própria relação concreta que efetivamente ocorre dentro do processo histórico do ato de conhecer (Marques Neto, 2001, p. 13-14). São exemplos de epistemologias dialéticas o materialismo histórico, a epistemologia genética, a epistemologia histórica e a epistemologia crítica, das quais não há espaço para comentários neste trabalho monográfico, pelo seu alcance restrito.

As epistemologias dialéticas distinguem o objeto real do objeto de conhecimento aquele é coisa existente independente do pensamento, seja em si mesma considerada, seja através de suas manifestações concretas; por sua vez, o objeto do conhecimento vem a ser o objeto tal como é conhecido, um objeto construído, sobre o qual se estabelecem os processos cognitivos (filosóficos, científicos, artísticos etc.). Dessa maneira, o ato de conhecer equivale a um ato de reconstruir, de aprimorar os conhecimentos anteriores. O conhecimento é, assim, na epistemologia contemporânea, um processo de retificação de verdades estabelecidas. O sujeito não vai “em branco” observar o objeto, ele leva consigo todo um conhecimento já acumulado historicamente e tenta superá-lo para construir conhecimentos novos (Marques Neto, op. cit., p. 14).

2.3 O permanente questionamento sobre a viabilidade de se submeter o Direito a um conhecimento científico

Entre os que estudam o Direito, os adeptos do ceticismo científico-jurídico acreditam que é inviável um conhecimento sistemático do Direito e que, por isso, a ciência do Direito (3) não é uma ciência. O argumento dessa corrente é o de que o Direito, que é o objeto de estudo dessa “ciência”, se modifica no tempo e no espaço, de modo a impedir o jurista de alcançar exatidão na construção científica, no que difere do naturalista, que “(…) tem diante de si um objeto permanente ou invariável, que permite fazer longas locubrações, verificações, experiências e corrigir erros que, porventura, tiver cometido” (Diniz, 2001, p. 32-33).

Mas, para a maioria dos autores, o Direito é suscetível de conhecimento científico, conforme Diniz (2001) e Ferraz Júnior (1977). Segundo este último autor, “(…) se percorrermos os tratados de Direito Civil, Direito Comercial, Direito Penal e outros, podemos assinalar duas preocupações que revelam um aparente comum acordo sobre a existência de uma ciência do Direito, nas suas diversas ramificações, e sobre sua especificidade: 1ª) definir cada um destes ramos como partes de uma ‘ciência unitária do Direito’; e 2ª) distinguir a ‘ciência do Direito’, propriamente dita, de outras com as quais mantém relações, em geral, de subsidiariedade, p. ex., ciência do Direito Penal e Criminologia; Psicologia Forense, Sociologia Criminal. Fala-se da Ciência Dogmática do Direito, para distingui-la da Psicologia, História e outras” (op. cit., p. 13).

2.4 Graus do conhecimento

Do ponto de vista lógico (4), o conhecimento humano em geral pode ser vulgar, científico e filosófico (Torré, 1997, p. 35-36).

O conhecimento ou saber vulgar de um objeto, também conhecido como conhecimento pré-científico, ingênuo ou imperfeito, é o conhecimento que tem uma pessoa sem preparação especial para tanto e que deriva da própria experiência da vida. Estão nessa classe todos aqueles conhecimentos revelados pelos sentidos, ainda que com uma dose mínima de raciocínio, como é o caso do conhecimento vulgar desenvolvido pelos homens da cidade, impregnado de noções científicas ou pseudo-científicas assimiladas insensivelmente. O conhecimento vulgar tem como características principais o fato de ser incerto, superficial e desordenado: incerto, porque, mesmo sendo verdadeiro, não se conhece com certeza; é superficial porque somente se lhe conhece a partir dos efeitos; e é desordenado por não ser metódico, que facilmente conduz a conclusões distorcidas (Torré, 1997, p. 35-36).

O conhecimento científico é o conhecimento que se caracteriza por ser certo, explicado e fundamentado, sistemático e de sentido limitado: certo, no sentido de certeza objetiva, ou seja, de poder ser constatada por todos, de buscar a realidade tal qual ela é e não como ela se reflete em nossos sentidos; explicado e fundamentado, porque a ciência nos dá uma explicação satisfatória da realidade material e espiritual, fundamentada em rigorosas comprovações; sistemático, uma vez que, por mais provado e justificado que esteja, o conhecimento não é ciência se não estiver organizado metodicamente, se não estiver sistematizado; e de sentido limitado, tendo em vista que as ciências, embora às vezes considerem determinados setores do universo que às vezes são muito amplos, elas, contudo, não ultrapassam um certo setor ou região, que constitui o objeto de cada uma, posto que, se o fizesse, adentraria no objeto de outra disciplina (Torré, op. cit., p. 37-39).

O conhecimento ou saber filosófico é um tipo de conhecimento que não pressupõe outros conceitos, ou seja, que dispensa pressupostos, dedicando, aliás, grande parte de seu esforço à dilucidação dos pressupostos científicos. Também se distingue o conhecimento filosófico por caracterizar a totalidade dos objetos, naquilo que eles têm de essencial, de modo que qualquer matéria pode ser objeto de reflexão filosófica (Torré, 1997, p. 39).

