Defensoria Pública e os dativos

“A Defensoria Pública existe para atender a todos os cidadãos que acorram ao juízo sem o poder financeiro…”

Conheço e sou franco admirador da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul e na sua atividade jurisdicional, desde quando estagiei pela faculdade de Direito de Campo Grande, próximo à atuação incansável do, nesse tempo, Defensor Público Juvêncio César da Fonseca, no então fórum da Rua 26 de Agosto. Acredito que através de Juvêncio, a Defensoria Pública iniciou sua base sólida como futura instituição.

Passados os anos, finalmente, vejo o estado administrado pelo governador José Orcírio Miranda dos Santos, reconhecendo e retribuindo a dedicação e o esforço dos patronos públicos dos mais fracos financeiramente, ao discutir com a procuradora-geral da Defensoria Pública, Darcy Terra Fernandes, o possível aumento do percentual de 8,81% contido na Lei de Diretriz. Orçamentária para um patamar mais elevado e que permita criar quadro administrativo e contratação de mais 50 defensores, cujos cargos estão vagos. E tal reconhecimento tem o apoio também da Assembléia Legislativa sul-mato-grossense e entusiasmo do deputado-presidente Londres Machado e da Associação dos Defensores Públicos, pelo seu presidente Andrew Robalinho da Silva Filho.

A Defensoria Pública existe para atender a todos os cidadãos que acorram ao juízo sem o poder financeiro que lhes permitam constituir advogado para defender seu direito, como reconhecimento evidente da igualdade de todos diante da Lei. Porém, pode-se verificar que a teoria, na prática, não funciona se não houver certa persistência ou luta para se conseguir chegar aos juizados e muito menos aos tribunais. Porque faz parte das reivindicações da Defensoria o preenchimento das 50 vagas que aguardam pelos titulares defensores. Contudo, há que se destacar que a Defensoria Pública sul-mato-grossense é composta de homens e mulheres, que fazem tudo aos seus alcances para cumprirem suas tarefas com a maior qualificação profissional e moral, para orgulho de Mato Grosso do Sul e do Brasil.

Existe, no entanto, um grave problema quando ao quadro reduzido de defensores no estado. Ele tem levado advogados que são designados para defesas de autores e réus necessitados, por falta de defensores públicos, não lhes sendo retribuídas remunerações por tais trabalhos. Por esses escritórios advocatícios são empregadas todas as estruturas em dezenas de processos, gastando do próprio bolso para levar adiante as questões, deixando de ser pagos ou ressarcidos, pelo Estado, como manda a Lei. O patrocínio gratuito, para os necessitados, é uma exigência legal, mas é nas comarcas onde não tem Defensoria Pública que o trabalho do Defensor Dativo (advogado nomeado pelo juiz, para determinado caso) é mais exigido.

A crise econômica que paira sobre o país torna cada vez mais grave a situação das pessoas que têm de recorrer à justiça e não possuem recursos para contratar advogados. Esse problema é um dos difíceis dilemas de prestação de justiça em nosso meio. É a velha história da pessoa pobre que vai à Justiça, encontra lá um promotor e um juiz altamente capacitado e conscientes de seus deveres, apresentando-se em contrapartida na lide com um advogado que pode ser poupado pelo exercício da gratuidade de sua assistência. Quando solicitada sua participação, não vacila e disponibiliza sua competência e cerca seu constituinte de todo zelo, porém não é remunerado. Isso é desigual. É fundamental para o exercício do direito uma defensoria aparelhada e abrangente a todas as comarcas.

Quanto se houve falar sobre a prestação jurisdicional, no país? Pois bem, ela é a própria administração da justiça, da qual a Defensoria faz parte, com a solução dos conflitos interpessoais. Eles, os defensores, são os intermediários entre a Cidadania e o Judiciário. O sistema jurisdicional tem de ser sobretudo justo e adequado. Se é na Justiça que se encontra o fundamento da democracia, também são nas respeitadas, dinâmicas e eficazes, salas de justiça que devem estar as raízes do verdadeiro sentido da democracia que é a popularização da justiça, e onde devem ter acento as defensorias públicas. Não só no Mato Grosso do Sul como em todo o Brasil.

Abro parêntese para uma homenagem aos Defensores Dativos através de um grande e enorme advogado, de espírito alegre, brincalhão, mas eticamente responsável, de minha cara Porto Murtinho: o competente, dedicado e querido Cezar Fróes. Foi grande em seu incansável saber jurídico. Foi enorme advogado pelo tamanho do seu coração transbordante de amor aos mais necessitados. Principalmente um sábio que sempre levou sua presença a todos os lares, dos mais simples ao mais abastados, com alegria e respeito de um irmão solícito. Fui iniciado na tribuna forense, do tribunal do júri, por ele. A quem o chamava de Fera do Pantanal, ao que sabia e jocosamente respondia ser “apenas uma jaguatirica pantaneira”. Esse foi meu amigo Cezar Fróes. Em geral os Defensores Dativos têm esse espírito solícito, dedicado e fraterno.

Após essa rápida homenagem aos advogados dativos, volto ao tema principal, porque não há como negar que vivemos numa sociedade de classes e por isso não são todos os que conseguem chegar à justiça, como os que a ela buscam chegam-lhe em situações esfrangalhadamente desiguais. Na realidade, graças ao grande e insuficiente acesso do máximo de pessoas à justiça, a própria eficácia do sistema judiciário, como mediadora de conflitos, vive em contestação. Apesar de todo esforço desdobrado da Defensoria, muita gente fica excluída da mediação, o que é um forte indicador da desagregação da sociedade.

Agora surgem acenos tanto da Procuradora-geral da Defensoria Pública do Estado, quanto do Presidente da Associação dos Defensores Públicos e a colaboração do Presidente da Assembléia Legislativa que junto ao Governo do Estado procuram evitar maiores prejuízos aos carentes. O Estado prepara-se para assumir parcela de população que não é a atendida e que terá o amplo apoio da gratuidade da justiça.

Ruy SantAnna dos Santos
Advogado e jornalista

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