Carga tributária menor, mas só para estrangeiros

Napoleão Casado Filho

A Medida Provisória 281/2006 foi aprovada na Câmara dos Deputados em sessão ocorrida recentemente. O principal ponto da MP é a concessão de isenção de Imposto de Renda e CPMF para estrangeiros que apliquem em títulos públicos brasileiros.

Embora do ponto de vista econômico a medida tenha sido elogiada, acredito que merece censura por sua não-extensão aos residentes. É bem verdade que a isenção possibilita uma melhora no perfil de nossa dívida pública, com prazos mais longos e até juros mais baixos, mas concedê-la apenas ao capital estrangeiro não me parece ser uma medida isonômica.

Isonomia, na verdade, não implica que todos devem ser tratados da mesma forma. Afinal, as pessoas não são iguais. Na verdade, há um consenso no mundo jurídico segundo o qual, para se ter uma lei isonômica, os desiguais devem ser tratados desigualmente, na medida de sua desigualdade. Em outras palavras, para que uma lei estabeleça condições diferenciadas para um grupo, deve haver um critério razoável, uma justificativa que demonstre que esse grupo merece o privilégio.

A título de exemplo, isentar os produtos da cesta básica, permitir que deficientes tenham filas especiais ou vagas reservadas nos estacionamentos são medidas que, embora gerem uma discriminação, possuem um critério razoável para assim proceder. Da mesma forma, teríamos como inaceitável uma lei que concedesse isenção de todos os impostos às grandes fortunas do país, ou apenas à população de um determinado Estado.

Entre os critérios que, a priori, não devem ser utilizados para se conceder tratamento distinto estão sexo, cor, religião e origem (Constituição Federal, artigo 3°, IV). A medida provisória, agora convertida em lei, traz exatamente este último critério para conceder um tratamento mais benéfico. E o pior, em vez de se gerar uma discriminação em favor dos seus residentes –igualmente abominável-, o governo optou por conceder o privilégio ao capital estrangeiro.

Cumpre lembrar que os títulos emitidos pelo governo brasileiro são remunerados com capital público, isto é, pertencente aos residentes. Se o benefício fosse estendido a estes, me parece que o resultado econômico seria ainda melhor, com os brasileiros aplicando sua poupança nos títulos e percebendo o valor pago a título de juros que continuaria a circular em nossa economia.

Como se não bastasse, incentivar a compra de títulos públicos por brasileiros aqui residentes ainda seria um grande passo na direção de se criar uma cultura de investimento em mercado de capitais que, até hoje, praticamente inexiste.

A tentativa do governo de isentar os não-residentes é válida e não deve ser revista, mormente quando se sabe que nossos concorrentes mais diretos pelo capital estrangeiro, México e Argentina, já possuem incentivos semelhantes. Porém, a extensão de tal benefício aos residentes, além de medida do bom senso e de isonomia, contribuiria para diminuir as contradições do nosso sistema fiscal.

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