Por Sylvia Romano
A lentidão dos tribunais aliada à retração da economia brasileira demonstrou que o Brasil tem a 30ª justiça mais lenta do planeta, “assumindo ainda”, como aponta Percival de Souza em artigo para a Tribuna do Direito, “a passo de tartaruga, a 63ª posição, num ranking que chega a um tempo médio — 380 dias — para se conseguir receber judicialmente uma dívida”.
Para Nelson Jobim, presidente do Supremo Tribunal Federal, “o acúmulo de processos provoca um problema de sobrevivência de todos, cujo congestionamento levará á paralisação completa do sistema”. Segundo ele, “a nação olha com atenção as nossas condutas”.
São argumentos de peso, a favor da Súmula Vinculante, mas, nem por isso, recebem o apoio do Fórum Mundial de Juízes que se reuniu em Porto Alegre, e, onde, os magistrados declararam, claramente, que o que estão desejando são “juízes previsíveis e proibidos de pensar, tal como se fossem seres inanimados”, diferentemente do que quer “a magistratura paulista e nacional, a qual vê o juiz como verdadeiro intérprete das leis e da Constituição Federal, visando em suas decisões litigar as desigualdades sociais, erradicar a pobreza e a marginalização e promover o bem de todos”, como afirma o desembargador Celso Luiz Limongi.
Examinemos porque a súmula vinculante é absurda:
Ela é uma caricatura da regra do stare decisis et quieta muovere do Direito Anglo-Saxônico. A súmula vinculante não deixa de ser uma contradição em suas duas palavras, pois súmula é uma palavra incompatível com vinculante. O Enunciado de uma súmula é sempre um resumo, e, por isso mesmo não faz sentido que venha a vincular julgamentos futuros. Na common law, o vínculo aos precedentes se dá em função da ratio decidendi, vale dizer, dos fundamentos da decisão e não, de sua mera conclusão. SE HOUVER VÍNCULO NÃO PODE SER SÚMULA. SE FOR SÚMULA, NÃO PODE VINCULAR.
Como nos ensina Ronaldo Rebello de Britto Poletti, advogado e professor da UNB, em seu brilhante artigo “A Súmula Vinculante”, “de uma certa forma, o problema resulta de uma tensão que teve início com a República. Adotamos, na ocasião, uma Constituição que, embora com desvios e distorções formais, adotava modelos dos EUA. Rui Barbosa, cultor do Direito Público Inglês, assumia também o Direito Americano que não se adequava às nossas tradições romanistas. Este é o descompasso que nos tem gerado problemas, que, agora, aliás, se exarcebam na proposta da súmula vinculante que se apresenta não só como uma traição às nossas origens culturais, como aparece como uma verdadeira caricatura. Na verdade, é uma verdadeira cortina de fumaça que vem encobrindo os gravíssimos problemas da crise jurisdicional do Brasil”.
Para o Brasil adotar a súmula vinculante significa afastar-se do sistema brasileiro, fugir da direção de nossas raízes culturais e tentar importar uma influência anglo-saxônica que não possuímos.
O que caracteriza o Direito é a interpretação. Não há Direito sem interpretação.
A regra do efeito vinculante inibe a interpretação do direito pelos seus aplicadores.
E, finaliza, o mesmo professor:
“A súmula vinculante simplesmente não resolve nada, nem mesmo para esvaziar as estantes e os corredores dos tribunais superiores porque os juízes não poderão ser impedidos de julgar contra a súmula vinculante (a não ser que se crie algum crime ou sanção administrativa)”.
Teremos novos recursos para aqueles tribunais, e, assim, continuamente, ad nauseam…
Revista Consultor Jurídico