No campo jurídico, a noção do conhecimento vulgar e do conhecimento científico, e a diferença entre ambos, podem ser mais bem transmitidas através de exemplos práticos. Uma pessoa qualquer, pelo fato de ter celebrado um contrato de locação, por certo sabe como se realiza esse contrato, que cláusulas ele contém etc., o que caracteriza um conhecimento apenas vulgar do assunto (contrato). Mas, se essa mesma ou qualquer outra pessoa estudar o regime jurídico do referido contrato nas leis do local da celebração, ou com base na jurisprudência etc., ou mesmo se vier a cuidar da análise dos elementos permanentes e essenciais daquele contrato, já estará fazendo Ciência do Direito.

Destarte, “(…) o enfoque científico da realidade jurídica é o que dá origem às Ciências Jurídicas, as quais, por serem várias, a encaram a partir de distintos pontos de vista” (Torré, 1997, p. 40).

Quanto à distinção entre o conhecimento científico e o filosófico no campo jurídico, bem assim a noção deste, pode-se afirmar que as ciências jurídicas são as que fornecem como pressupostos uma série de conceitos, como a noção do Direito, da justiça etc. Por sua vez, o pensamento filosófico trata de problematizar e estudar intensivamente os mencionados pressupostos dados pelas ciências jurídicas, implicando essa atividade na análise dos próprios fundamentos sobre os quais repousam as ciências jurídicas. Em suma, o conjunto dos problemas essenciais e mais profundos que se referem ao Direito é que dá origem à Filosofia do Direito (Torré, 1997, p. 40).

3 DISCIPLINAS QUE ESTUDAM O FENÔMENO JURÍDICO

Doravante, faz-se uma relação das principais disciplinas que lidam com o Direito, indicando-se seus respectivos objetos de estudo. Antes, porém, um subitem é desenvolvido com base na teoria apresentada na parte anterior desta monografia, visando especificamente a apontar a possível causa para que haja tantas disciplinas estudando o fenômeno jurídico e, ainda, a fornecer elementos que permitam ao leitor formar seu próprio juízo a respeito da natureza daquelas disciplinas e sobre o tipo de conhecimento que elas realizam. Esta última matéria consta do subitem “3.1”, a seguir, intitulado “Considerações prévias”; e a relação de disciplinas com as informações a respeito de cada uma está dividida em dois subitens: o subitem “3.2”, intitulado de “Relação de disciplinas propriamente Jurídicas” e o subitem “3.3”, sob o título “Relação de Disciplinas não-propriamente jurídicas”.

3.1 Considerações prévias

Um assunto que muito intriga os que lidam com o Direito, principalmente os que atuam mais na prática do que na teoria, é o fato de existirem várias “ciências” estudando ao mesmo tempo inúmeros temas de seu único objeto de trabalho, ou seja, o Direito. Como explicar que assuntos jurídicos como a norma jurídica, a justiça e o dever jurídico sejam tratados simultaneamente, e em profundidade, em livros de Teoria Geral do Direito, de Teoria do Direito e de Filosofia do Direito?

Para melhor solucionar essa questão, convém formular e responder outras duas indagações: Seriam as denominações daquelas e de outras disciplinas jurídicas apenas expressões sinônimas de uma mesma ciência? Todas elas elaboram conhecimento científico ou produzem conhecimentos de diferentes graus?

A resposta à primeira das duas indagações supra, pelo menos a teor da maioria dos autores, é não, as várias disciplinas jurídicas não praticam uma mesma “ciência”. O que dá causa ao surgimento de diferentes disciplinas jurídicas é o fato de que parece ser impossível formar-se um consenso sobre o objeto de investigação e sobre o método adequado para o estudo do Direito. Cada disciplina que tem um objeto formal específico recebe uma denominação própria, distinguindo-se das demais. A propósito desse fato, Diniz (2001, p. 34) sentencia que “(…) a aporia do conhecimento científico-jurídico (…) persistirá enquanto os juristas não se puserem de acordo sobre o objeto e o método de sua ciência”.

A menção ao objeto e ao método, por sua vez, conduz à discussão sobre a segunda indagação supra, a respeito das disciplinas jurídicas: Todas elas produzem conhecimento científico?

A resposta a essa última indagação variará, conforme a concepção que se adote acerca do papel do objeto e da importância do método no processo de elaboração do conhecimento. Primeiramente dar-se-á a resposta tendo em conta o objeto e, em seguida, tomando-se em consideração o método.

Para quem seja adepto do empirismo, só virá a produzir conhecimento científico aquela disciplina jurídica que formular determinações observáveis, a partir do objeto real (ou objeto material), ou seja, do objeto tal como ele é. Por sua vez, para quem seja seguidor do racionalismo, só realizará conhecimento científico a disciplina jurídica cujos conhecimentos tiverem sido frutos de idéias construídas pela razão, a qual, dos objetos reais (ou objetos materiais) colhe apenas as respectivas representações. E por fim, para quem seguir as epistemologias dialéticas (moderna dialética) (5), bastará que a disciplina jurídica sirva para aprimorar conhecimentos anteriores a partir do objeto tal como ele já era conhecido, ou seja, a partir do objeto “construído” (o mesmo que objeto formal ou objeto de conhecimento) (6) conforme conhecimento que já se tinha sobre ele.

Considerando-se o aspecto do método, para o empirismo o pesquisador é levado a adotar os padrões do “método científico”, sem uma discussão mais profunda dos critérios de cientificidade, segundo os quais deva acatá-los e não a outros; o método “consiste em um conjunto de procedimentos que por si mesmos garantem a cientificidade das teorias elaboradas sobre o real” (Marques Neto, 2001, p. 63). Portanto, para o empirismo, terá produzido conhecimento científico a disciplina jurídica que tiver adotado rigorosamente o “método científico” pré-estabelecido (7) – no caso, o método indutivo, conforme Marques Neto (op. cit., p. 65).

