De amadorguiar@bradesco para marcio@febraban.com

ESTIMADO MÁRCIO Cypriano, resolvi escrever este bilhete por sugestão do meu amigo Jakob Fugger.

Quem é? Passei 87 anos nas terras de vocês e nunca ouvi falar dele. Conheci-o aqui, graças ao Mário Henrique Simonsen. Cortando a conversa fiada, vamos lá.

Desde 1999, você dirige o banco que fundei em 1943 e há dois anos acumula a presidência da Federação de Bancos, a Febraban. Como dá conta de dois empregos, não sei, mas meu assunto é outro. Esse negócio de reunião com juízes em hotéis com piscina é coisa que lá no banco nunca admiti. Isso já deu encrenca.

O doutor foi à boca-livre de Comandatuba, nós pagamos tudo e, ainda assim, ele cobrou R$ 500 em diárias ao erário. Vocês escorregaram em casca de banana usada. No meu tempo, diretor do Bradesco não podia ter Mercedes. Também nunca achei bom misturar nossos negócios com a Febraban. Dê uma olhada na galeria dos marqueses da finança nacional. Tiveram duas coisas em comum: odiaram o Bradesco e quebraram.

Tenho boas lembranças suas. Como poderia esquecer um gerente que se orgulhava de ter passado um domingo, com a mulher, fazendo faxina numa agência que seria inaugurada no dia seguinte? Mesmo assim, achei bobagem deixar que os puxa-sacos anunciassem que você foi o primeiro presidente do Bradesco com curso superior. Acabam mostrando sua gaveta de meias na revista “Caras”.

A boca-livre de Comandatuba é coisa desastrosa para a imagem de qualquer banco. A Febraban deveria se chamar Ferraban. Em janeiro, ela divulgou uma nota solidarizando-se com os tamboretes metidos em trambiques dos comunistas. Depois, implicou com o José Serra porque ele queria cobrar multas pela demora nas filas das agências. Eu tenho horror ao Serra, mas, se estivesse aí, pediria a ele para me deixar coletar pessoalmente o preço da incompetência. Quem fica na fila é o cliente, ou seu motoboy. Foi essa gente que fez o Bradesco.

No dia em que a Associação de Magistrados convidar os diretores do Bradesco para um churrasco em Muriqui, você devem ir, mas parem de convidá-los para Comandatuba. Eu não gosto de citar americanos, mas o professor Leitão de Abreu (pessoa de quem gosto muito, mas de quem não consigo me aproximar) estava conversando com um tal de Potter Stewart, que trabalhou na Corte Suprema dos Estados Unidos. Para ele, a marca da boca-livre debochada é difícil de ser codificada: “É como a pornografia. A gente não consegue definir, mas quando a vê, reconhece”.

Finalmente, uma palavrinha sobre meu amigo Jakob Fugger. Ele morreu em 1525 e foi o maior banqueiro da Europa. Cacifava reis e emprestava aos dois lados de uma mesma guerra. O Jakob viveu num mundo em que a Igreja Católica considerava pecado cobrar juros (como hoje esses vigários de esquerda fazem por aí). Pois em 1515, Johann Eck, um padre-professor, construiu um sistema que levava gente como eu e você para o céu. A igreja alemã condenou-o. Ele foi trabalhar sua causa na Itália e prevaleceu. Quem pagou a viagem do Eck? O Jakob. Ele pede que lhe diga o seguinte: evite espetáculos, mas, se eles forem inevitáveis, não os misture com idéias.

Atenciosamente,

Amador Aguiar

P.S.: Está aqui ao lado o Carlos Lacerda (é um chato) insistindo para que eu registre: “É mais fácil encontrar jornalistas do que magistrados nas bocas-livres”.

Elio Gaspari, é jornalista e o artigo é reprodução de texto publicado ontem da Folha de S. Paulo.

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