As últimas informações do cenário eleitoral de 2006 estão causando verdadeiro nó mental nos “especialistas” em política: a última pesquisa do Datafolha revela que 83% dos pesquisados dizem que o presidente Lula tem responsabilidade pela corrupção em seu Governo, mas, ao mesmo tempo, 40% declaram que preferem votar nele nas eleições de outubro.
Mesmo que a grande maioria diga saber que o presidente sabia de tudo o que se passou à sua volta nos escândalos do mensalão, valerioduto, caixa 2 e até na quebra de sigilo do caseiro Francenildo, prefere dar-lhe um generoso desconto, sugerindo que ele siga em frente.
Noutras palavras, a própria sociedade está dando uma espécie de senha aos políticos, liberando-os de qualquer preocupação com temas de ordem ética.
Há uma teoria em voga: a crise foi tão martelada pela mídia, assumida como bandeira por figuras cujo passado não recomendável apenas eleva o padrão de desconfiança coletiva sobre a autenticidade de suas intenções, que nada mais natural que a bandalha ficasse banalizada, perdendo a credibilidade necessária para que possa provocar ainda algum tipo de indignação (e reação) coletiva.
Vai se sobressaindo a impressão de que o debate em torno da corrupção passou a ser mera referência retórica. O assunto não pertence mais à alma das pessoas. Provocou desencanto. Os corruptos, mais uma vez, venceram. Palmas pra eles.
Se amanhã todos os envolvidos no cipoal de denúncias – os Delúbios, Sílvios Land Rover Pereiras, Marcos Valérios, Dirceus e Burattis da vida – decidirem contar o que sabem, revelando os mais recônditos segredos do poder, nem susto deverá haver. “Eu já sabia”, dirão os mais cínicos, dando de ombros.
Assim, aos poucos, vai ficando claro que a sociedade brasileira anestesiou-se por completo. Percebeu que o problema é muito complexo para se preocupar com ele. É aquela história: se uma coisa não tem solução, é melhor seguir adiante e deixar como está.
Há uma descrença generalizada nas possibilidades de qualquer mudança dentro do quadro institucional que vivemos.
No último domingo o jornalista Elio Gaspari publicou uma nota reveladora em sua coluna na Folha de São Paulo. Dizia o seguinte: “São muitas as coisas que Lula não sabe, mas ‘nosso guia’ sabe que, se o sigilo bancário de Paulo Okamotto for aberto, sua candidatura à reeleição será um capítulo encerrado”.
Passadas 48 horas, diante da falta de repercussão desta simples mas bombástica notinha, ontem o colunista da Folha, Clóvis Rossi, escreveu: “em um país minimamente sério”, teria acontecido alguma das seguintes reações, a saber: Lula poderia abrir processo contra o jornalista; o Congresso, as oposições e as entidades civis estariam mobilizando esforços para que o sigilo bancário do presidente do Sebrae fosse finalmente quebrado; e, por fim, o Ministério Público, diante de tal “notícia-crime”, abriria investigações para conhecer a fundo o assunto.
Mas não aconteceu nada. Parece que todos estão passivamente aceitando tudo, hipnotizados por informações enviezadas e, pior, impotentes diante de pesquisas que parecem indicar claramente que o País se fragmenta e se confunde diante da total falta de perspectiva. Se não estamos no fundo do poço, com certeza estamos bem próximos dele.
Dante Filho, jornalista