De conseguinte, para o racionalismo, o método preferível é o dedutivo, considerando-se que adota a concepção de que o vetor do conhecimento parte do objeto real para a razão. Assim, para os adeptos do racionalismo, tanto mais científica será a disciplina jurídica quanto mais se apegar ao método dedutivo.

Por fim, caso se adote um racionalismo dialético, próprio das modernas epistemologias (epistemologias dialéticas), não há por que privilegiar determinados métodos como “científicos” em detrimento de outros, como faz o empirismo em relação ao método indutivo. A escolha dos métodos mais adequados fica a cargo do pesquisador que, posicionando-se criticamente perante a teoria e o objeto, é quem melhor pode decidir sobre a adequação do método à natureza e aos objetivos da pesquisa. Não se pode, por isso, dizer que determinado processo é melhor do que outro. Somente os resultados obtidos é que poderão informar, retrospectivamente, sobre a validade dos métodos adotados. O pluralismo metodológico é uma exigência do desenvolvimento científico (Marques Neto, 2001, p. 74 -75). “A ciência é fundamentalmente um processo de construção, tanto da teoria quanto do método e do objeto” (Marques Neto, op. cit., p. 66).

Destarte, variará de autor para autor a opinião sobre se determinadas disciplinas que estudam o fenômeno jurídico constituem disciplinas científicas (ciências) ou se fazem parte de outro gênero de conhecimento (conhecimento técnico, vulgar etc.).

A seguir são apresentadas as principais disciplinas que estudam o fenômeno jurídico, com indicações sobre sua natureza e objeto de estudo. Para separar aquelas disciplinas que têm no Direito tanto seu objeto material quanto formal de estudo, daquelas que o estudam apenas a título de realizar uma especialidade de outra disciplina – como é o caso da História do Direito em relação à História Geral, ou da Psicologia Jurídica frente à Psicologia Geral –, o autor desta monografia convencionou agrupar as primeiras sob a denominação de “disciplinas propriamente jurídicas” e estas últimas sob o título de “disciplinas não-propriamente jurídicas”.

3.2 Relação de Disciplinas “propriamente jurídicas”

Serão apontadas, a seguir, apenas as denominações encontradas com mais freqüência nos livros de ciência jurídica (8), posto que existem várias outras, ou mesmo simples variações na denominação de uma mesma disciplina, conforme o ponto de vista de cada autor.

3.2.1 Teoria Geral do Direito

A expressão “Teoria Geral do Direito” surgiu na Alemanha, durante a segunda metade do século XIX, quando se deu um enfraquecimento dos estudos de Filosofia do Direito devido ter o Positivismo atingido o seu auge. Nessa época, os especialistas de cada ciência jurídica começavam suas obras com uma “parte geral” na qual estudavam uma série de conceitos comuns a todas elas (por exemplo, direito subjetivo, dever jurídico, relação jurídica etc.). Cada autor encarava essa “parte geral” de acordo com a sua própria concepção, resultando em uma grande disparidade de critérios. Esta situação anárquica provocou que se pensasse na conveniência de se estudar em uma só disciplina jurídica aquela “parte geral”, que era comum a todas as ciências jurídicas particulares, a fim de que as conclusões que se pudesse obter fossem aplicadas sucessiva e uniformemente a todas as ciências jurídicas particulares. Foi assim que nasceu, na Alemanha, a Teoria Geral do Direito (Torré, 1997, p. 69-70).

Tinha a Teoria Geral do Direito, quando da sua origem, a pretensão de substituir a Filosofia do Direito. Os precursores dessa Teoria empregavam no estudo do Direito o método indutivo próprio das ciências naturais, então muito em voga. Com esse método, elaboravam-se conceitos gerais aos quais se reputavam validade universal, mediante a generalização das características comuns a diferentes regimes jurídicos. Como a Filosofia do Direito não empregava esse método, não tinha razão de ser, pois era considerada “anticientífica” (Torré, 1997, p. 69).

Mas não vingou a tentativa de se substituir a Filosofia do Direito pela Teoria Geral do Direito. O método indutivo resultou inapropriado para o objeto a que se aplicava e para o fim perseguido, uma vez que para se comparar diversos regimes jurídicos é necessário primeiro ter-se uma idéia da essência do Direito, pois do contrário não se pode identificar como Direito o objeto que se venha a qualificar como tal. Outrossim, é falho o resultado da universalização de alguns conceitos gerais, resultando elevado grau de probabilidade. Por fim, não foi capaz a Teoria Geral do Direito de realizar as funções de que a Filosofia do Direito se ocupa, como formular os conceitos jurídicos fundamentais, realizar o estudo de tudo o que há de universal no Direito, tampouco a análise dos pressupostos sobre os quais repousa a Dogmática Jurídica (Torré, 1997, p. 70).

Na concepção atual, a Teoria Geral do Direito é a ciência que tem por objeto a formulação de conceitos jurídicos gerais, obtidos a partir da comparação de instituições ou regimes jurídicos de distintos Estados (Torré, 1997, p. 77). Para Morchon (1993, p. 156), Teoria Geral do Direito é “a parte mais geral das partes gerais da Dogmática Jurídica”.

Costuma haver quem confunda a Teoria Geral do Direito com a Filosofia do Direito ou com a Ciência do Direito (em sentido estrito).

