O MST e a Nova Canudos

Euclides da Cunha escreveu em um dos capítulos de seu Os Sertões, que Antonio Conselheiro não pregava contra a república porque fosse contra o conceito em si, mas porque era incapaz de compreender qualquer outra forma de governo senão o rude despotismo. Não deixa de ser bastante sintomático que o assim chamado Movimento dos Sem-Terra use com frequência o símbolo de Canudos. Um dos criminosos que dirige este movimento já chegou a dizer que o ideal do MST é construir uma Nova Canudos e é exatamente este o nome de alguns acampamentos e assentamentos da organização. Mas, para além dos nomes e discursos, a glorificação de Antonio Conselheiro pelos Sem-Terra transparece, sobretudo na prática diária deste movimento e nos valores que ele defende.

Para eles a democracia é apenas um empecilho para seus projetos e deve portanto ser eliminada. Não é à toa que entre seus idos, a começar por Conselheiro, só há pessoas que demonstraram na história pouco apreço pelo Estado de Direito, mera invenção burguesa como diriam os manuais da organização. Para garantir aquilo que julga ser seu direito o método do MST não é aquele consagrado pela democracia – o diálogo racional, a negociação, a busca do consenso – mas a via da força bruta, as manifestações, os protestos, as invasões de áreas privadas e prédios públicos.

Mas do que simplesmente uma “tática”, este comportamento do MST é estrutural, está profundamente entranhada na visão de mundo deste movimento. É isto que ensinando às crianças, adolescentes e adultos nos centros de doutrinação política que eles chamam de escolas, são estes os valores expressos nos documentos, jornais e entrevistas dos dirigentes, transparece em todos os aspectos da conduta do MST. Este descaso com o Estado se reflete no fato do MST sequer ter existência legal efetiva. Não é uma instituição regulamentada, mas uma sombra que paira sobre e fora das instituições, sem estar sujeita a nenhum controle. A justiça, para eles, é apenas uma arma do “inimigo” que deve ser denunciada, desacatada e desrespeitada sempre que possível. No extremo alguns de seus líderes, como José Rainha, julgam-se no direito até de cometer crimes e permanecer impunes, utilizando a desculpa que qualquer processo devidamente instruído e de acordo com as leis vigentes é apenas “uma armação” contra o MST.

Mesmo o Governo Lula, eleito com o apoio da organização, só deve ser respeitado naquilo que for conveniente aos interesses do movimento – sempre colocados acima dos interesses do Brasil e dos demais brasileiros. Se o presidente fez algo que eles não gostem – e no caso não se trata das denúncias de corrupção, mas da não-entrega de verbas em volume suficiente para as necessidades do grupo – então o MST vai às ruas, faz passeatas, distribui xingamentos, invade prédios públicos. Não é à toa que o principal foco dos ataques dos “sem-terra” seja o Ministério da Fazenda – única área que tem funcionado relativamente bem na área federal – porque o que eles querem é justamente que o governo não funcione. Qualquer eficiência administrativa por parte de qualquer governo é uma ameaça aos seus planos, o que talvez explique toda a cólera que dedicam ao governo paulista, apesar deste capitanear o mais audacioso, bem elaborado e efetivo plano de Reforma Agrária.

Há algo sobre o qual a atenção de todos os que desejam a manutenção do estado democrático devem estar atentos. A despeito de toda a atividade do MST visar claramente à destruição e ao desrespeito do Estado de Direito é dos cofres públicos que sai a maior parte dos recursos da organização, seja por via direta ou indireta. E o Movimento destes “bandoleiros morais” não vacila em ir às ruas para pedir mais e mais dinheiro – cuja destinação diversas vezes espúria como mostram inúmeras denúncias – mas deixa claro que não quer controle algum. Assim, como câncer, o MST se nutre da vítima que pretende destruir por dentro.

Campos Machado
Deputado, advogado, líder estadual e vice-presidente nacional do PTB.

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