Quando ainda era criança e morava na casa dos meus tios Wilson e Noêmia, no Rio de Janeiro, sempre ouvi dizer: o jogo vai ser liberado, reconhecido como válido. E as promessas continuaram, até agora na minha fase adulta. A boca pequena ou às claras isso vem sendo repetido, principalmente porque os apertos contra essa modalidade de jogo, passo a passo, foram se afrouxando e às vezes apertando aqui e ali.
E essas coisas eram e são ditas de tal forma que as pessoas acabam acreditando. Pois é, o tempo passou e a esperança também. E nada mudou. A abertura para o jogo do bicho ficou para o futuro incerto e não sabido. Algumas vezes exorcizado até como coisa do mal. Enquanto os chamados jogos legais estão aí, para o governo bamburrar seus cofres e não explicar direito aonde vai tanta grana.
Agora, às vésperas das eleições há um risco de o governo tirar proveito da credibilidade e dos anos de existência do jogo e editar uma Medida Provisória, a qual desmantelaria o jogo do bicho e bingos ao tentar transferir para si, esse conhecimento, experiência e importância. Por certo tentará montar uma estrutura pesada e ineficiente para bancar. E se isso acontecer, não haverá futuro para milhões de pessoas que vivem direta ou indiretamente do jogo, bem assim para aquelas e aqueles que fazem suas fezinhas.
Os que jogam no bicho aumentam dia-a-dia. O que era constrangedor deixou de ser. O povo diante dos mensalões, sanguessugas e sabe mais lá o que está de saco cheio de servir de manobra para a exploração de políticos que não deveriam ocupar tais cargos. O povo está careca de ver as encenações que anunciam a liberação do jogo e nada acontece. O povo é descuidado, às vezes inocente e crédulo, mas o povo não é burro.
Diante até do que se passa no jogo do bicho, comparando com os federais e outros, a parada em valor é menor, mas a chance de ganho é maior considerando o número de apostas, e a seriedade no pagamento do prêmio. A grana anda tão curta e importante que o que para uns pode ser pouco, para muitos pode até ser uma alegre satisfação de lucro.
Eu acredito que o abafamento da contravenção do jogo do bicho segue a mesma linha do assistencialismo desmedido e desumano, que prefere “dar” alguma ninha-ria às pessoas, coisa que as humilha, diante de tanta propaganda e as mantém sob o domínio da mão bondosa. A mesma que não mexe uma palha para tirar os brasileiros de tais situações vexaminosas. Assim, o jogo precisa de ter alguma “tutela” para ser tolerado.
Está na hora do acordar, sair dessa enrascada. Isso é um falso amor, o dos sufocadores que antes do poder eram contra o jogo e ao se empossarem mudaram de opinião, mas no quieto, sem assumir. Os banqueiros do jogo do bicho devem sair desse amor de perdição. É preciso que vivam seus próprios destinos e não os que lhes dão determinados de alguma maneira.
Tentaram até lançar na ilegalidade o jogo do bingo. Com qual finalidade? Mexeram com a opinião pública tentando posicioná-la contra os bingos. Não deu certo. Não seria porque Waldomiro Diniz foi flagrado cobrando propina do empresário do jogo do bicho, Carlos Augusto Ramos, Carlinhos Cachoeira? Alias, a CPI dos Bingos foi criada depois das primeiras denúncias de corrupção no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando Waldomiro Diniz era assessor do Palácio do Planalto ou mais diretamente trabalhava com o ex-ministro da Casa Civil, José Dirceu (cassado pela CPI do mensalão).
Afinal, o X da questão está no rótulo errado e indiscriminado que foi posto contra o bicho desde 1940 pelo presidente Eurico Gaspar Dutra. O que seria como se afirmar que a política não presta, porque vários políticos estão sob acusações. O que não condiz com a verdade. Acredito que a grande maioria deles, tanto do jogo quanto da política é integra, honesta e trabalha direito. Se no jogo tem alguma ilegalidade, que seja extirpada, sem denúncia e ostentação.
Objetivamente é preciso acabar com a hipocrisia da contravenção, e chegando a abertura ampla e irrestrita, o melhor é deixar na administração de quem já os dirige em cada Estado, com impostos pagos (porque não há como escapar, mas é preciso olho-vivo, senão o governo vai querer ser sócio). Com isso evitar-se-á o agravamento dos problemas sociais, desempregando-se milhares de mulheres e homens que mantêm suas famílias. O jogo do bicho é uma solução. Representa uma salvação e tem o direito a uma vida grandiosa e cheia de esperança, como todo brasileiro merece. Não nesse rumo da coisa errada ou da contravenção, sacando sobre um futuro que não lhe pertence.
Ruy Sant´Anna dos Santos, jornalista e Advogado