A relação entre a Teoria Geral do Direito e a Filosofia do Direito é um dos temas sobre os quais mais já se debruçaram (e ainda o fazem) os filósofos do Direito, principalmente quando a Escola Positivista pretendeu reduzir a Filosofia do Direito à Teoria Geral do Direito. Bobbio (9) observa que, na prática, não existe quase nenhum tratado de Filosofia do Direito que não seja em boa parte dedicado a cuidar de Teoria Geral, ou pelo menos daquilo que para os juristas é a Teoria Geral do Direito; e não existe quase nenhum tratado de Teoria Geral que não contenha, no início ou no final, ou mesclado com todos os demais assuntos, um estudo dos principais problemas da Filosofia do Direito, ou pelo menos daquilo que os filósofos do Direito costumam indicar com essa expressão.

Para quem não aceita que há diferença entre ciência e filosofia, não faz sentido procurar distinção entre a Teoria Geral do Direito e a Filosofia do Direito. Porém, a maioria aceita a distinção entre as duas disciplinas, de sorte que se impõe identificar onde reside essa diferença. De acordo com Bobbio (10), as três soluções a seguir costumam ser apontadas, as duas primeiras mais amplamente: a primeira, sustentando que a Teoria Geral é uma matéria filosófica e como tal se distingue das ciências jurídicas particulares; a segunda, defendendo que a teoria geral é uma matéria científica e como tal se distingue da Filosofia do Direito; e a terceira posição é a de que as “Teorias Gerais do Direito” são duas, uma filosófica e uma científica (e para distinguir a primeira da segunda costuma-se denominar aquela de teoria pura do Direito).

Quem defende que a Teoria Geral do Direito é uma matéria filosófica, o faz por considerá-la como um estudo formal (estudo das formas da experiência jurídica); e quem sustenta ser aquela Teoria uma matéria científica vê nela um estudo de conteúdos empíricos, apesar de extremamente generalizados (Bobbio, op. cit., p. 75). Este mesmo autor, no entanto, defende a tese de que a Teoria Geral do Direto é ciência e não Filosofia, mas a considera uma investigação formal e não um estudo de conteúdo, ao contrário dos autores que defendem tal ponto de vista (ibid.).

A respeito do assunto, Diniz (2001, p. 219) comenta que a Teoria Geral do Direito tem características tanto da Filosofia do Direito como da Ciência do Direito, situando-se, assim, numa zona fronteiriça entre essas duas disciplinas, havendo inclusive autores que a consideram como parte mesmo da Filosofia do Direito, como é o caso de Siches, ou que a identificam com a Ciência do Direito, como Kelsen. A Teoria Geral do Direito seria científica, devido ao fato de alcançar seus conceitos a partir da experiência do direito posto, sem a preocupação de indagar as condições ou pressupostos últimos da experiência jurídica; e seria filosófica considerando-se os temas de que trata e a generalidade com que o faz (ibid.).

No que concerne à relação (ou distinção) entre a Teoria Geral do Direito e a Ciência do Direito, Diniz (2001, p. 219) destaca que ambas são generalizadoras, mas a generalização conceitual da Teoria Geral é maior, pois elabora noções comuns a todas as ordens jurídico-positivas, por estudar as condições necessárias ao fenômeno jurídico, independentemente do tempo e lugar, o que a põe como verdadeiro denominador comum para o estudo dos diversos ramos do Direito.

A Teoria Geral do Direito, afinal, é a disciplina que fornece noções com função de verdadeiros pressupostos sobre os quais não se admite especulações. Funciona essa ciência como uma “(…) teoria positiva de todas as formas de experiência jurídica, isto é, aplicável aos vários campos do saber jurídico”… É essa disciplina “uma ciência da realidade jurídica, que busca seus elementos na Filosofia do Direito e nas ciências jurídicas auxiliares como a Sociologia do Direito e a História Jurídica, para, estudando-os, tirar conclusões sistemáticas que servirão de guia ao jurista e até mesmo ao sociólogo ou ao historiador do Direito, sem as quais não poderiam atuar cientificamente” (Diniz, 2001, p. 219).

3.2.2 Ciência do Direito

A expressão “ciência do Direito”, em sentido amplo, compreende todas as disciplinas jurídicas, inclusive a Filosofia do Direito; em um sentido um pouco mais restrito, alcança todas as verdadeiras “ciências” jurídicas, com exclusão da Filosofia do Direito; e em sentido estrito – o mais usual –, é sinônimo de Dogmática Jurídica (Torré, 1997, p. 44). Igualmente, Aftalión e Vilanova (1988, p. 168) tratam a Ciência do Direito como equivalente à Dogmática Jurídica, afirmando que “a Ciência do Direito, Jurisprudência (11) ou Dogmática Jurídica, é a ciência cujo objeto é o Direito”.

Para Máynez (1978, p. 115), Ciência do Direito é a ciência que tem por objeto a exposição ordenada e coerente dos preceitos jurídicos que se acham em vigor em uma época e em um lugar determinados, e o estudo dos problemas relativos à sua interpretação e aplicação. Reale (1998, p. 128), por sua vez, a vê como uma ciência da realidade, não física, nem psíquica, mas cultural, acrescentando que “(…) o Direito, como toda ciência positiva, implica uma atitude realista, enquanto analisa fatos do comportamento humano e até mesmo enquanto estuda normas, que são apreciadas pela Dogmática Jurídica, como um ‘já dado’, algo posto, senão imposto à interpretação e à sistematização do jurista”.

Algumas outras considerações sobre Ciência do Direito serão retomadas, adiante, tendo em vista a sua equivalência com a Dogmática Jurídica.

3.2.3 Dogmática Jurídica

Conforme já se afirmou antes, a Dogmática Jurídica, em sentido estrito, é a mesma Ciência do Direito, de modo que as considerações constantes deste tópico valem também para esta última disciplina.

