Damásio de Jesus
Fevereiro/2002
Incidimos, mais uma vez, no vício da má elaboração de leis. A Presidência da República, deixando de recusar integralmente o Projeto da nova Lei Antitóxicos, preferiu, para não ferir o Congresso Nacional, vetar 35 de seus dispositivos. Com isso, quando entrar em vigor a lei nova (Lei n. 10.409, de 11 de janeiro de 2002), o que se dará no dia 27 de fevereiro do corrente ano (2002), teremos nova confusão legislativa. Assim:
1. As normas dos Capítulos I e II da Lei n. 10.409/02 (arts. 2.º a 13), que dispõem sobre generalidades administrativas, prevenção, erradicação e tratamento, revogaram parcialmente a Lei n. 6.368/76; desta, somente subsistem os dispositivos que tratam de temas não disciplinados na nova legislação.
2. Os dispositivos do Capítulo III do Projeto (arts. 14 a 26), que descreviam crimes, foram inteiramente vetados. De maneira que continuam em vigor os arts. 12 e seguintes da Lei n. 6.368/76, que definem os delitos referentes a tóxicos.
3. Em relação aos arts. 27 a 34 da lei nova (Capítulo IV), que dispõem sobre o procedimento penal (fase inquisitiva do procedimento criminal), haverá posições divergentes: 1.a orientação: embora em vigor, os arts. 27 a 34 não possuem eficácia. O art. 27 determina: “o procedimento relativo aos processos por crimes definidos nesta Lei rege-se pelo disposto neste Capítulo…” (itálico nosso). Ocorre que a Lei n. 10.409/02 não define crimes (vide, acima, o item 2). Logo, os dispositivos do mencionado capítulo ficaram sem objeto. Conseqüência, de acordo com essa posição: na parte inquisitória do procedimento penal por crimes concernentes a tráfico de tóxicos subsistem as disposições da Lei n. 6.368/76 (flagrante, investigação, perícia etc.); 2.a orientação: os arts. 27 a 34 revogaram parcialmente as disposições da Lei n. 6.368/76 que disciplinavam a parte inquisitiva do procedimento referente aos delitos de tráfico de drogas (nossa posição). Observação: da Lei n. 6.368/76 subsistem as normas sobre institutos não disciplinados pela lei nova. Além disso, cuidando-se de crimes dos arts. 15, 16 e 17 da Lei n. 6.368/76, incide a Lei dos Juizados Especiais Criminais (Lei n. 9.099/95, modificada pela Lei n. 10.259/01).
4. As disposições do Capítulo V da Lei n. 10.409/02 (arts. 37 a 45), que disciplinam a instrução criminal, revogaram parcialmente a mesma parte processual da Lei n. 6.368/76 (permanecem as normas da lei anterior sobre institutos não regulados pela Lei. n. 10.409/02). De modo que o rito processual da ação penal por crimes de tráfico de drogas (arts. 12, 13 e 14 da Lei n. 6.368/76), hoje, é o da lei nova; tratando-se, entretanto, dos crimes descritos nos arts. 15, 16 e 17 da Lei n. 6.368/76, de menor potencial ofensivo em face da Lei n. 10.259/01, incide a Lei dos Juizados Especiais Criminais (Lei n. 9.099/95, alterada pela Lei n. 10.259/01).
5. Os arts. 46 a 55 da lei nova (Capítulos VI e VIII), sobre os efeitos da sentença, a perda da nacionalidade e disposições finais, revogaram as disposições similares da Lei n. 6.368/76.
Temos uma colcha de retalhos, coexistindo as Leis n. 6.368/76 e 10.409/02 (Razões dos vetos, Mensagem n. 25, de 11 de janeiro de 2002, do Senhor Presidente da República ao Senhor Presidente do Senado Federal, razões do veto ao art. 1.º do Projeto).