Para Reale (1973, p. 318-321), a Dogmática Jurídica “corresponde ao momento culminante em que o jurista se eleva ao plano dos princípios e conceitos gerais indispensáveis à interpretação, construção e sistematização dos preceitos e institutos de que se compõe o ordenamento jurídico. O jurista, quando interpreta um texto e tira conclusões, coordenando-as e sistematizando-as, segundo princípios gerais, visa o problema da aplicação. É nesse trabalho que consiste principalmente a Dogmática Jurídica”.

Kaufmann e Hassemer (1992), ao caracterizarem a Dogmática, assinalam que todo tratadista dessa matéria pensa a partir de dados extraídos a partir de pressupostos que ele aceita como verdadeiros, sem prévio exame. De tal modo, não cabe ao tratadista de Dogmática Jurídica discutir o que é o Direito em seu fundamento último, tampouco em que circunstâncias é possível o conhecimento jurídico, seu alcance e formas que pode adotar. A Dogmática Jurídica não é acrítica, mas quando realizar a função crítica, “(…) por exemplo, ao submeter a exame uma norma legal, sua argumentação sempre haverá de ser imanente ao sistema, o que supõe deixar intangível o sistema vigente” (op. cit.,p. 27-28),.

A Dogmática Jurídica, além de visar ao conhecimento daquilo que é estabelecido pelo legislador, possibilita também reflexões que permitem controlar e dirigir a matéria normativa para a solução dos conflitos, ou seja, permite conhecer a lei, tendo em vista sua adequada aplicabilidade na solução de conflitos (Ferraz Júnior, 1977, p. 356).

Morchon (1993, p. 163-164) relaciona os seguintes assuntos como temas da Teoria da Dogmática Jurídica: 1. História da Dogmática Jurídica, particularmente a tensão ente o método dogmático e o método sociológico; 2. Teoria dos textos jurídicos; 3. Teoria da interpretação dogmática, compreendendo: a) os métodos interpretativos e b) a formação dos conceitos e do sistema dogmático-jurídico; e 4. Teoria da Justiça intrasistemática (valores e princípios: sua função no ordenamento).

3.2.4 Teoria do Direito

É muito difícil dizer o que é a Teoria do Direito, tendo em vista a disparidade não só dos problemas que são debatidos sob o rótulo dessa disciplina, como também a grande divergência nos modos ou maneiras como tais assuntos são tratados por essa pretensa espécie das ciências jurídicas. Na verdade, não há muita diferença de natureza entre a Filosofia do Direito e a Teoria do Direito, pois ambas parecem ter o mesmo objeto formal de trabalho. Com efeito, assim como na Filosofia do Direito, na Teoria do Direito são abordados os problemas capitais do Direito, adotando-se em ambas um ponto de vista transcendente ao sistema; outrossim, o pensamento teórico-jurídico é um pensamento metadogmático e crítico, assim como o pensamento filosófico (Kaufmann e Hassemer, 1992, p. 34-35).

Para Morchon (1993, p. 156), a Teoria do Direito não se identifica com a Filosofia do Direito em sentido estrito, nem com a doutrina do Direito natural, mas “(…) pode ser qualificada como uma forma de Filosofia do Direito em sentido amplo, concretamente aquela forma que se orienta pelo modelo epistemológico da análise da linguagem”.

Durante as aulas ministradas no Curso de Mestrado em Teoria do Direito e Filosofia do Direito da Universidade Federal de Pernambuco, mediante convênio desta com a Universidade Federal do Piauí e a Escola Superior da Advocacia do Piauí – ESAPI, Landim também afirmou que a Teoria do Direito tem a pretensão de ser Filosofia, mas asseverou que a primeira se caracteriza apenas como um conhecimento enciclopédico.

3.2.5 Introdução ao Direito

Introdução ao Direito é a matéria que tem por objeto dar uma noção panorâmica e sintética das diversas disciplinas jurídicas, a par de uma noção elementar dos principais conceitos jurídicos por elas estudados. Muitas outras denominações são atribuídas a essa disciplina, podendo-se citar, por exemplo, as seguintes: Introdução ao Estudo do Direito, Introdução às Ciências Jurídicas, Introdução Geral ao Estudo do Direito, Introdução à Ciência do Direito, Introdução Enciclopédica ao Direito, Enciclopédia Jurídica, Prolegômenos do Direito, Introdução às Ciências Jurídicas e Sociais, Introdução ao Direito e às Ciências Sociais etc. (Torré, 1997, p. 96).

A respeito da Introdução ao Direito, duas opiniões têm sido sustentadas: uma que a considera como “ciência geral do Direito” – e, portanto, autônoma – e outra, predominante na atualidade, que lhe confere o caráter de matéria meramente formal, ou seja, não autônoma. Mas a Introdução ao Direito não é uma disciplina jurídica autônoma porque não tem um conteúdo próprio e exclusivo, ou seja, estuda temas que pertencem fundamentalmente a outras disciplinas. Ao estudar os temas de outras disciplinas, a Introdução ao Direito o faz observando enfoques e métodos próprios de cada uma delas, com a particularidade de expô-los de forma breve e elementar (Torré, op. cit., p. 97).

3.3 Relação de disciplinas “não-propriamente jurídicas”

Sob este tópico, serão incluídas apenas as disciplinas “não-propriamente jurídicas” mais mencionadas pelos diversos autores, haja vista que são muitas as que não têm o Direito como objeto principal de seus estudos, dele se ocupando apenas como uma especialização da matéria principal. Outrossim, os comentários serão restritos à indicação do objeto de estudo de cada uma. Mesmo a Filosofia do Direito, que é uma das mais importantes dentre as disciplinas que estudam o Direito, não será tratada profundamente, tanto porque constituiria fuga ao objetivo da presente pesquisa, como também porque já se tratou do conhecimento filosófico em outros tópicos.

3.3.1 Filosofia do Direito

Compete à Filosofia do Direito encarar as questões mais profundas e essenciais do Direito, localizando seu estudo em uma sistematização total dos conhecimentos humanos, o que nos permite compreender não só o sentido e a significação do jurídico em uma concepção total do mundo e da vida, mas também o caráter e fundamentação das disciplinas que o tomam por objeto. Daí dizer-se que o conhecimento filosófico tem o duplo caráter de ser autônomo e pantônomo. Autônomo porque, apesar de fundamentar as diversas ciências jurídicas, a Filosofia do Direito é, em si mesma, um saber sem pressupostos; e pantônomo, no sentido de que abarca o Direito em sua totalidade (Torré, 1997, p. 58).

Há quem considere que a Filosofia do Direito é mais uma espécie do gênero das ciências do Direito (Torré, 1997, p. 41), entretanto, a opinião majoritária é a de que se trata de um ramo da Filosofia Geral (12), por apresentar as mesmas características desta.

De acordo com Saldanha (1998, p. 34), a Filosofia do Direito não constitui uma das ciências jurídicas, nem se enfileira entre os saberes que se referem ao Direito, como apregoam alguns autores. Para o referido autor, a Filosofia do Direito é uma projeção da própria Filosofia sobre uma temática particular, assim como, por exemplo, “(…) a Sociologia Jurídica é um debruçar-se da Sociologia – dita ‘geral’ – sobre certos aspectos do Direito. Filosofia e Sociologia são no fundo modos de ver, são pontos de vista ou perspectivas enfocadas sobre as coisas: não se submetem a partilhos metodológicos estreitos, nem se comportam dentro de escaninhos acadêmicos, sob pena óbvia de perderem seu significado e sua fecundidade” (ibid.).

Outras características da Filosofia do Direito já foram comentadas nos tópicos anteriores, o que permite passar logo ao exame das demais disciplinas, mesmo porque o objetivo ora visado é apenas o de revelar o objeto de cada uma.

3.3.2 História do Direito

A História do Direito é o ramo ou especialidade da História Geral que “(…) estuda, cronologicamente, o Direito como fato empírico e social resultante da interação humana, salientando os seus caracteres peculiares, as causas ou motivos de suas mutações ou transformações, envolvendo a experiência jurídica do passado, procurando individualizar os fatos e integrá-los num sentido geral, ao se ater à evolução das fontes do Direito, ao desenvolvimento jurídico de certo povo, à evolução de ramo específico do Direito (história do Direito Civil, Penal etc.) ou de uma instituição jurídica (história da propriedade, do casamento etc.), mostrando a sua projeção temporal em conexão com as teorias em que se baseiam” (Diniz, 2001, p. 228-229).

Torré (1997, p. 80) conceitua a História do Direito como o ramo ou especialidade da História Geral que estuda o desenvolvimento do Direito, explicando-lhe em função das causas respectivas, com o alcance individualizador próprio da História. Significa que essa disciplina trata tanto do desenvolvimento dos corpos legais como da aplicação que estes tiveram na realidade da vida pretérita. Outrossim, quando se diz que a História do Direito explica o Direito em função de suas causas, quer-se afirmar que não se limita a uma mera narração cronológica e descritiva do Direito Positivo, mas explica suas transformações em função das distintas causas ou fatores, localizando as instituições jurídicas dentro do respectivo processo histórico-social. Por fim, quando se afirma que a História do Direito estuda os fatos com um alcance individualizador, quer-se dizer que não formula leis como outras disciplinas, cumprindo sua finalidade ao explicar cabalmente determinados fatos, naquilo que têm de único e particular (Torré, op. cit., p. 81-83).

3.3.3 Sociologia do Direito

A Sociologia Jurídica ou Sociologia do Direito é, segundo Torré (1997, p. 87-88), “o ramo da Sociologia Geral que enfoca o direito como fenômeno social, com o objetivo de explicar suas características e função na sociedade, as relações e influências recíprocas entre esses fenômenos sociais, assim como as transformações do Direito, com um alcance geral”.

A Sociologia do Direito é um ramo da Sociologia Geral e, portanto, tem seu mesmo método e suas mesmas características (Torré, 1997, p. 88). O sociólogo do Direito, utilizando métodos e técnicas de pesquisa empírica, estuda como se forma e transforma o Direito, verificando qual é a sua função no seio da coletividade e como influi na vida social, sem ter a preocupação de elaborar normas e de interpretar as que vigoram numa dada sociedade (Diniz, 2001, p. 226).

3.3.4 Psicologia Jurídica

Trata-se a Psicologia Jurídica, ou Psicologia Forense, de uma disciplina em formação. É no Direito Penal que essa disciplina tem mais aplicação, a ponto de se falar em um sub-ramo denominado “Psicologia Criminal” (ou Psicologia Penal) que, entre outros temas, compreende o da psicologia do criminoso. No Direito Civil, a Psicologia Criminal serve para estabelecer, por exemplo, se um determinado ato foi praticado voluntariamente ou não (Torré, 1997, p. 94).

3.3.5 Direito Comparado

Também denominado de Ciência Comparada do Direito, o Direito Comparado é a disciplina que estuda, comparativamente, não só o Direito Positivo, contemporâneo ou não, de diferentes países, mas também os motivos pelos quais o Direito se desenvolveu de modo diverso nos vários países, com o intuito de uniformizá-lo e orientar, em certos casos, a reforma legislativa no Direito nacional (Diniz, 2001, p. 231).

3.3.6 Lógica Jurídica

A Lógica Jurídica é a disciplina das leis e das operações formais do pensamento jurídico ou a reflexão crítica sobre a validade do pensamento jurídico, indicando como deve o intelecto agir no estudo do Direito, na interpretação, na integração, na elaboração e aplicação jurídicas. Essa disciplina se desdobra em Analítica Jurídica (abrangendo a lógica deôntica relativa às proposições normativas) e Dialética Jurídica (dando o sentido do desenvolvimento jurídico) – Diniz, 2001, p. 230.

3.3.7 Cibernética Jurídica

Cibernética Jurídica, ou Juscibernética, é a disciplina que procura compreender a conduta humana, em termos de comportamento das máquinas, colocando à disposição do jurista e do aplicador os recursos dos computadores na classificação e comparação de provas, na seleção de normas aplicáveis ao caso, na atualização de dados bibliográficos e jurisprudenciais etc. (Diniz, 2001, p. 231).

3.3.8 Política Jurídica

Política Jurídica é, de acordo com Diniz (2001, p. 231), “a ciência da organização do Estado que procura estudar as relações entre autoridade e cidadãos e as formas e meios jurídicos adequados à consecução dos fins da comunidade por meio da ação estatal”.

4. CONCLUSÃO

Tendo em vista a exposição feita na parte nuclear desta monografia, impõe-se aduzir algumas conclusões sobre o tema abordado.

No que concerne à crença na possibilidade ou impossibilidade de se alcançar o conhecimento absoluto, distinguem-se a corrente dogmatista e ceticista. A corrente dogmatista afirma a possibilidade de se atingir o conhecimento da realidade, sem quaisquer dúvidas (dogmatismo total), ou de alcançar a realidade sob determinadas circunstâncias (dogmatismo parcial ou relativismo). A corrente ceticista, por sua vez, acredita que as coisas não são apreensíveis, independentemente dos graus e formas de conhecimentos adotados, recomendando, assim, nunca julgá-las como verdadeiras ou falsas. Assim como no dogmatismo, o ceticismo pode-se apresentar parcial, quando se é cético quanto a alguns problemas da realidade ou da vida ao mesmo tempo em que se é dogmático em relação a outros. O cético parcial, assim como o dogmático parcial, é relativista.

No Direito, o dogmatismo consiste na crença de que é possível atingir-se a verdade dos conceitos jurídicos fundamentais, com certeza e sem limites estabelecidos a priori. As principais manifestações do dogmatismo no Direito são as doutrinas do Direito Natural (Jusnaturalismo) e do Direito Positivo (Juspositivismo). O ceticismo, em Direito, se manifesta principalmente em torno da discussão de assuntos como o da possibilidade de determinar-se o valor da justiça de maneira universal, ou de se formular um conhecimento do fenômeno jurídico dotado de certeza e de cientificidade. E o relativismo se afigura como a crença na de que não se pode conhecer totalmente o fenômeno jurídico, mas mas nas partes em que esse conhecimento é possível, o conhecimento não enseja dúvidas.

Quanto ao processo de elaboração do conhecimento, duas vertentes historicamente se confrontaram: o empirismo e o racionalismo. Para o empirismo, o conhecimento consiste numa descrição do objeto (parte do objeto para o sujeito) e só tem validade quando for suscetível de comprovação empírica. Já para o racionalismo, o objeto de conhecimento é algo que é construído pela razão, de modo que o ato de conhecer parte do sujeito para o objeto. Modernamente, parecem ter sido superados o empirismo e o racionalismo pela moderna dialética. Esta não concorda com a separação que o empirismo e o racionalismo fazem entre o sujeito e o objeto do conhecimento, salientando que o importante é a relação concreta que efetivamente ocorre no processo histórico do ato de conhecer. Na moderna dialética, diferentemente do empirismo e do dogmatismo, o objeto não é o objeto real, mas o objeto como está conhecido até o momento de ser estudado, consistindo o ato de conhecer em acrescentar conhecimentos àquele objeto de conhecimento. Daí a distinção entre objeto material e objeto formal (ou objeto de conhecimento), sendo este o objeto tal como é conhecido e não como se apresenta na realidade material.

O conhecimento, quanto à lógica em que se concretiza, classifica-se em vulgar, científico e filosófico. O conhecimento vulgar é incerto, superficial e desordenado, enquanto o conhecimento científico caracteriza-se por ser certo, explicado e fundamentado, sistemático (metódico) e de sentido limitado. Por sua vez, o conhecimento filosófico se caracteriza por ser um conhecimento que visa a totalidade dos objetos, naquilo que eles têm de essencial, podendo qualquer matéria ser objeto de reflexão filosófica. Outrossim, o conhecimento filosófico não pressupõe outros conceitos e, aliás, dedica grande parte de seu esforço à dilucidação dos pressupostos científicos.

Na discussão sobre a viabilidade de se submeter o Direito a um conhecimento científico, a corrente “ceticista cientítico-jurídica” defende a inviabilidade do conhecimento sistemático do Direito, de modo que não é possível a formação de ciências do Direito. Porém, para a maioria dos estudiosos, o Direito é suscetível de conhecimento científico.

É no conhecimento filosófico que são encontradas saídas para os problemas essenciais e mais profundos que se referem ao Direito, tais como a noção do Direito, da justiça etc., mas é a partir do enfoque (conhecimento) científico que surgem as diferentes ciências jurídicas.

A causa da existência de várias disciplinas estudando o Direito reside no fato de os juristas não estarem de acordo sobre o método e do objeto de sua matéria de trabalho.

A tranqüilidade nesse tema há que ser encontrada firmando-se a convicção de que “(…) não há um método único, que por si mesmo garanta a cientificidade de qualquer proposição teórica. O método deve ser construído em função da teoria direcionadora da pesquisa, do problema formulado e da natureza do objeto. Cabe, assim, ao cientista, elaborar o método que lhe pareça mais adequado a cada pesquisa concreta, cuja validade só pode ser determinada dentro de uma visão retrospectiva. Há pontos comuns, usuais, no percurso metodológico, mas eles não podem ser considerados como regras fixas, a serem rigorosamente observadas em qualquer investigação científica… O método jurídico faz parte do processo de elaboração teórica, e sua validade não pode ser estabelecida a priori, mas sempre em função da natureza de cada pesquisa” (13).

As distintas teorias que descrevem o fenômeno jurídico não se refutam entre si, nem podem considerar-se umas melhores do que as outras. Elas partem de diferentes definições estipulativas, delimitam distintos campos temáticos e, por isso mesmo, são incomparáveis (ou “incomensuráveis” na terminologia de Kuhn e Feyerabend) (14).

Portanto, não se deve pretender a existência de uma única ciência jurídica, pois é o conjunto das diversas investigações científicas com a investigação filosófica que possibilitam a análise mais eficiente e completa do Direito.

5 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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Notas

01. Ou seja, contém uma incursão na Epistemologia Jurídica, que é a parte da Filosofia do Direito “(…) que se ocupa da ciência do Direito, estudando os seus pressupostos, analisando os fundamentos em que repousam os princípios que informam sua atividade, bem como a delimitação de seu objeto temático, procurando verificar, ainda, quais os métodos, ou melhor, os meios lógicos que dão garantia de validade aos resultados teóricos alcançados” (Diniz, 2001, p. 34).

02. Linhas atrás já se tratou da corrente idealista, porém, para mencionar a sua concepção quanto à viabilidade de se alcançar o conhecimento (inclusive o conhecimento jurídico), ao passo que agora se lhe menciona para apontar sua idéia a respeito de como se processa o conhecimento.

03. Em sentido amplo, ou seja, compreendendo todas as disciplinas que estudam o Direito.

04. O conhecimento pode também ser classificado segundo outros critérios: do ponto de vista psicológico, em sensível e racional; com base na sua finalidade, em teórico ou especulativo e prático etc. (Torré, 1997, p.35).

05. Remete-se o leitor ao item 2.2, onde se tratou mais detidamente do processo de elaboração do conhecimento.

06. A) Na teoria da ciência, distingue-se o objeto material do objeto formal. Objeto material é o objeto concreto de que se ocupa uma determinada ciência, considerando-o em sua totalidade fenomênica, enquanto objeto formal consiste na perspectiva a partir da qual se investiga essa “totalidade” (daí ser denominado, às vezes, de objeto de investigação). O que caracteriza cada ciência é, portanto, seu objeto formal, tendo em vista que o objeto material pode ser comum a várias ciências (Kaufmann e Hassemer, 1992, p. 29). B) Essa distinção – entre objeto material e objeto formal – foi obrada pela epistemologia moderna e a ela já se reportou no último parágrafo do item 2.2 desta monografia (sob os nomes de obeto real e objeto de conhecimento, respectivamente), ao qual se remete o leitor. C) Segundo orientação de Landim, em aula ministrada 25/11/2001, em Teresina/PI, no 1º curso de mestrado interinstitucional da Universidade Federal de Pernambuco em convênio com a Universidade Federal do Piauí e a Escola Superior da Advocacia do Piauí – ESAPI, constituem funções do objeto: 1) definir o tipo de conhecimento (empírico, científico, transcendental etc.); 2) estabelecer relações entre os diversos campos do conhecimento jurídico; 3) definir o campo de pesquisa. Por sua vez, o método serve para demarcar o campo de estudo.

07. “…É por isso que o Positivismo afirma a possibilidade de existência de um método único, comum a todas as ciências, independentemente do grau de evolução que elas tenham atingido e das circunstâncias histórico-culturais em que se processe sua elaboração”…O Positivismo “…transfere a crença no objeto para a crença no método, o qual se validaria por si mesmo (Marques Neto, 2001, p. 65).

08. “Ciências jurídicas”, aqui consideradas em sentido amplo, de quaisquer das ciências que estudam o Direito.

09. Na sua Contribucion a la teoria del derecho, edición a cargo de Alfonso Ruiz Miguel, p. 72.

10. Conforme consta da mesma obra referida na nota anterior, p. 74.

11. A palavra jurisprudência, além de significar a Ciência do Direito, também é comumente utilizada para designar as decisões judiciais como fontes do Direito. Nos países saxônicos, a palavra jurisprudence é empregada para designar as disciplinas que estudam o Direito.

12. No mesmo sentido, Kaufmann e Hassemer, 1992, p. 27, entre outros.

13. Cf. Marques Neto, in A ciência do direito: conceito, objeto, método, 2001, p. 239-240.

14. Cf. Russo, in Teoria general del derecho en la modernidade y en la posmodernidad, 1995, p. 23.

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